Marcelo, a ginjinha e as eleições

Marcelo está de manhã à noite, todos os dias, nas televisões, nas rádios, nos jornais, preocupado com os portugueses. Para ele todos os dias são dias para aparecer preocupado.

Marcelo, o Presidente da República portuguesa, declarou, ao Jornal de Notícias de 24 de dezembro, no dia em que foi ao Barreiro beber uma ginjinha (não há nenhum português que não saiba que a ginjinha é a sua bebida preferida desde a infância), que a campanha eleitoral começou mais cedo...

Marcelo tem uma perceção da realidade que vai muito para além do comum, pois a ninguém passaria pela cabeça que os partidos estivessem desde já preocupados com eleições e ele, quando foi dirigente máximo do PPD/PSD, jamais lhe passou pela cabeça ter em conta eleições cinco meses antes de elas terem lugar...

Marcelo não está só preocupado com as campanhas antes do tempo, mas com tudo o que o rodeia, mas tudo mesmo – dos enfermeiros aos camionistas, dos “coletes amarelos” aos ferroviários, do INEM aos alfaiates, dos estivadores aos professores e aos taxistas, mas o que mais o preocupa é o falhanço do Estado... Vive em sobressalto permanente por causa dos incêndios, das pedreiras, do furto do quartel de Tancos, do helicóptero que caiu em Valongo...

Marcelo tem cerca de dez milhões de preocupações, que é o número de portugueses com que ele está preocupado, mais bem dito, dada a quadra natalícia, preocupadíssimo.

Ele desmultiplica-se para chegar a todos os portugueses, mas, claro, dez milhões são qualquer coisa e não dá para todos, embora se lhe reconheça o esforço, como, por exemplo, no mesmo dia em que foi visitar a Raríssimas, foi à ginjinha porque o Barreiro é a terra onde há ginjeiras por todo o lado; como se sabe, por ordem do falecido Alfredo da Silva.

Este estado de alma característico do nosso Presidente fá-lo lamentar-se e com toda a razão da gulodice dos partidos cinco meses antes das eleições europeias. É uma pena que não esperem mais três ou quatro meses... Não se contendo, o Presidente tinha de fazer o reparo, não fosse algum populista aproveitar-se e para que o terreno ficasse preenchido Marcelo ocupou-o, pois ele, como se sabe, não pactua com o populismo. Ele, diga-se em abono da verdade, não tem poderes para impedir que se lhe dirijam a pedir selfies, pedem-lhe e ele cede... Cede porque o povo é quem mais ordena tanto nas selfies como nos abracinhos e nos abraços que por esse Portugal inteiro ele vai espalhando, tudo para que o populismo não apareça.

Por essas e outras razões, tinha de ficar espantado e chamar a atenção para o facto de a campanha eleitoral ter começado mais cedo.

Se os partidos fizessem como ele, não fariam campanha eleitoral como ele não fez.

Marcelo está de manhã à noite, todos os dias, nas televisões, nas rádios, nos jornais, preocupado com os portugueses. Para ele, todos os dias são dias para aparecer preocupado. Quando chegarem as presidenciais ele não precisa de fazer propaganda. Só precisa de ir a um ou dois debates com uma caterva de candidatos que começam a campanha quatro ou cinco meses antes…

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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