É Natal!

É Natal, daqui por meia dúzia de dias estarei em lágrimas nos braços da minha avó, e a minha avó nos meus, sei lá eu se não pela última vez.

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Nuno Ferreira Santos

É Natal! Estamos cansados, mastigados, espremidos, esfrangalhados, comprimidos, em ponto de rebuçado, o Verão já lá vai, dentro de casa está frio e eu já não me lembro da última vez que fomos à praia, ao banho, ao mar.

Mas que se dane, é Natal! É Natal e podemos parar, respirar, estar com família e amigos, comer, encher a pança, comer mais doces, encher a pança outra vez. Afinal, foi para isto que nos matámos a trabalhar nos últimos quatro meses e às vezes até parece que não aboliram a escravatura. Mas eu quero lá saber, é Natal, daqui por meia dúzia de dias estarei em lágrimas nos braços da minha avó, e a minha avó nos meus, sei lá eu se não pela última vez. E sim, é sempre a última vez de há vinte anos para cá, a minha avó já não é nenhuma criança mas eu também não.

É Natal e vamos voar, fazer as vezes do Pai Natal, dizer-lhe adeus do avião e até já no fim da chaminé que cá em baixo já estamos à mesa, novamente juntos, finalmente juntos, na alegria e certeza de quem voltou a casa.

Mas antes de voltar a casa e depois do avião ainda faltam para lá de 500 quilómetros entre duas idas ao Ribatejo e outras duas a Lisboa. Mas correr por gosto não cansa e matar saudades de Portugal só na estrada e ver tudo no mesmo sítio, ainda e para sempre.

É Natal e não quero prendas, quero um abraço e depois outro, quero estar entre os meus, quero bacalhau e rabanadas, duas consoadas numa noite só enquanto percorremos a família toda, muitas saudades e um chi-coração tão apertado. E isto o Pai Natal não pode dar, posso eu, e maior prenda não há.

E quando chegar à meia-noite, sair à rua, ligar o carro e abrir a porta ao meu avô, desta vez vou eu ao volante e já não sou nenhuma criança. Mesmo que o meu avô já cá não esteja, mas está, está aqui ao meu lado enquanto o carro percorre o mesmo caminho de sempre até à Missa do Galo. Mas no fim da viagem é o meu avô quem pára o carro e me abre a porta, tenho outra vez 12 anos e a felicidade de lhe dar a mão, mais uma vez, a última prenda de Natal, enquanto juntos caminhamos escada acima para ver o menino nascer.

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