O papel do líder da oposição

Rio esteve muito bem ao ter a ousadia, nos dias de hoje, de falar sobre o que é a missão da política e dos políticos em relação ao bem-comum.

O discurso de Rui Rio no encerramento da Universidade de Verão do PSD teve momentos positivos e outros negativos. Esteve bem, finalmente, na crítica ao Governo. Esteve mal, mais uma vez, ao referir-se ao jornalismo. E esteve muito bem ao ter a ousadia, nos dias de hoje, de falar sobre o que é a missão da política e dos políticos em relação ao bem comum, por mais que isso possa irritar políticos e comentadores que vivem mais ligados à politiquice do que à política, como ele próprio disse.

Rio defendeu uma visão alternativa — a sua — de desenvolvimento económico e fê-lo de forma perceptível. Marcou pontos como líder do principal partido da oposição, se bem que os cidadãos continuem à espera das propostas do PSD para o país. Mas houve um momento em que a crítica ao Governo foi acutilante e isso foi uma novidade. Foi quando Rio se referiu ao novelo de incógnitas que ainda rodeia o caso do desaparecimento das armas no Quartel de Tancos.

As suas críticas obrigaram o ministro da Defesa a vir a terreiro defender-se no próprio domingo e o primeiro-ministro a secundar o seu ministro na segunda-feira. A acutilância de Rio não se deve ao paralelo jocoso entre o ridículo à volta deste caso e o sketch de Raul Solnado sobre a guerra “Alô, é do inimigo”. O paralelo é evidente para quem ouviu na infância o 45 rotações de Solnado, e é até tão óbvio que eu mesma o fiz neste espaço de opinião em 4 de Novembro de 2017.

A importância da crítica de Rio advém do facto de ter dito claramente que, sobre este caso, o Governo não sabe o que se passou ou não diz o que sabe, num assunto que é uma questão de soberania e central na segurança do Estado. Mas Rio esteve bem também ao ter pedido rapidez ao Ministério Público, cuja investigação parece enrolada em si mesma, e que tarda em dar explicações ao país.

É preciso dizer que é lamentável e antidemocrático o que Rio disse sobre o jornalismo. Considerar que os jornalistas se movem por vendas e lucro é um acto intencional de miopia intelectual para erguer em adversário os que desempenham uma função única nos sistemas democráticos: o escrutínio dos poderes. Rio sabe e tem obrigação de saber que jornalismo e comunicação social são coisas diversas. É grave para a saúde do sistema político que o líder de um partido fundador da democracia em Portugal confunda o que é diverso, recorrendo à velha prática de disparar contra o mensageiro quando não se gosta da mensagem.

Mas há uma parte da intervenção de Rio que é muitíssimo importante. Quando fala sobre o que deve ser a política, o que deve mover os políticos e sobre o papel de um líder do principal partido da oposição. O presidente do PSD foi claro na defesa de que os políticos devem servir o bem comum, o interesse público, devendo pôr de lado esquemas de defesa de interesses privados e partidários. Declarações que podem surgir como contraditórias — não o sendo — com o clima de confronto que mantém com os seus críticos dentro do partido.

Está certo quando diz que é papel dos políticos e dos partidos contribuírem para mudanças e aperfeiçoamentos da governação e de organização do Estado — a que vulgarmente se chama “reformas estruturais”. A realidade não é estática e a estrutura do Estado e o seu funcionamento têm de se adaptar à realidade que muda. O presidente do PSD apontou cinco áreas em que considera necessários aperfeiçoamentos — justiça, sistema político, Segurança Social, saúde, natalidade —, de modo a responder às necessidades do país. É agora o país que espera que Rio abra o jogo sobre o que propõe, quais as medidas, o modelo que defende para essas reformas. Até agora só apresentou as suas propostas para a Saúde.

O presidente do PSD tem todo o direito, e até dever, de definir a sua estratégia política de acção e os seus timings. Em suma, em determinar como quer credibilizar o PSD e as suas propostas políticas perante o eleitorado. Agora, há um princípio na política que Rio deve ter presente. Que um líder partidário que critica, que defende mudanças e que não passa de jargões generalistas em que se apresenta como “salvador” contra os outros políticos assume os contornos do populismo.

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