Rio: um shot depois do ano zero

A vantagem do desafio de Luís Montenegro foi podermos ter ontem visto Rui Rio a funcionar sob um shot energético que ninguém lhe tinha conseguido encontrar durante um ano inteirinho.

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Por muito mau que seja Luís Montenegro, o challenger do momento só encontrou margem para o desafio porque o primeiro ano de Rio foi uma nulidade. Com palavras e actos, Rui Rio deixou que se instalasse dentro do PSD a ideia de que trabalhava, não para ganhar as eleições, mas para ser um número dois de António Costa, qualquer que fosse o acordo pós-eleitoral escolhido. A oposição foi praticamente inexistente, a contradição entre a ideia do "banho de ética" e a prática foi terrível e, do alto da sua arrogância, o líder do PSD escolheu um percurso incompreensível para o comum dos mortais. Os mortais responderam-lhe encostando nas sondagens o PSD aos limites mínimos. Se o partido estava num estado de fragilidade absoluta na liderança de Pedro Passos Coelho (que passou dois anos em estado de choque e sem reagir depois de Costa lhe ter capturado o lugar de primeiro-ministro), as coisas não melhoraram. Num frenesim desnecessário de se distanciar do que tinha sido a liderança de Passos (desnecessário porque inútil), Rio tentou uma alteração radical da linguagem do passismo e tal como o antecessor falhou clamorosamente na oposição ao Governo PS. 

Rio respondeu ontem a Montenegro criticando o timing da candidatura à liderança, por prejudicar o partido em ano eleitoral. A verdade é que a actuação de Rio desde o início do mandato tem prejudicado o partido para as eleições. Em termos de prejuízos, estão bem um para o outro. E é um enorme prejuízo para o regular funcionamento das instituições o facto de o PSD, partido fundador do regime democrático, estar em vias de desaparecimento eleitoral. Como a sociedade tem horror ao vazio, sabe-se lá o que vem substituir o PSD se continuar em curso a marcha para a irrelevância. 

A vantagem do desafio de Luís Montenegro foi podermos ter ontem visto Rui Rio a funcionar sob um shot energético que ninguém lhe tinha conseguido encontrar durante um ano inteirinho. Uma vez Rio disse que era melhor quando se sentia acossado. De facto, na conferência de imprensa de ontem mostrou uma capacidade de ir à luta que nunca tinha mostrado na actividade de oposição ao Governo. A apresentação de uma moção de confiança é uma forma de corresponder ao desafio – não aceitando directas, mas aceitando ir a jogo no terreno do Conselho Nacional, eventualmente mais confortável mas totalmente imprevisível. Se o desafio de Luís Montenegro despoletar a capacidade de oposição de Rui Rio, já foi um serviço prestado ao PSD.

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