Regime de Obiang multa preso político que torturou

Juiz concluiu que “elementos mostram sem erro ou dúvida” que Joaquín Eló Ayeto cometeu crimes de injúria e ameaça contra o chefe de Estado. Sentença tem cinco páginas mas não inclui provas sobre ameaça a Obiang.

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Joaquín Eló Ayeto DR

Joaquín Eló Ayeto, o preso político da Guiné Equatorial libertado em Fevereiro num gesto impulsivo do Presidente Teodoro Obiang, acaba de receber a sentença do seu julgamento de 2019: 12 meses de prisão e uma multa de 1500 euros.

A sentença “é uma vergonha e a prova de que não há um Estado de Direito moderno na Guiné Equatorial”, disse ao PÚBLICO Eló Ayeto, a partir da sua casa em Malabo, capital guinéu-equatoriana, a gozar as primeiras semanas de liberdade. Detido em Fevereiro e julgado em Novembro — num único dia , Eló Ayeto leu o acórdão pela primeira vez esta segunda-feira. Maria Jesús Bikene, advogada de defesa, recebeu-o no dia 6 e confirmou ao PÚBLICO que vai recorrer.

Sobre a coincidência dos 12 meses (esteve preso 12 meses e agora sabe que foi condenado a 12 meses de prisão), Eló Ayeto diz que “tudo são especulações”, mas está certo de que “a sentença foi feita para agradar ao ditador”.

O informático de 41 anos conhecido como Paysa foi preso em Fevereiro de 2019 e torturado duas vezes, ao que se seguiu um ano de prisão, parte do qual passado em isolamento, gravemente doente e sem contacto com médicos, familiares ou advogados.

O acórdão, cujo carimbo não tem data perceptível, condena o militante da oposição de “injúria e ameaça contra a liberdade e segurança do chefe de Estado”. Seis meses pelo “crime de injúria” e seis meses pelo “crime de ameaça”, mais uma multa de um milhão de francos locais e o pagamento das custas judiciais. “É realmente kafkiano e absurdo”, disse ao PÚBLICO Ángel-Obama Obiang Esono, militante do mesmo partido da oposição, a Convergência para a Democracia Social (CPDS) e também seu advogado de defesa. É a prova de que “qualquer pessoa pode ser presa sem motivo e só porque o ditador quer”.

No julgamento-relâmpago de Novembro, diz o advogado, não foi nada provado e, “mesmo assim e com todas as irregularidades”, o activista foi condenado.

Na sentença de cinco páginas, o juiz Óscar Beseku Eñeso escreve que no julgamento ficou provado que: “1. Joaquín Elo Ayeto é redactor da revista La Verdad e que nela aparecem acções de menosprezo contra o chefe de Estado”; que Eló Ayeto tinha “no computador arquivos com o nome OBIANG 1 e OBIANG 2 que não se conseguiram abrir” e que “o suspeito diz serem imagens guardadas com o nome do Presidente Obiang”; que “noutra das suas afirmações na UNGE [Universidade Nacional da Guiné Equatorial, Eló Ayeto] sugeriu aos seus companheiros que introduzissem o tema dos dois milhões no sentido de [os estudantes perguntarem] se, em vez de [Obiang] doar o dinheiro à igreja, poderia usá-lo para terminar a construção da universidade. 2. Cabe ressaltar aqui que durante as investigações, o chefe de Estado estava a fazer uma digressão, [e que] no preciso dia previsto para a terminar, [o plano] não pôde realizar-se por causa das incertezas e das ameaças difundidas pelo acusado e outros.”

Perante estes dados, e sem mais factos relatados no acordão, o juiz concluiu que “estes elementos mostram sem erro ou dúvidas que é um delito de injúria e ameaça contra a pessoa do chefe de Estado”.

O acordão diz também que “as investigações e diligências remetidas [ao tribunal], assim como o interrogatório prévio, concluíram pela prisão preventiva do acusado” em Fevereiro e que “as declarações e outras diligências revelaram o seguinte”: “1. Joaquín Eló Ayeto foi detido pela segurança presidencial na sua casa às seis da manhã por indícios de ameaças contra a liberdade e segurança do chefe de Estado, e por isso teve de entrar-se na sua casa e, após revista da mesma, encontraram-se uma máquina fotográfica, um gravador e um exemplar da revista La Verdade. 2. Sabendo que nesse período o chefe de Estado estava a fazer uma digressão pelo território nacional, e segundo as afirmações do acusado, ele difundiu uma informação que chegou aos ouvidos do director-geral da Segurança Presidencial, na qual este dizia que tinha sido uma sorte o chefe de Estado não ter passado o Natal em Bata porque se o tivesse feito teria sido assassinado. 3. O acusado nega todos os factos e diz que é apenas membro do partido político CPDS e que na madrugada do dia dos acontecimentos, ao ver muitos militares no pátio de sua casa, perguntou o que se passava e foi obrigado a sentar-se no chão, enquanto revistavam a sua casa.”

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