Montijo: quando o óptimo é o second best

Todos sabemos que teses repetidas acabam muitas vezes por aparecer aos olhos da opinião pública como verdades absolutas. É o caso das narrativas sobre a solução Montijo.

Num artigo publicado no PÚBLICO de 25 de Novembro, da autoria do vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS, deputado Carlos Pereira, com o título “Montijo: quando o óptimo é o second best”, são feitas várias afirmações, na linha das que o Governo e a ANA/Vinci têm vindo a produzir.

É referido logo no início: “É mesmo preciso repetir o óbvio.” Ora o óbvio, nas afirmações do senhor deputado, é a total sintonia com a narrativa do Governo e da concessionária sobre a opção de construir um aeroporto complementar no Montijo.

Todos sabemos que teses repetidas acabam muitas vezes por aparecer aos olhos da opinião pública como verdades absolutas. É o caso das narrativas sobre a solução Montijo.

Vamos a factos. O projecto do Novo Aeroporto da Lisboa (NAL) no Campo de Tiro de Alcochete (CTA) foi elaborado pela ANA em 2010. Tem uma Declaração de Impacto Ambiental (DIA) válida desde esse ano. Desde essa data estavam reunidas todas as condições para que fosse iniciado o processo de construção. Permitiria a construção em quatro fases, tendo a primeira fase os elementos funcionais (Terminal de Passageiros, Serviços de Apoio, etc.) equivalentes, em termos de dimensão e custos, à solução prevista para o Montijo.

O Contrato de Concessão entre o Estado e a Vinci foi assinado em Dezembro de 2012. No artigo 42.1, estabelece que “A Concessionária (Vinci) deve envidar os “melhores esforços para maximizar a capacidade operacional das Infraestruturas Aeroportuárias do Aeroporto da Portela até à abertura do NAL”, ou seja, do aeroporto no CTA.

A maximização da capacidade operacional foi autorizada pelo Governo com a permissão para passar de 40 para 48 movimentos/hora, com as consequentes implicações de ruído, poluição e riscos para população de Lisboa e concelhos limítrofes. A construção do NAL foi ficando “esquecida” não obstante os sinais do congestionamento da Portela. Passados seis anos surge a conveniente emergência, que justifica a libertação do concessionário do cumprimento da referida disposição contratual.

De um ponto de vista estritamente empresarial, a posição da ANA/Vinci, no sentido de manter a Portela até ao final da concessão e rentabilizar o seu negócio, é inteiramente compreensível. É esse o interesse do país?

Uma análise técnico-económica comparada rigorosa entre a opção NAL no CTA (1.ª fase) e a opção Montijo facilmente teria concluído que esta última não é nem mais barata nem de construção mais rápida.

A incorporação dos aspectos ambientais seria ainda mais favorável para o CTA. Para além dos problemas da avifauna e do risco de colisão de aves com os aviões, o aeroporto no Montijo vai afectar cerca 30.000 a 35.000 habitantes com níveis de ruído superiores aos legais. No CTA seriam cerca de 400.

Na solução de adaptação da BA6 aproveita-se pouco mais que a localização da pista. Pista esta que exige total reformulação, recarga, alteamento (2,7m na Pista 01) e o seu prolongamento para o estuário do Tejo em cerca de 300m (três campos de futebol) e para Norte em 90 m. Exige a construção e pavimentação de toda a plataforma.

O prolongamento na solução em aterro, com cerca de 10m de altura máxima, assentará em lodos. O leito rochoso está a cerca de 22m de profundidade. Solução mais barata e de menor tempo de execução?

Quanto a condições operacionais, a vantagem do CTA é avassaladora. No CTA não haveria quaisquer restrições. A pista teria o comprimento necessário para a operação de todo o tipo de aeronaves. A solução Montijo fica restrita a aeronaves narrow body de médio curso, essencialmente do segmento low-cost.

A opção Montijo é uma solução sem futuro. O Aeroporto da Portela, segundo um estudo do Eurocontrol, mesmo com 48 movimentos por hora, estará completamente saturado em 2030, sem hipótese de crescer mais. A solução Portela+Montijo saturará em meados da década de 30.

Enviámos ao Governo e aos grupos parlamentares os documentos com as metodologias e os resultados que justificam estes valores. Procurámos sempre o contraditório e nunca foi apresentado. As justificações apresentadas pelo Governo e pela ANA/Vinci são sempre sob a forma de monólogos sem apresentação de documentos comprovativos.

Quanto à decisão da APA em propor uma DIA favorável condicionada, a nota emitida por esta Agência refere apenas “três áreas que foi necessário (?) dirimir: Avifauna, Ruído e Mobilidade”, que têm muitas insuficiências. O EIA utilizou 15 descritores.

Uma decisão não pode ser sustentada em opiniões, mas sim em argumentos devidamente sustentados com base técnico-económica. Não entendemos, por isso, o título “Montijo: quando o óptimo é o second best”.

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