Bruno Lage é o treinador do Benfica até ao final da época. Quem é Bruno Lage?

O Benfica comunicou à CMVM que Bruno Lage será (mesmo) o sucessor de Rui Vitória no comando técnico dos "encarnados" que seguem vitoriosos num mês que promete ser decisivo.

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Bruno Lage é o treinador do Benfica LUSA/MIGUEL A. LOPES

Depois de “aguentar o barco” em duas partidas que terminaram em vitórias (4-2 ao Rio Ave, na Luz, e 0-2 nos Açores, frente ao Santa Clara), Bruno Lage é o eleito por Luís Filipe Vieira para comandar o destino do Benfica, até ver, ao final desta temporada. Até agora, o treinador de 42 anos não sabia que futuro iria ter na equipa principal das "águias". Esta segunda-feira, a SAD do Benfica comunicou à Comissão de Mercados de Valores Mobiliários (CMVM) que Bruno Lage assumirá "a título definitivo" as funções de treinador da equipa principal de futebol.

O clube da Luz terá duplo compromisso em Guimarães, frente ao Vitória Sport Clube. Na terça para os quartos-de-final da Taça de Portugal e na sexta para o campeonato, onde está em segundo lugar, a cinco pontos do líder FC Porto, que empatou a zero com o Sporting. No futuro próximo, Bruno Lage tem no horizonte o embate frente ao FC Porto, a contar para a final four Taça da Liga, e o derby com o Sporting, em Alvalade, para o campeonato, e ainda os 16 avos-de-final da Liga Europa, diante dos turcos do Galatasaray.

O presidente dos “encarnados” já tinha admitido na última semana que iria desvendar quem seria o treinador. Quanto a Bruno Lage, Vieira só tinha dito que o conhecia “há muitos anos” enquanto José Mourinho chegou a ser associado ao comando técnico. No entanto, o próprio negou que iria voltar a Portugal para já.

Bruno Lage transitou da equipa B para o plantel principal. Depois de uma primeira metade de época frutífera, deixou a formação secundária dos “encarnados” no início de 2019 no quarto posto da II Liga, com 27 pontos. Actualmente, o Benfica B mantém a mesma posição, com mais um ponto.

Curiosamente, Bruno não tem o apelido Lage: o nome completo do setubalense é Bruno Miguel da Silva Nascimento. Bruno é filho de Fernando Lage e, desde tenra idade, adoptou o apelido do pai. Com uma licenciatura em Educação Física, Saúde e Desporto, começou a treinar as camadas jovens do V. Setúbal, passando, depois, pelo Comércio e Indústria, histórico emblema sadino. Esteve também na Associação Desportiva Fazendense, distrito de Santarém, no Sintrense e no Estrela Vendas Novas.

Ingressou pela primeira vez no Benfica em 2004-05, comandando os escalões de iniciados, juvenis e juniores até 2012. “Foram oito anos que marcaram o início da minha carreira. É verdade que já tinha um passado de dez anos enquanto treinador, mas quando entrei [no Benfica] com 27 anos foi, talvez, onde senti a oportunidade de ser mais profissional”, recordou à BTV em Julho de 2018, muito longe de saber que, meia época após a entrevista, assumiria de forma interina o cargo de técnico da formação principal.

“É alguém que consegue unir o grupo”

Romeu Ribeiro, jogador do Penafiel, encontrou Bruno Lage em 2005-06, nos juniores B do Benfica e revela ao PÚBLICO o espírito de união que o novo técnico dos “encarnados” gosta de cultivar nas equipas que comanda: “Foi um treinador que me marcou bastante. Era alguém muito próximo dos jogadores. Fazia-nos sentir bem, mas também dava reprimendas quando fosse preciso. É alguém que consegue unir o grupo, é muito inteligente nesse aspecto. Essa união repercute-se, claro está, dentro das quatro linhas.”

O médio acrescenta que Bruno Lage costuma manter contacto com os atletas que foi treinando ao longo da sua carreira. Algo que, na opinião do jogador do Penafiel, pode ser-lhe útil na equipa A: “Costumamos manter contacto todas as semanas e tenho a certeza de que vai dar conta do recado. Ele conhece bem os jogadores da equipa principal, alguns deles passaram pelas equipas de formação dele. É um treinador muito metódico, ligado ao pormenor. Gostava de um jogo bonito, muita posse de bola. Privilegiava muito o jogo ofensivo.”

Preparador físico e adjunto em Vendas Novas

Antes dessa etapa, já Bruno Lage tinha passado pelo Estrela de Vendas Novas, em 2003-04. Joaquim Telha, à época presidente do clube, lembra a época histórica que então se viveu, quando o agora técnico do Benfica acumulava funções de preparador físico e treinador adjunto.

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“Não sabíamos muito sobre ele quando chegou cá, era novo [tinha 28 anos]. Mas o facto é que assegurámos a primeira manutenção na II divisão, um marco na vida deste clube. Não é por acaso que ele sai daqui e vai logo para as camadas jovens do Benfica”, aponta, em declarações ao PÚBLICO, o antigo dirigente do emblema que hoje compete nos distritais de Évora.

