Antigo Hospital Militar, em Lisboa, a um passo de ser habitação e comércio

Está em análise na câmara a construção de 13 edifícios junto à Avenida Infante Santo, num lote que actualmente é do Estado. CDS diz que o processo pode ser "nulo".

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O projecto diz respeito à parte do hospital que funcionava junto ao Convento da Estrela (à direita) Enric Vives-Rubio

A câmara de Lisboa discute esta quarta-feira uma proposta que abre caminho à transformação do antigo Hospital Militar num conjunto de edifícios de habitação e comércio. Na reunião pública, os vereadores vão votar uma alteração ao Plano Director Municipal (PDM) para a área circundante ao antigo Convento do Sagrado Coração de Jesus, colado à Basílica da Estrela.

Naqueles terrenos, entre a Avenida Infante Santo e a Rua de São Ciro, nas traseiras do templo, funcionou uma parte do Hospital Militar Principal, que tinha ainda instalações do outro lado da avenida (agora pertencem à Santa Casa) e na Calçada da Estrela, junto ao jardim. Os edifícios ficaram vazios há alguns anos, quando abriu no Lumiar o novo Hospital das Forças Armadas.

No PDM, a zona está actualmente classificada como “espaço de uso especial de equipamento consolidado”, o que impede qualquer outra utilização. A proposta que estará esta quarta em discussão, assinada pelo vereador do Urbanismo, Manuel Salgado, é que aquele local passe a ser um “espaço central e residencial”.

Esta votação dá-se mais de um ano depois de a Direcção-Geral do Tesouro e Finanças (DGTF), que gere este lote do Estado, ter entrado com um pedido de informação prévia (PIP) na autarquia para averiguar a possibilidade de ali serem erguidos 13 edifícios para habitação e comércio. Segundo documentos a que o PÚBLICO teve acesso, o loteamento proposto pela DGTF prevê a abertura de uma rua entre a Rua de São Ciro e a Avenida Infante Santo, ao longo da qual surgirão dois conjuntos de imóveis com seis e cinco pisos acima do solo, mais dois abaixo.

“Pretende-se a demolição integral das pré-existências no recinto de uso hospitalar – gabinetes, laboratórios, armazéns, oficinas, etc.”, resume um parecer emitido pela Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), que deu luz verde ao projecto. Nesse mesmo documento diz-se que “todos os edifícios que se pretendem demolir” são “datados dos anos 80/90 do século XX ou do início do século XX”. Além das demolições e da nova construção, o PIP contempla ainda “a criação de um espaço verde frente à fachada poente do convento”.

O assunto anda a ser analisado pelos serviços de Urbanismo da autarquia desde Agosto de 2017 e, neste ano que já passou, tanto a DGPC como a Direcção-Geral de Recursos da Defesa Nacional deram o seu aval ao projecto. “Esta proposta tem o grande significado urbano de libertar o antigo Convento do Sagrado Coração de Jesus das construções que sucessivamente se foram justapondo e que impedem a leitura integral da massa construída. Com o grande plano verde de cobertura do parque de estacionamento público previsto, o enquadramento do monumento é substancialmente engrandecido”, escreveu o director do Departamento de Projectos Estruturantes, Eduardo Campelo, numa informação de Maio deste ano.

Por essa altura, três departamentos da câmara estavam já de acordo em propor a alteração ao PDM de que se falará esta quarta-feira. A 25 de Maio, Manuel Salgado validava a pretensão: “Homologo parecer favorável nos termos propostos”.

O CDS vê neste ‘carimbo’ de Salgado a aprovação do PIP, que por lei teria de ser submetido a votação em reunião de câmara. “Há aqui uma ausência de explicações por parte da câmara. Esta expressão, ‘homologo’, é quando há um ponto final no processo”, diz o centrista João Gonçalves Pereira. “A confirmar-se que há homologação e que há um PIP validado, é um acto nulo, pois o vereador não tem competência para isso”, afirma.

Gonçalves Pereira tinha abordado este assunto já na última reunião pública, em Setembro, o que levou ao adiamento da proposta. Naquele momento, Salgado disse que não havia qualquer PIP aprovado. Numa circular enviada na semana passada a todos os vereadores, o director municipal de Urbanismo diz o mesmo: “O processo encontra-se actualmente a aguardar, (…) a deliberação de câmara sobre a alteração do PDM, para também podermos submetê-lo a decisão final em reunião de câmara.”

Uma vez aprovado o PIP, o proprietário do lote não fica automaticamente autorizado a construir, sendo necessário ainda um projecto de arquitectura e o respectivo licenciamento. Mas o PIP cria expectativas de construção que, à partida, não poderão já ser anuladas. Se a DGTF seguir o padrão dos últimos anos, o mais provável é que os terrenos sejam vendidos a privados.

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