Soares dos Santos acompanham Unilever na venda das margarinas à KKR

Sociedade Francisco Manuel dos Santos, holding da família que controla a Jerónimo Martins, vai seguir a sua parceira industrial e alienar negócio de margarinas em Portugal. Gelados Olá permanecem na fábrica.

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Unidade industrial da Unilever em Santa Iria de Azóia vai continuar a produzir gelados Olá, que “não estão à venda”, garante a SFMS Daniel Rocha

Noventa anos depois dos Estabelecimentos Jerónimo Martins & Filhos terem registado a marca Vaqueiro no país, baptizando em língua portuguesa a margarina Cowherd que compravam à holandesa Margarine Unie e importavam desde 1926 para território nacional, o creme vegetal para culinária vai deixar definitivamente de ser português.

A Sociedade Francisco Manuel dos Santos, “holding” detida pela família Soares dos Santos (liderada por Alexandre Soares dos Santos e por José Soares dos Santos) e pelos restantes herdeiros de Francisco Manuel dos Santos (fundador do grupo Jerónimo Martins) e que controla 56,1% da Jerónimo Martins SGPS, deverá desfazer-se este ano da participação que detém na área de fabrico de margarinas, cuja produção se localiza em Santa Iria de Azóia.

O desinvestimento é uma consequência da opção estratégica da multinacional Unilever, conhecida a 15 de Dezembro. A anglo-holandesa dona do Axe, Lipton e Rexona vai alienar, por 6,82 mil milhões de euros, toda a área de margarinas e cremes vegetais que detém em 66 países, ao aceitar a oferta da gestora de fundos norte-americana KKR. A operação está “sujeita a determinadas autorizações regulatórias e à consulta dos trabalhadores em certas jurisdições”. Mas, caso seja aprovado, o negócio deverá estar concluído “em meados de 2018”, adiantou em comunicado a Unilever (nascida da fusão entre a Margarine Unie e a britânica Lever Brothers, em 1930).

Em Portugal, a Unilever tem uma parceria industrial com a família dona da Jerónimo Martins com 68 anos, fruto dos negócios de representação de marcas que ambas tinham há mais de 90 anos. A joint-venture – que chegou a ter o nome de Unilever Jerónimo Martins até 2016 mas voltou à designação Unilever Fima no ano passado – é controlada em 55% pela Unilever e em 45% pela SFMS. Fima, de Fábrica Imperial de Margarina, foi o nome da primeira sociedade que arrancou com a produção da Vaqueiro em Portugal, interrompida que fora a importação da Holanda durante a segunda Guerra Mundial.

Gelados e caldos culinários ficam

No rol de activos que agora se prepararam para mudar da Unilever para a gestora de fundos norte-americana KKR está parte da unidade industrial portuguesa em Santa Iria de Azóia. O pólo industrial é abrangido na operação, explicou fonte oficial da SFMS.

“Sim, a oferta de compra da KKR foi feita ao negócio de cremes vegetais da Unilever”, e “esta operação terá implicações em Portugal”, confirmou por email ao PÚBLICO, reiterando que, no país, “o negócio encontra-se dentro de uma joint-venture [a Unilever Fima] na qual a Sociedade Francisco Manuel dos Santos tem uma posição minoritária” (de 45%), “que por sua vez detém 100% da Fima-Olá”.

“Como princípio”, explica ainda a SFMS, “foi acordado com a Unilever acompanhar a venda do negócio dos cremes vegetais também em Portugal”, onde estão empregues mais de uma centena de pessoas. Mais precisamente, adianta, “102 pessoas”, que estão “100% alocadas aos cremes vegetais, nas áreas de produção, manutenção e armazém”.

Como a Fima, a área de margarinas e “cremes vegetais” (o que inclui ainda as marcas Planta, Flora e Becel), está agregada à dos gelados Olá nas instalações industriais localizadas em Santa Iria de Azóia, há que fazer uma separação dos activos, adianta fonte oficial da SFMS. “Dependendo dos termos acordados para a venda do negócio de cremes vegetais, ainda em discussão, será definida esta divisão de activos garantindo a continuidade do restante negócio da Fima-Olá”.

O futuro das instalações industriais até agora usadas para a produção de margarinas, assim como o destino dos 102 trabalhadores a elas afectos estão assim dependentes dos termos finais da operação de venda, ainda em negociação, acrescentou a mesma fonte. O destino destes trabalhadores já foi, aliás, motivo de um comunicado da Fiequimetal (Federação Intersindical afecta à CGTP-IN), no passado dia 8 de Janeiro, demonstrando preocupação com as consequências futuras da operação.  

Mas, salienta fonte da SFMS, “os restantes negócios de Fima-Olá, dedicados à produção de gelados ou de caldos culinários [Knorr], não foram alvo de oferta nem estão à venda”. “A unidade da Olá não está em fase de alienação”, garante. “A operação de venda inclui apenas o negócio de cremes vegetais”, reiterou fonte oficial da SFMS, em declarações escritas. 

A parceria industrial entre a família Soares dos Santos e a Unilever esteve até há pouco mais de um ano sob a Jerónimo Martins SGPS, através da Monterroio, detida a 100% pela companhia de distribuição e criada em 2011 já com sede na Holanda.

Mas, em Setembro de 2016, a Jerónimo Martins vendeu a Monterroio aos seus accionistas de controlo por 310 milhões de euros. A área de distribuição (Pingo Doce, Biedronka e Ara) ficou desde aí definitivamente separada da indústria e da representação de marcas da Unilever.

A Sociedade Francisco Manuel dos Santos passou assim a deter directamente as participações industriais, nomeadamente 45% do negócio das margarinas, caldos para culinária (Knorr) e dos gelados (Olá); e outros 45% da Gallo Worlwide, que produz e comercializa os azeites Gallo (igualmente controlada pela Unilever em 55%). Agora, se o negócio entre a Unilever e a KKR se concretizar, fica sem as margarinas.

E, aos 90 anos, a Vaqueiro passa de luso-anglo-holandesa a norte-americana. 

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