A praga dos discursos

Falam para todo o auditório porque os companheiros de mesa não podem com eles.

Há pessoas que não falam - discursam. Dirigem-se a toda a gente. Podem estar viradas para as pessoas com quem estão mas espreitam dos cantos dos olhos para ver se estamos todos a ouvir o que elas estão a gritar.

São discursos pelo alto volume da voz, ajustado para chegar à mesa mais afastada. Dantes pensava que as pessoas discursavam porque achavam que era um desperdício só os companheiros de mesa terem acesso às suas pérolas de filosofia e de humor.

Mas não. Falam para todo o auditório porque os companheiros de mesa não podem com eles. Estes até falam entre eles em voz civilizadamente baixa. Estão habituados a cancelar o ruído dos discursantes, até porque já ouviram aquelas histórias todas mais de cem vezes.

Os discursantes também não insistem numa reacção positiva do público. Isso seria um sonho - um sorriso, um comentário sincero que dissesse "bem dito!" ou "tem toda a razão".

Não, o discursante nem sequer se importa que estejamos todos profundamente irritados por não conseguirmos contragritar-lhe "Por amor de Deus, cale a boca!"

Na verdade só quer ser ouvido. E isso ele ou ela consegue. Está-se nas tintas para a nossa reacção. A única parte de nós que tem interesse para aquela criatura são os nossos ouvidos.

É pior que se despir à frente de todos nós. É como se pusesse nu para nos abraçar mais incomodamente, partilhando suores e sovacos com todos, chorando porque não pode abraçar-nos a todos ao mesmo tempo.

É pena que não se possa prendê-los por atentado à moral pública.

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