A cidadania Europeia

Infelizmente, a UE, perante a crise económica e financeira em alguns Estados membros, não tem cumprido a sua missão, preconizada no Tratado de Lisboa.

O facto de os portugueses estarem integrados na Comunidade Europeia, são-lhe atribuidos um conjunto de direitos políticos e sociais que importa conhecer.

 O conceito de cidadania, como conjunto de direitos e obrigações, evoluiu ao longo da história. Na Idade Média, implicava a ligação subordinada do indivíduo ao suserano. Com o advento da Revolução Francesa e a formação do Estado moderno evoluiu para um vínculo entre o indivíduo e o seu Estado. Depois, com a criação das Comunidades Europeias, surgiu então “o estatuto de cidadania europeia”, como o conjunto de direitos e deveres, privados e públicos, no espaço comunitário, que assiste aos nacionais dos vários Estados membros.

A criação comunitária visou inicialmente o estabelecimento de uma Europa de liberdade económica, evoluindo depois na procura dos valores do homem a quem as ordens jurídicas – internas e internacionais – atribuem direitos e impõem obrigações. Nesta evolução, teve grande importância o Tratado de Amesterdão, de 1997, que representou um avanço muito importante na proclamação do respeito aos princípios da democracia e das liberdades fundamentais.

Poucos anos antes, já o Tratado de Maastricht (Holanda), assinado a 7.2.1992 (com entrada em vigor a 1.01.1993), havia alterado a designação de Comunidade Económica Europeia (CEE) para União Europeia (UE), retirando-lhe a sua índole exclusivamente económica, abrindo-a também aos domínios da cidadania, às políticas de educação, cultura, cooperação no desenvolvimento, saúde pública e defesa dos consumidores. Depois de criadas estas condições, o caminho que alguns defendem vão no sentido de uma maior aproximação ao federalismo europeu, com uma Constituição Europeia.

O Tratado de Maastricht (Holanda) veio permitir aos nacionais dos Estados membros o recurso a diversas formas de participação política em qualquer Estado da UE em que os cidadãos residam e de que não sejam nacionais, vg. direito eleitoral activo e passivo nas eleições para o Parlamento Europeu, a eleição para as autarquias locais, o direito de petição ao Parlamento Europeu, direito de queixa ao Provedor de Justiça Europeu e o direito de proteção consular no exterior. Além destes direitos, citam-se ainda: a liberdade de circulação e residência no território dos Estados membros, direito de se dirigir às instituições europeias numa das línguas oficiais e obter resposta na mesma língua, direito de acesso aos documentos do Parlamento e direito de igualdade de acesso às funções públicas comunitárias.

No que respeita aos direitos sociais, importa referir a proclamação solene que os dirigentes da UE fizeram, no passado dia 17 do presente mês, na “Cimeira Social para o Emprego Justo e o Crescimento”, em Gotemburgo, na Suécia. A proclamação (Carta) do pilar europeu dos Direitos Sociais foi assinada e explicada pelo presidente Jean-Claude Juncker, anunciando um conjunto de 20 princípios e direitos entre os quais se encontram: a igualdade de oportunidades; a educação e aprendizagem ao longo da vida; prestações por invalidez; inclusão social; diálogo social e envolvimento dos trabalhadores; apoio activo ao emprego, seguro e adaptável; salário justo; diálogo social; equilíbrio entre a vida profissional e privada; apoio a crianças e idosos; cuidados de saúde; rendimento mínimo; prestações de desemprego, entre outros.

Saliente-se que a introdução da cidadania na União era já um velho desejo de Winston Churchill, expresso num discurso na universidade de Zurique, em 1946, que denominava de “cidadania comum”. Mas, a cidadania europeia é ainda um projecto político em mutação, no qual alguns autores colocam interrogações permanentes acusando-o de enunciar mais direitos que deveres, mas todos estão de acordo em que na construção europeia aparecem formas novas de solidariedade entre os europeus, como, por exemplo, os mecanismos de correcção das desigualdades entre regiões, em nome da “coesão social”. A UE tem actualmente uma arquitectura específica, dotada de ampla margem de autonomia e com um projecto ambicioso que a distingue das tradicionais organizações internacionais e que pode ainda ser mais aperfeiçoada se vier a ser aprovado no futuro um Tratado Constitucional ou se vier a cair no federalismo, velha aspiração de muitos políticos.                

Recorde-se que o federalismo europeu, na linha do pensamento de Kant e Proudhon, começou a ser referenciado por alguns autores no período a seguir à primeira Guerra Mundial, destacando-se entre eles Aristides Briand, ministro dos Negócios Estrangeiros francês, que em 1929, numa reunião da Assembleia da Sociedade das Nações, chamou a atenção da necessidade da criação de um “laço federal” entre os povos europeus. A criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA) pela sua dimensão supranacional veio mesmo a gerar uma euforia federalista, mas que acabou por redundar num movimento de natureza comunitária que haveria de conduzir à criação da CEE.

Para os defensores do federalismo, esta é a melhor forma de vida política e social para uma Europa Unida “onde o aspecto básico é o pluralismo, a sua tendência fundamental é a harmonização e o seu princípio regulador é a solidariedade, tendo como resultado final a ordem, o progresso, a justiça a estabilidade e a paz”. Outros dizem que a união política é a única saída para o Velho Continente.

Infelizmente, a UE, perante a crise económica e financeira em alguns Estados membros, não tem cumprido a sua missão, preconizada no Tratado de Lisboa, de “coordenadora das políticas dos Estados membros, com empenhamento no desenvolvimento sustentado”, pondo em causa, deste modo, os fins para que foi criada.

 

 

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