Primeiro-ministro de Malta cede à pressão e vai demitir-se

O governante está a ser pressionado para se afastar para não interferir na investigação ao homicídio da jornalista Daphne Caruana Galizia, há dois anos, quando investigava casos de corrupção que podiam implicar figuras do Governo

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Joseph Muscat Yara Nardi/REUTERS

Joseph Muscat, o primeiro-ministro socialista de Malta, deve anunciar em breve a sua demissão, noticia o jornal Times of Malta. O governante está a ser pressionado para se afastar para não interferir na investigação ao homicídio da jornalista Daphne Caruana Galizia, há dois anos, quando investigava casos de corrupção que podiam implicar figuras do Governo.

Ainda na manhã desta sexta-feira Muscat disse que não se demitia, numa conferência de imprensa realizada após um tumultuoso Conselho de Ministros que se prolongou pela madrugada dentro e em que foi discutida a possibilidade de o primeiro-ministro se afastar. O Conselho da Europa tinha pedido a Muscat que se afastasse da investigação judicial em curso ao assassínio de Caruana Calizia.

Mas à tarde, tudo se complicou. Diz o Times of Malta que o primeiro-ministro se reuniu com o Presidente George Vella, a quem terá informado da sua decisão, e que deve fazer um anúncio ao país pela televisão. Segundo o jornal de Malta, espera-se que haja um novo primeiro-ministro no pequeno país da União Europeia até Janeiro.

Tudo se precipitou depois de o empresário Yorgen Fenech ser acusado pelo homicídio da jornalista. Fenech foi detido na semana passada sob suspeita de estar envolvido no crime.

A agência Reuters revelou que o empresário maltês é proprietário de uma empresa de que pouco se sabe – a 17 Black –, que financiava outras empresas com sede no Panamá, estas propriedade do chefe de gabinete de Muscat, Keith Schembri, que se demitiu, e do ministro do Turismo, Konrad Mizzi, que também se demitiu esta semana. 

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O empresário Yorgen Fenech, que se ofereceu para contar o que sabe, a troco de um perdão Yara Nardi/REUTERS

A investigação da Reuters confirmou as denúncias que Caruana Galizia fez no seu blogue, em que mencionou a “17 Black Dubai” e expôs que elementos do Governo estavam ligados a offshores no Panamá. 

Yorgen Fenech ofereceu-se para contar o que sabe sobre os mandantes do crime - em troca de um perdão. Mas o primeiro-ministro recusou-se a conceder esse perdão. Fenech foi entretanto libertado, e compareceu esta sexta-feira em tribunal, onde disse temer pela vida. “Estou pronto a ir até ao fim, para ver a justiça triunfar e a verdade ser revelada”, afirmou, segundo o Times of Malta. Quando saiu do tribunal, os populares que se acumulavam à porta gritaram “mafia, mafia”.

Os advogados de defesa de Fenech dizem que a investigação do homicídio da jornalista está enviesada para proteger os membros do Governo próximos do primeiro-ministro, e que devia ser travada. Os ministros Schembri e Mizzi nunca foram implicados, apesar de existirem, por exemplo, fotos comprometedoras.

O filho de Caruana Galizia, Paul, acusa o Governo de bloquear as investigações e de manter no poder os mandantes do homicídio. O primeiro-ministro nega estas acusações, recusando existir impunidade em Malta. “Tenho o firme compromisso de ver este caso concluído durante o meu mandato. Acho que as autoridades já fizeram o que muitos acharam que não era possível, isto é, os grandes avanços na investigação. O meu papel é ver esta investigação concluída”, disse o primeiro-ministro. 

Mas Pieter Omtzigt, o relator especial nomeado pelo Conselho da Europa para monitorizar a investigação ao homicídio da jornalista, tinha aconselhado o primeiro-ministro a afastar-se do caso. Em causa está um potencial conflito de interesses, defendeu, depois de Muscat ter anunciado que iria conceder imunidade a Melvin Theuma, um arguido-chave no processo, que afirmou ter informações sobre a identidade do autor moral do homicídio.

O primeiro-ministro, no entanto, divulgou um comunicado em que diz ter entregue à polícia uma mensagem que sugere estar a ser alvo de chantagem para conceder perdão a Yorgen Fenech - uma mensagem a dizer que caso não houvesse perdão, apareceriam testemunhos de que os dois tiveram uma conversa telefónica há alguns meses. “Nunca houve essa conversa. Isso pode ser facilmente verificado”, afirmou Muscat, em mais um episódio deste caso policial recheado de intriga política que abala a ilha mediterrânica.

O Governo voltou a reunir-se ao fim do dia, em modo crise. “A situação é grave”, disse um porta-voz do executivo.

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