Crianças na prisão

No sistema prisional não há pelos vistos movimentos bem falantes pela igualdade de género. Não há gritos contra a discriminação e contra o sexismo, antes pelo contrário. Assim apenas as mães e não os pais, e só de crianças muito pequenas, as podem manter junto de si.

A única vez que me comovi a sério dentro de uma prisão foi quando, numa visita que fiz à cadeia de Tires, uma menina de uns três anos me ofereceu um desenho feito por ela, que ainda guardo. Em Tires, cadeia feminina, existe a Casa das Mães, onde reclusas com filhos pequenos, alguns praticamente recém-nascidos, podem permanecer com estes junto de si, em quartos maiores e onde funciona também uma creche que acolhe durante o dia algumas dezenas de crianças.

No sistema prisional não há pelos vistos movimentos bem falantes pela igualdade de género. Não há gritos contra a discriminação e contra o sexismo, antes pelo contrário. Assim apenas as mães e não os pais, e só de crianças muito pequenas, as podem manter junto de si.

Esta Casa das Mães funciona há vários anos e é globalmente elogiada. A alternativa à sua existência seria a separação quase total entre mães e filhos, entrecortada por visitas curtas. Mulheres que são presas durante a gravidez ou mães com crianças até aos três anos poderão ali ser alojadas, com a vantagem da proximidade dos filhos, mas também com o ónus da privação da liberdade e de um mundo mais vasto que se estende às crianças, mesmo quando estas saem ocasionalmente com familiares ou com as próprias reclusas.

Na sua larga maioria, dizem as estatísticas, estas mulheres, jovens, enfrentam a prisão por tráfico de droga. Foram correios em operações que correram mal e acabaram em Tires. Mas também existem as outras, muitas, cujas crianças não estão com elas na prisão, e que também são mães.

Fará sentido manter uma pena de prisão efectiva para jovens mães e condenar também os seus filhos a uma primeira infância em reclusão, mesmo com todas as atenuantes criadas? E o que sucede à criança aos três anos ou um pouco mais tarde, quando a separação da mãe se torna, comparativamente, quase total, saindo obrigatoriamente aquela de Tires onde a mãe continuará a cumprir pena?

Provavelmente não há respostas absolutamente boas, mas poderia valer a pena revisitar o modelo. Existe hoje, para o bem e para o mal, a tecnologia que permite controlar a localização e a actividade de qualquer pessoa. Permite circunscrevê-la a um espaço ou impedir a sua deslocação a um outro. As possibilidades de limitação da liberdade fora da prisão no nosso tempo não se limitam a cercear a deambulação. Ironicamente, serão eventualmente até mais intensas e mais sentidas como punitivas do que as possíveis dentro de uma prisão.

Se a prisão como pena acusa inquestionavelmente o peso do tempo e da falibilidade na sua execução e nos seus resultados, isso seguramente é ainda mais verdade nestes casos. O lugar das crianças não é na prisão, mesmo sabendo aceitar que, em casos concretos, a Casa das Mães de Tires poderá ser a melhor casa ou a única casa possível para aquela mãe e aquela criança.

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