Bairro das Pedreiras surpreende governantes: “É muito pior do que eu pensava”

Secretárias de Estado visitaram comunidade cigana que vive em barracas. Inquérito feito pelo Governo indica que Programa Especial de Realojamento, dos anos 90, veio, em muitos casos, agravar a exclusão.

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Há mais de dez anos que as barracas e tendas são o único abrigo de centenas de pessoas em Beja Enric Vives-Rubio
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Ana Pinho, secretária de Estado da Habitação, saiu da viatura que a transportou ao Bairro das Pedreiras em Beja, onde está concentrada boa parte da mais numerosa comunidade cigana do distrito, e ficou siderada com o aglomerado de barracas. O seu olhar rodou 360 graus e desabafou para quem estava nas proximidades: “Tinha informação sobre este bairro, mas o que vejo é muito pior do que aquilo que eu pensava.”

A realidade não se escondia. As crianças corriam de um lado para o outro ou cirandavam em redor dos visitantes, surpreendidas com um aparato inusitado numa comunidade que vive longe de tudo, nos arredores da cidade de Beja. Na manhã desta terça-feira, os residentes viram surgir do meio de um intenso nevoeiro, que a todos gelava, Ana Pinho, que acompanhava a sua colega de governo Rosa Monteiro, secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade. Estavam acompanhadas pelo alto-comissário para as Migrações, Pedro Calado, e pelo presidente da Câmara de Beja, Paulo Arsénio.

O panorama era desolador: as crianças circulavam mal agasalhadas, acossadas por tosses persistentes, enquanto os pais reclamavam por uma habitação que os libertasse de vidas inteiras a viver debaixo de toldos.  

A história deste bairro remonta a 2006, altura em que a câmara construiu 50 habitações para alojar cerca de 250 pessoas de origem cigana. Ao lado havia o chamado “parque nómada”, mas, ao longo dos anos, o que era efémero tornou-se permanente e em volta das casas de alvenaria nasceram cerca de duas centenas de barracas onde vivem mais de 500 pessoas. Só crianças em idade escolar são mais de 100. Junto ao bairro correm ininterruptamente as águas sujas vindas das diversas lavagens feitas no parque de materiais da autarquia.

Questionada pelo PÚBLICO sobre se a resposta encontrada há mais de dez anos pela Câmara de Beja para alojar esta comunidade era uma solução aceitável, Ana Pinho demarcou-se. “Quando se entra num bairro destes, pensa-se logo na urgência e na premência de encontrar uma resposta eficaz e efectiva”, disse. Reconheceu ser “mais complexo integrar comunidades que foram desintegradas como o modelo de acesso à habitação [do Bairro das Pedreiras] do que integrar comunidades que nunca o foram”. E referiu que no inquérito efectuado pelo seu ministério (do Ambiente), concluído a 31 de Dezembro, sobre as carências habitacionais graves a nível nacional, se aponta para a existência de “vários casos de exclusão social que subsistiram após o grande boom das respostas nos anos 90 a nível do Programa Especial de Realojamento (PER) e do Prohabita” e que prevalecem um pouco por todo o país. Tal como no Bairro das Pedreiras, estes casos “precisam de uma resposta estruturada mas acima de tudo integrada”, acentuou Ana Pinho. Admitiu que este tipo de situações “são muito preocupantes”. No entanto, e apesar de exigirem respostas imediatas, tal “não é possível”, considerou, explicando que a solução tem de ser “integrada e global” para responder a problemas que se acumularam ao longo de décadas de inacção e de desinvestimento, sobretudo no caso das comunidades ciganas.

A secretária de Estado para a Igualdade sublinhou a importância de se encontrarem “soluções sustentadas” para a comunidade cigana de Beja, pois “ninguém pode estar tranquilo com pessoas a viverem em exclusão social”. A realidade que observou em Beja “subsiste há décadas”, assinala, frisando que as soluções “nunca serão rápidas, até porque os problemas são complexos”.  

Para evitar o mesmo erro nas políticas de habitação, a secretária de Estado da Habitação referiu que já foi aprovada uma estratégia que tem como primeiro objectivo dar respostas a situações como a que existe no Bairro das Pedreiras.

O presidente da câmara adiantou que, em primeiro lugar, “há que fazer o diagnóstico da situação”, reconhecendo que a autarquia tem de se empenhar com os parceiros do distrito e com o Governo para minimizar um problema social “grave”.

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