Coppola, um homem e o seu mito

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Caterine Milinaire/Sygma via Getty Images

Das duas vezes que ouvi Francis Coppola falar, ao vivo, sobre Apocalypse Now, lembrei-me de uma entrevista a Gilles Jacob, que presidiu ao Festival de Cannes até 2014 (foi “monsieur Cannes” que, em 1979, meteu um work in progress ainda sem genérico na competição e o filme saiu de lá com a Palma de Ouro). Jacob falava de uma “sensação de decepção”, face a Coppola, que se sedimentara. “As pessoas não estão à altura do mito”, dizia. Em 2009, esperámos todos duas horas na Croisette para encher uma sessão da Quinzena dos Realizadores e ficarmos a caçar fantasmas: Coppola não queria nada com o passado da figura grandiloquente que em 1979, numa conferência de imprensa por ali, exclamara que o seu filme não era sobre o Vietname, era o próprio Vietname; queria era exibir o presente, a sua versão de cineasta independente, que ele dizia ser de autor de pequenos filmes e apologista dos bons argumentos, cuja amostra era o frustrante, algo serôdio, Tetro, que então promovia. Foi uma decepção. Como já antes, em 2002, na apresentação da versão Redux de Apocalypse que incluía as cenas que cortara para impedir que o encontro de Willard/Martin Sheen com Kurtz/Marlon Brando fosse atrasado por episódios que tornavam a subida do rio mais fantasmagórica, bizarra, e ainda mais afastada do entertainment, a la A Ponte do Rio Kwai, a que inicialmente se propusera antes de a coisa derivar para a filosofia. O filme podia ser agora menos convencional, sem a pressão do tempo da estreia, justificou. Mas não havia nostalgia alguma no regresso à “idiodisseia”. Parecia até que não havia emoção.

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