Joaquim Telha recorda que, nesses tempos, Lage “já sabia bastante”. “Tinha conversas informais com o treinador principal [José Rocha] que sempre dizia que o Bruno era um miúdo dedicado e parecia perceber desta matéria. Tinha hipóteses de ir longe se continuasse a trabalhar, dizia ele”, revela. “Não era muito extrovertido, mas se fosse preciso falar, falava bem. Não era muito de brincadeiras, o que eu acho bom”, acrescentou.

A questão da idade, garante o antigo dirigente, também nunca se confundiu com autoridade, mesmo num plantel com atletas muito experientes. “Lembro-me de um defesa central que jogou no Estrela e esteve vários anos no Vitória de Setúbal [entre 1992 e 2001], o Rui Carlos. Era bem mais velho [tinha 35 anos em 2004] que o Bruno Lage. Ele ainda jogava, brincavam bastante com isso, mas sempre com respeito e carinho”.

"Punha toda a gente a trabalhar"

Voltemos mais atrás, até 2000-01 e ao início da carreira de Lage, quando partilhava com Jaime Graça o banco do Fazendense. “O Jaime [Graça] tinha muita fé nele. Apostava nele como sendo um treinador de grande futuro. Ele era muito jovem quando chegou ao Fazendense, como adjunto, mas respirava futebol 24 horas por dia e punha toda a gente a trabalhar”, contou à agência Lusa António Moreira, presidente do clube de Almeirim.

Assumindo que, pela sua forma aplicada de trabalhar, “já se perspectivava que podia chegar longe”, o dirigente acredita num futuro risonho para o treinador. “O Bruno [Lage] é sério, inteligente, trabalhador e é um treinador que sabe o que faz. Quando o Jaime [Graça] deixou o clube para ir para as camadas jovens do Benfica e o levou com ele, fiquei com pena, mas não podia fazer nada”, completou o dirigente, convicto do potencial do técnico de 42 anos e de que vai “fazer a malta trabalhar”.

As aventuras internacionais

Após uma primeira passagem pela formação do Benfica, seguiu-se o Dubai. Foi treinador no Al Ahli durante dois anos, conhecendo Carlos Carvalhal, que desempenhava a função de coordenador técnico do clube árabe. “Já o conhecia, tinha feito vários estágios com ele e tivemos oportunidade de nos tornarmos amigos”, afirmaria em entrevista ao canal do clube da Luz. O laço de amizade entre Carvalhal e Lage solidificou-se, com o primeiro a pedir ao setubalense para ser seu adjunto em Inglaterra. De 2015 a 2018, Bruno Lage sentou-se ao lado de Carlos Carvalhal no banco de suplentes do Sheffield Wednesday, no segundo escalão do futebol inglês e, posteriormente, no Swansea, na Premier League.

Em 2018, a família falou mais alto e Bruno Lage deixou Inglaterra e voltou à sua segunda casa, para orientar a formação B dos “encarnados”. “O que me fez vir para a equipa B foi poder ser pai além de ser treinador. O meu filho tem três anos e praticamente não o vi nascer. Quando o presidente falou comigo para vir, vi um projecto sólido que me permite estar mais perto de casa”, admitiria, após um encontro da formação secundária, no Seixal.

Teórico do desporto-rei

O conhecimento precoce de Bruno Lage acerca da metodologia de treino em futebol e potencialização de jovens jogadores também se materializou fora de campo. Em 2014, Lage e o antigo companheiro de equipa técnica, Carlos Carvalhal, juntaram-se a outro adjunto, João Mário Oliveira, para lançar o livro Futebol: Um Saber Sobre o Saber Fazer. Na obra abordam a “periodização táctica” assente num 4-3-3, pensado e utilizado numa semana de trabalho na Turquia, antes de uma partida contra o rival Galatasaray, quando Carvalhal orientava o Besiktas em 2010-11.

Na nota inicial desse livro, os autores, um deles Bruno Lage, defendem que “não há, nem nunca haverá, verdades absolutas no que respeita à operacionalização de uma equipa de futebol”. “Só podemos evoluir e ter êxito se acreditarmos nas nossas ideias, desde que estas estejam de acordo com as exigências e calendário do futebol dos nossos dias. Não temos qualquer receio de as expor a todos vós a bem do futebol, até porque, numa lógica evolutiva, o que fazemos hoje não será certamente o que faremos amanhã”, afirmam.

Mais recentemente, em Julho de 2017, o treinador publicou Formação: da Iniciação à Equipa B, com prefácio de Carlos Carvalhal. Em 160 páginas, fala do trabalho desenvolvido durante dez anos entre os escalões de formação do Benfica e do Al Ahli. Carvalhal era coordenador técnico desse clube árabe entre 2013 e 2015.

Actualização de artigo publicado a 4 de Janeiro de 2019

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