Palavras, expressões e algumas irritações: bichos

Qualquer pessoa de bom senso será contra os maus tratos em animais. Mas, à luz da maior parte dos defensores dos seus direitos, há uns animais mais animais que outros.

“Os animais tornaram-se uma religião, apesar de vivermos num Estado laico”, ousou dizer Filipe Matos, docente de Coimbra e especialista em Código Civil, e ainda sugeriu que se está a consagrar na lei que “quem não gosta de animais é má pessoa”.

Apoiado por outra professora, Mafalda Barbosa, ambos “não se conformam com aquilo que consideram ser uma ignominiosa equiparação legal dos bichos às pessoas e escreveram um livro a dizer isso mesmo”.

Lê-se num dicionário online que “bicho” é uma “designação geral dada a qualquer animal”. Um dicionário impresso regista “animal” como um “ser vivo organizado, dotado de movimento próprio e de sensibilidade”. E acrescenta a frase: “O homem é um animal.”

Qualquer pessoa de bom senso será contra os maus tratos em animais. Mas, à luz da maior parte dos defensores dos seus direitos, há uns animais mais animais que outros. Em geral, os protegidos são os “fofinhos” cães e gatos (porque fazem companhia e são submissos) os touros (por causa das touradas) e os porcos (por causa das bifanas).

Porque não se opõem à desratização e à desbaratização? E quem é que defende as moscas, os mosquitos, as aranhas, os sapos, os gafanhotos? E já pensaram, antes de comer um ovo estrelado, que poderia ter sido um adorável pintainho que foi roubado à mãe sem nunca ter habitado um ninho?

Demagogia? Claro. Mas só para lembrar que quem não estiver confortável perto de alguns animais não tem de se sentir “má pessoa”, nem tem de ser obrigado a suportar os “bichos” e os seus donos. Normalmente, parecidos.

É difícil aceitar um mundo que reivindica a entrada de cães num restaurante, ao mesmo tempo que ali proíbe a presença de crianças (estabelecimentos child free).

O dicionário regista ainda uma prática pouco recomendável, “matar o bicho”, ou seja, “quebrar o jejum, em especial bebendo aguardente ou outra bebida alcoólica”.

A rubrica Palavras, expressões e algumas irritações encontra-se publicada no P2, caderno de domingo do PÚBLICO

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