Um manifesto pela liberdade e diversidade sexual vindo do século XVIII

Boudoir – 7 diálogos libertinos é a mais recente criação de Martim Pedroso e aborda a emancipação sexual da mulher e o prazer físico como sentido único da existência. A peça está em cena a partir desta sexta-feira no Teatro do Campo Alegre, no Porto.

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Boudoir – 7 diálogos libertinos Paulo Pimenta
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Antes de o feminismo ser o feminismo, já o Marquês de Sade, aristocrata e escritor francês do século XVIII, era feminista. Levou uma vida de insubordinação às normas políticas, sociais e religiosas instituídas, e defendeu, em alternativa, a liberdade do pensamento e da sexualidade para homens e mulheres. A Filosofia na Alcova, romance de 1795, começa por ser uma lição sobre sexualidade dada por uma experiente libertina a uma dama virgem, mas torna-se uma reflexão maior sobre a mulher enquanto ser sexual e insubmisso, o prazer como fim e não apenas meio de reprodução e a negação da heteronormatividade.

“Há aqui questões de género e de sexualidade que são os grandes temas de hoje”, afirma Martim Pedroso. Foi a actualidade deste texto setecentista que inspirou Boudoir – 7 diálogos libertinos, criação da Nova Companhia que está em cena entre esta sexta-feira e domingo no Teatro do Campo Alegre, no Porto.

O espectáculo tem duas horas e põe em confronto Eugénia, uma jovem dama virgem criada no seio de uma família católica, símbolo de castidade e pureza, e Madame de Saint-Ange, uma mulher vivida e despudorada que se rege pela libertinagem. Além de ensinar Eugénia sobre as noções básicas do sexo e do acto sexual, Saint-Ange vai mostrar-lhe a ausência de regras morais e a diversidade de formas de prazer sexual. A sodomia ocupa um lugar central na trama e serve de “metáfora da própria vida”. “Há a ideia de que a sociedade está impelida a ir numa certa direcção e tudo o que se desvie é condenável”, explica o encenador. Neste caso, “o prazer anal é um símbolo da exploração alternativa do sexo” que não é vista com bons olhos pela sociedade.

O encontro entre as duas mulheres – a quem se junta, depois, Dolmancé, nobre que é apologista máximo da libertinagem e “mestre” de Saint-Ange – decorre na intimidade do quarto de Saint-Ange. A cenografia, a par dos figurinos e luzes, é um piscar de olho ao elemento de burlesco e cabaret que tem sido incorporado nas criações da Nova Companhia, este ano. “Esta associação faz sentido, porque o cabaret é o sítio da liberdade de conteúdos e do corpo, é muito teatral e sexual”, justifica Martim Pedroso.

Combate à “falta de pensamento”

A exaltação da liberdade sexual ao longo da peça é um combate assumido a “costumes góticos”, como o pudor e a decência. À medida que mergulha na descoberta da sua sexualidade, Eugénia põe em causa a obediência que lhe foi incutida e é levada a pensar sobre o seu papel enquanto mulher na sociedade. A reflexão é, aliás, potenciada pela “junção de diversos géneros” que compõem o livro. Segundo o encenador, é aí que residem a versatilidade e a actualidade de uma obra que é, simultaneamente, “romance, texto filosófico, literatura pornográfica e manifesto político”.

É de política que se trata quando se recusa a heteronormatividade através de personagens e relações homossexuais e bissexuais – presença habitual na obra de Sade – e da defesa de práticas sexuais como a sodomia, acto ilegal e punido com a morte na França do século XVIII. Também é política a afirmação do prazer físico da mulher como um fim para o sexo e não apenas um meio necessário para a reprodução. “Fode, que foi para isso que vieste ao mundo”, proclama a certa altura Saint-Ange.

Além do erotismo que atravessa a história, está bem presente o ateísmo que constitui uma das principais linhas de pensamento do Marquês de Sade. Para o autor, a religião é apenas um conceito limitador que está no caminho do verdadeiro propósito da existência humana: o prazer. Há uma cena em que Eugénia, fascinada com a novidade da sexualidade, questiona as suas acções como ofensas à virtude e à Igreja. Logo Dolmancé a descansa, notando que há “prazeres piores, como a ambição e o orgulho”.

Boudoir – 7 diálogos libertinos é uma “sova de moralidade” que quer contornar a “falta de pensamento” e o “carneirismo” da actualidade, sublinha Martim Pedroso. “Fazem falta textos como este, que promovem a liberdade e a diversidade de ideias”.

A peça conta com interpretação de Maria João Abreu, Margarida Bakker e João Gaspar nos papéis principais. Depois da apresentação no Porto, segue para o Teatro da Trindade, em Lisboa, onde ficará entre 30 de Janeiro e 10 de Março de 2019.

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