Golas: estudo prova que se fossem de algodão não perfuravam nem a 20 centímetros

Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais da Universidade de Coimbra estudou golas e revela que o material em poliéster, a 30 centímetros das chamas, não inflama mas perfura. Pano de algodão testado a 20 centímetros das chamas ficou intacto.

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Imagens dos testes no relatório agora divulgado DR

As golas antifumo distribuídas pela Protecção Civil ao abrigo do programa “Aldeias Seguras” não inflamam mas perfuram a uma distância de cerca de 30 cm das chamas. Esta é uma das conclusões do relatório preliminar encomendado com urgência pelo Ministério da Administração Interna (MAI) ao Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais da Universidade de Coimbra, divulgado nesta terça-feira.

“Em conclusão, podemos dizer que as golas testadas não se inflamaram – isto é, não entraram em combustão com chama – mesmo quando sujeitas a um fluxo de calor de muito elevada intensidade, produzido por chamas cuja altura variou entre um e quatro metros, mesmo quando colocadas a uma distância inferior a 50 centímetros das chamas, durante mais de um minuto”, lê-se no documento.

Segundo o relatório, no ensaio GO3, a distância da gola ao cesto em chamas foi de 30 centímetros. “No final a gola estava deformada, e apresentava uma perfuração, por impacto térmico, embora não tenha entrado em combustão”, lê-se. Já no ensaio GO4, a distância da gola ao cesto em chamas foi de 20 centímetros. “No final do ensaio a gola estava muito perfurada, embora não se tenha inflamado”, de acordo com o relatório do Centro de Estudos.

Os investigadores testaram, à mesma distância, ou seja, a 20 centímetros, um tecido de algodão. As conclusões revelam que “o tecido de algodão alterou a cor, mas não se deformou nem entrou em combustão”.

O relatório é preliminar e desconhece-se se as golas foram avaliadas no que diz respeito ao grau de protecção contra o fumo. Na introdução do documento apenas está referido o seguinte: “Em concreto pretendeu-se avaliar se as referidas golas se inflamavam quando sujeitas a um forte fluxo radiactivo, semelhante ao de uma frente de chamas como as que ocorrem em incêndios florestais, podendo colocar em perigo o seu utente, pelo facto de entrarem em combustão.”

MP investiga

Ricardo Fernandes, proprietário da Foxtrot, empresa que forneceu as golas, garantiu que o material escolhido, poliéster em vez de algodão, foi o exigido pelo Governo e que constava do caderno de encargos. Ao PÚBLICO disse mesmo que se tratava de “uma gola de protecção para o frio ou calor e que não pode ser confundida com uma protecção para incêndios”.

Esta questão das golas antifumo já levou à demissão do técnico Francisco Ferreira, adjunto do secretário de Estado da Protecção Civil. Demitiu-se na segunda-feira depois de ter sido noticiado o seu envolvimento na escolha das empresas para a produção dos kits de emergência para o programa “Aldeias Seguras”.

O Ministério Público (MP) também determinou a abertura de um inquérito, segundo um comunicado da Procuradora-Geral da República (PGR) hoje divulgado. Participação económica em negócio e, eventualmente, corrupção são os crimes que o MP vai investigar neste caso. Entre outras coisas, o magistrado do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) a quem for entregue este inquérito vai ter de perceber se têm fundamento as notícias segundo as quais as golas custaram ao erário público muito mais do que seria expectável pagar por aquele tipo de material, situação que, a verificar-se, poderá configurar a participação económica em negócio. Se os investigadores concluírem que sim, é provável que o adjunto do secretário de Estado que se demitiu esta semana seja constituído arguido. O DCIAP é o departamento do Ministério Público que investiga a criminalidade altamente organizada. 

Durante a tarde de terça-feira, e ainda antes de serem conhecidos os resultados do estudo feito às golas,  Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna, fez um apelo: “Aquilo que pedia, a bem da confiança no nosso sistema e na necessidade de garantirmos confiança nas populações, é que todos aqueles que forem tão peremptórios e tão definitivos sobre aquilo que é uma questão técnica no âmbito de algo que vale muito mais, a mobilização da população na articulação com as estruturas de bombeiros e de protecção civil, que leiam com atenção esse relatório e tirem as devidas conclusões, a bem da serenidade e da confiança no sistema.” com Ana Henriques

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