Morreu Goldblatt, o fotojornalista do apartheid

O repórter fotográfico tinha 87 anos e deixa um trabalho de documentação de um dos períodos mais cruéis da história da África do Sul, onde nasceu.

Goldblatt expôs em Portugal
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Goldblatt expôs em Portugal. Na fotografia, Serralves Paulo Pimenta
O fotojornalista retratou a segregação social em África do Sul
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O fotojornalista retratou a segregação social na África do Sul Paulo Pimenta
Depois do <i>apartheid</i>, o fotojornalista dedicou-se às paisagens
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Depois do apartheid, o fotojornalista dedicou-se às paisagens e começou a fotografar a cores Paulo Pimenta
A fotografia a cores só chegou depois do fim do <i>apartheid</i>
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A fotografia a cores só chegou depois do fim do apartheid Paulo Pimenta
Goldblatt  tinha 87 anos
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Goldblatt morreu aos 87 anos Paulo Pimenta

Morreu esta segunda-feira em Joanesburgo o reconhecido fotojornalista sul-africano David Goldblatt, cujo trabalho de documentação do apartheid nos anos 60 e 70 marcaria a sua carreira. A notícia foi confirmada pela Goodman Gallery, através de um comunicado. Tinha 87 anos.

Filho de imigrantes judeus lituanos fugidos às perseguições do final do século XIX, Goldblatt nasceu na África do Sul em 1930. A sua matéria de trabalho foi sempre captar as consequências da repressão e segregação entre brancos e negros, um retrato alternativo às imagens dos conflitos causados pelo regime de segregação social desde 1948 até 1994. A sua opção foi a de capturar imagens reveladoras das estruturas que levaram a esses acontecimentos e o impacto no quotidiano da população.

As pessoas e objectos que Goldblatt fotografava nas suas séries a preto e branco eram colocados no centro das imagens e moldados pela luz e pela sombra, por vezes de forma dramática. Posicionava-se a meia distância e concedia domínio de campo aos seus protagonistas, dentro da imagem, mesmo quando as fotos apresentavam condições de vida terríveis.

O trabalho que fez com as condições de vida dos sul-africanos negros a trabalharem em minas de ouro e a sua posterior decadência, perto da Cidade do Cabo, levaria à publicação de um livro em 1973, com a escritora Nadine Gordimer, Nobel da Literatura: On the Mines.

Não obstante ter aguardado o fim do apartheid durante a maior parte da sua vida, a experiência revelou-se perturbadora para Goldblatt, provocando-lhe um inesperado sentimento de estranheza e afastando-o do mundo da fotografia durante alguns anos.

Só no final do apartheid o repórter fotográfico passou a utilizar a fotografia a cores, registando paisagens (o que antes considerava inapropriado) e a imprimir os seus trabalhos em grandes dimensões.

David Goldblatt tornou-se o primeiro sul-africano a ter uma exposição exclusiva no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA), em 1998. Esteve também exposto em Portugal, na Fundação Serralves e no CCB. 

A exposição das obras de David Goldblatt em Serralves, Intersecções Intersectadas, foi composta sobretudo por pares de fotografias que confrontavam imagens a preto e branco (tiradas durante o apartheid) com imagens a cores (do pós-apartheid), permitindo, por vezes, observar o mesmo local com 20 anos de diferença, introduzindo assim um forte elemento temporal na exposição. Tinha ainda trípticos que mostravam o mesmo local de vários ângulos e imagens da série In the time of AIDS, bem como cerca de 40 imagens da cidade de Joanesburgo, dos vários períodos da carreira do repórter fotográfico.

A mostra no CCB, que reuniu 51 anos de trabalho do fotojornalista, era sobretudo dominada pelo testemunho político de Goldblatt, dos anos do apartheid.

O Presidente sul-africano já expressou as suas condolências no Twitter. 

Cyril Ramaphosa destacou que Goldblatt captou o sistema de valores sociais e morais que existiam e que influenciaram o cenário político. "O país está orgulhoso da sua contribuição ao retratar através da fotografia”, afirmou em nota oficial.

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