O CDS é um partido transgénero

Na corda bamba, esvaziado de metas e políticas, enxotado pelo PSD após um casamento traumático, o CDS tomba, cada vez mais, para um populismo oportunista.

O CDS é um partido com um largo historial de ambiguidades programáticas. Freitas do Amaral e Adelino Amaro da Costa criaram-no à direita, para travar o comunismo, mas disseram-no do centro social, para evitarem o anátema de falarem em nome dos “fachos”. O CDS invocou a democracia-cristã italiana e o conservadorismo alemão. Foi europeísta com Lucas Pires e antieuropeísta e popular com Manuel Monteiro e Paulo Portas. Foi elitista, monárquico, defensor da lavoura, das pensões e dos ex-combatentes. O partido que já coube num táxi encheu um autocarro nas autárquicas de Lisboa e Assunção Cristas achou que o podia conduzir com o PSD a reboque. A questão é simples: a principal prioridade do PSD foi o PS e a principal prioridade do CDS — repetir os excelentes resultados das autárquicas — não passou de uma miragem.

Transformar o despacho do Ministério da Educação sobre o uso de casas de banho e balneários escolares, de modo a proteger cerca de 200 jovens em processo de alteração de identidade de género num capricho, numa libertinagem ou no apocalipse da sociedade é tudo menos cristão e democrata; é desonesto e desproporcional.

Alguns dirigentes do CDS não se inibiram de truncar partes do despacho para conscientemente tentar confundir a opinião pública, como se passassem a existir casas de banho mistas nas escolas. O sofrimento de quem não encaixa na gaveta normativa e binária do credo do CDS é desrespeitado e encarado com bizarria, como se não estivéssemos em 2019. Crianças “trans” e intersexo sempre existiram e vão continuar a existir e é de bom senso que o Estado as proteja dos maus tratos, bullying, ignorância, preconceito e transfobia em ambiente escolar.

O que, sucessivamente, têm afirmado vários dirigentes partidários atropela direitos em nome de um obscurantismo risível, contemporiza com a discriminação sexual e diz muito acerca de um partido transgénero. Na corda bamba, esvaziado de metas e políticas, enxotado pelo PSD após um casamento traumático, o CDS tomba, cada vez mais, para um populismo oportunista. Um partido europeu e democrata que não faça do combate às desigualdades mais básicas e pelo reconhecimento dos direitos mais universais uma prioridade é tudo menos um partido preocupado com o essencial numa sociedade humana. Deus criou o homem e a mulher, como se diz numa petição a circular, mas não consta que tenha criado a transfobia.

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