Incêndios de 15 de Outubro: da guerra à esperança

Adriano Miranda
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Adriano Miranda

Se durante os dias e noites em que o fogo lavrou foi a guerra, agora era preciso ir em busca das cicatrizes. E tentar encontrar alguma esperança. Foi isso que os fotojornalistas Adriano Miranda e Nuno André Ferreira fizeram, desafiados pelo vereador da Cultura da Câmara Municipal de Viseu, Jorge Sobrado, a criar uma exposição com fotografias que construísse um percurso temporal desde o dia 15 de Outubro de 2017 - o pior dia de incêndios do ano passado - ao período da reconstrução, que se prolonga até hoje.

Ao longo de seis meses voltaram aos locais onde fotografaram o fogo, no dia 15 de Outubro mas também nos dias que se seguiram. “Encontrei um território marcado, feio, careca, sujo”, descreve Adriano Miranda, fotojornalista do PÚBLICO há mais de 20 anos. Já tinha feito a cobertura de outros incêndios mas nunca nada se aproximou da devastação que presenciou. “O nível de catástrofe não tem nada a ver com outros anos, em área ardida e em número de mortos. Por outro lado, estávamos habituados a incêndios de mata. Agora o incêndio estava nas casas, entrou nas aldeias, chegou às empresas, foi impressionante”, recorda. Adriano Miranda foi distinguido com o Prémio Gazeta de Fotografia pelo retrato de Manuel Francisco publicado na primeira página do PÚBLICO de 17 de Outubro de 2017, e que se tornou num dos símbolos das populações atingidas pelos incêndios florestais do ano passado. A memória dos dias em que correu de incêndio para incêndio ainda é fresca. “Comecei em Pedrógão e acabei no Pinhal de Leiria. Fi-los todos”, afirma. Ainda há dias, no Pinhal de Leiria, deu por si a percorrer exactamente os mesmos caminhos, a procurar as coisas de que se lembrava.

Um ano depois, Adriano Miranda e Nuno André Ferreira (colaborador do grupo Cofina e da agência Lusa na região de Viseu) encontraram um país a duas velocidades, com diferenças na reconstrução pós-incêndio que variavam de município para município. Perceberam que o país não estava nem preparado para um incêndio de tamanhas dimensões, nem para o que seria preciso fazer a seguir. “Estive agora no concelho de Castelo de Paiva e está tudo praticamente igual. Não se fez nada. Podiam fazer ali uma peça de teatro sobre o que aconteceu porque o cenário está igual”, conta Adriano Miranda.

Na exposição Dever da Memória- Da Infâmia à Esperança figuram 72 imagens dos dois fotojornalistas. Para os autores era sobretudo importante deixar um documento para memória futura. Há por isso um livro que acompanha a exposição, com mais de uma centena de fotografias e textos de cinco jornalistas: Sandra Ferreira, Luís Oliveira, Tiago Vergílio Pereira, Patrícia Carvalho e Paulo Moura. A memória, de resto, é evocada na exposição também num registo espacial, num trabalho do estúdio de design portuense Gráficos Associados (que produziu também o livro). A mostra começa no exterior do edifício principal da Quinta da Cruz, em Viseu, onde num túnel escuro há sons e várias fotografias, a que se segue uma sala iluminada, para mostrar o "contraste entre o que morreu, a natureza negra, e a vida quotidiana que regressou a uma normalidade possível", explicou Nuno André Ferreira à LUSA.  A exposição é inaugurada a 15 de Outubro com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

E naquele regresso aos cenários de guerra, o que encontrou Adriano Miranda nas pessoas? “Passividade. Resignação.” E esperança? “Eu e o Nuno dizíamos muitas vezes: o tramado é encontrar a esperança. Foi um exercício difícil. Encontrá-la na atitude das pessoas muitas vezes foi difícil.” Vera Moutinho

Adriano Miranda
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Nuno André Ferreira
Nuno André Ferreira
Nuno André Ferreira
Nuno André Ferreira
Nuno André Ferreira
Nuno André Ferreira
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