99% da produção mundial de bananas em risco. Fungo destruidor chega à América Latina

Variedade Cavendish, que representa 99% do comércio mundial deste fruto, é vulnerável à Estirpe Tropical 4 do Fusarium oxysporum cubense, descoberta em plantações colombianas. “É bastante complicado controlar a propagação da doença”, alerta investigador.

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Variedade Cavendish, que representa 99% do mercado mundial deste fruto, é ameaçada pela estirpe mais agressiva de um fungo OSWALDO RIVAS/Reuters

“Se o mal-do-panamá alastrar para a América Latina, poderá exterminar a Cavendish num prazo de dez anos” — a notícia da autoria de David Grimm​, publicada na revista Science em 2008, alertava para uma possibilidade que, na altura, ainda era ignorada por muitos. Depois de afectar várias regiões, com especial impacto no Sudeste asiático, o fungo que ameaça a sustentabilidade do fruto mais consumido mundialmente foi descoberto nas plantações colombianas. A par do Equador, Costa Rica e Guatemala, a Colômbia é um dos principais exportadores deste fruto. O Governo deste país decretou o estado de emergência nacional, depois de 430 hectares de plantações de bananeiras terem sido contaminados com uma das estirpes do Fusarium oxysporum cubense — a Estirpe Tropical 4 (ou TR4, na sigla em inglês).

Este fungo infiltra-se nas plantas através das raízes, bloqueando os vasos que carregam água e nutrientes. No caso das bananeiras, as folhas amarelecem, secam e ficam coladas, algo que resulta na morte destas plantas. O Fusarium oxysporum cubense foi descoberto no início do século XX, causando os primeiros prejuízos significativos nas plantações de banana do Panamá. A banana Gros Michael, principal variedade na primeira metade do século passado, sucumbiu a este fungo. Na década de 1950 descobriu-se uma nova banana, a Cavendish, que, ao contrário da antecessora, conseguia resistir ao fungo. Esta variedade representa 99% das bananas comercializadas. Porém, apesar de não ser afectada pela “estirpe original”, esta banana — que descende, por clonagem, de uma única planta-mãe surgida na China — não mostrou a mesma resistência contra a Estirpe Tropical 4. A variedade mais comercializada mundialmente está em risco, algo que preocupa produtores, investigadores e, caso não seja encontrada solução para o problema, poderá ter impacto junto dos consumidores a médio prazo.

“Para mim, o pior momento foi [ver] as primeiras fotografias.” Fernando Alexander García-Bastidas, investigador na empresa holandesa KeyGen, que estuda o genoma de culturas agrícolas, relembrou, em declarações à National Public Radio, o momento em tomou conhecimento de que o fungo tinha chegado ao país sul-americano. O alerta chegou através das imagens enviadas por agricultores locais, preocupados com o amarelecimento de algumas plantas. O investigador viajou até à Colômbia, seu país natal, onde recolheu amostras para perceber a dimensão do problema.

Em Julho, foram colocadas algumas colheitas do fruto provenientes do Norte do país sob quarentena, devido à suspeita de que estes frutos pudessem estar contaminados com o fungo que, de acordo com as declarações do ministro da Agricultura colombiano, pode representar um duro golpe nas exportações. 

“Senti algo no meu coração. Estava a rezar por um falso positivo, ou algo desse género”, explica Fernando García-Bastidas. Os testes, porém, confirmaram os seus piores receios: depois da Ásia, Oceânia e África, a Estirpe Tropical 4 chegava ao continente americano. O investigador admite que a entrada do fungo na América do Sul seria uma inevitabilidade, mas nunca pensou que acontecesse tão rapidamente. “É bastante complicado controlar a propagação da doença”, alerta. 

Quando os sintomas se tornam perceptíveis nas plantas, o solo já se encontra infectado há mais de um ano. Nesse período, a probabilidade de disseminação do fungo é elevada: pequenos pedaços de solo agarrados a sapatos, por exemplo, são suficientes para contaminar outros terrenos. “Espero estar errado, mas é provável que este fungo se tenha espalhado a outros locais”, lamenta o investigador. O fungo pode sobreviver no solo durante 30 anos.

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Governo colombiano colocou bananas de algumas plantações do Norte do país sob quarentena Jaime Saldarriaga/REUTERS

O peso da banana na economia colombiana é significativo. De acordo com dados avançados pela agência Reuters, este país tem plantações que se espalham por mais de 50 mil hectares, das quais estão dependentes 30 mil postos de trabalho. Em 2018, a exportação de bananas teve um peso de 859 milhões de dólares (aproximadamente 773 milhões de euros) no PIB do país. 

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