Cursos de água: economia e identidade dos territórios

O futuro destes rios passa fundamentalmente pela consciencialização das populações e pela pedagogia do exemplo das autarquias.

Por definição um rio é um curso de água natural, geralmente de água doce, que flui por gravidade em direção a um oceano, um lago, um mar interior, ou um outro rio. Durante vários séculos a qualidade da água de um rio e o bom estado de conservação das suas margens constituíram forte motivo de fixação de populações. Custa dizê-lo, mas não me parece que isso se repita no futuro.
Em Portugal poucas cidades tem o seu nome associado diretamente a um rio. Temos as cidades de Miranda do Douro, Rio Maior, Rio Tinto. E a cidade de Alcobaça tem o seu nome associado a dois rios: o Alcoa e o Baça.
O Douro é um grande rio peninsular que é muito falado, mas o rio Maior e o rio Tinto são rios de pequena dimensão. A importância das coisas não é proporcional ao seu tamanho. O rio Maior (também chamado de vala da Asseca, ribeira da Asseca, vala da Azambuja e vala Real em parte do seu percurso) é um curso de água que nasce em Freiria, muito perto da cidade de “Rio Maior”; tem um percurso de aproximadamente 70 quilómetros; passa na cidade que tem o seu nome; e desagua no Tejo perto de Azambuja. Quanto ao rio Tinto, é o último afluente da margem direita do rio Douro; nasce no lugar de Montes da Costa, freguesia de Ermesinde, concelho de Valongo; tem um percurso com apenas 11 quilómetros e meio; desaguando na zona do Freixo, freguesia de Campanhã, concelho do Porto.
A cidade e o concelho de Alcobaça servem de exemplo sobre a premência de garantir a sustentabilidade dos rios. Não se trata de sustentabilidade dos recursos hídricos em termos genéricos, mas sim de garantir a existência dos cursos de água natural, tanto quanto possível de modo semelhante ao que propiciou a génese de Alcobaça e a sua eleição pelos monges da Ordem de Cister como território para a fundação de uma abadia integrada com um sofisticado e extenso sistema hidráulico. Conforme é sabido, atualmente os cursos de água denominados rio Alcoa e rio Baça estão com problemas de caudal que a não serem resolvidos vão certamente transformar estes antigos rios em simples valas de escoamento quando houver chuva intensa ou persistente, ou sejam, podem passam à categoria de “rios secos”.
Em novembro de 2002 teve lugar na Estalagem do Cruzeiro, em Aljubarrota, um colóquio sobre "Recursos Hídricos a Oeste das Serras de Aire e Candeeiros" que teve como orador convidado Emídio Gil Santos, professor de Hidrologia no Instituto Superior Técnico, entretanto falecido. As razões para a falta de água foram identificadas e explicadas, mas as ações concretas tardam, pois exigem mudança de hábitos das populações.
Os rios devem ser entendidos como elementos ricos em vida, presentes no território, do qual emanam geologicamente e para o qual contribuem economicamente, ecologicamente, culturalmente. Mas, atenção, não devemos nunca dissociar um rio da constituição geológica da sua bacia hidrográfica. Regiões dominadas por rochas graníticas são diferentes, por exemplo, de regiões dominadas por rochas calcárias, nomeadamente quando existe o modelado cársico, que é o caso das Serras de Aire e Candeeiros. Em zonas cársicas formam-se canais subterrâneos por onde se dá a circulação da água. Existem imensos algares e poços, os quais estão ligados entre si. As grutas com as suas galerias correspondem a zonas alargadas destes rios subterrâneos. Toda a zona pode ser entendida como semelhante a uma enorme esponja ou, se preferir, parece uma pedra-pomes (embora esta até seja uma rocha vulcânica …). Em zonas cársicas quando se extrai água num determinado ponto, as consequências dessa extração afetam toda uma região pois estamos a secar a “esponja” como um todo. Cada proprietário não gere apenas a água que retira no seu local, mas sim interfere na gestão da água de toda a região. Assim o futuro destes rios passa fundamentalmente pela consciencialização das populações e pela pedagogia do exemplo das autarquias.

Sugerir correcção
Comentar