O turismo deu ainda mais visibilidade às questões da habitação

Em Lisboa e no Porto os candidatos assumem, nos programas, a necessidade de garantir habitação a preços acessíveis para os residentes.

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Nos centros de Lisboa e do Porto a pressão do turismo tem sido evidente Enric Vives-Rubio

Não há volta a dar. As políticas de habitação estão, como sempre estiveram, no centro dos programas eleitorais de todos os principais candidatos de Lisboa e Porto, duas cidades que há muito vêm perdendo habitantes. A novidade nesta campanha é a associação, generalizada, entre um tema que é um clássico e a recente pressão do turísmo, desejado pelo efeito de dinamização da economia e da reabilitação urbana, já comprovado, mas apontado como uma das causas para o aumento dos preços na habitação.

Nem a líder do CDS e candidata Assunção Cristas - cuja passagem pelo Governo ficou ligada à nova Lei das Rendas - deixa de dissociar, nem que seja em parte, o problema do aumento do preço das rendas da pressão do investimento destinado ao turismo. A palavra de ordem, encontrada no texto dos programas da maior parte dos candidatos é, por isso, o de prosseguir a aposta neste sector, mas de forma sustentável, tendo em conta que, como admite o próprio presidente da Câmara de LIsboa e candidato Socialista, Fernando Medina, os seus efeitos fazem-se sentir também sobre o transporte e a limpeza urbana.

Concentrando atenções na questão da habitação, emerge nesta campanha, em todas as forças políticas e nas duas cidades, um discurso que vai para lá daquela que tem sido a política de sempre dos municípios - a construção de habitação social - e atira para os ombros dos próximos executivos de Lisboa e Porto a tarefa de regular os mercados locais, ou intervir proactivamente, por via de parcerias com agentes privados, na edificação de casas destinadas à classe média. Fruto do envelhecimento da população, um dos alvos das preocupações transpostas para os manifestos eleitorais são os jovens, cujo nível de rendimento, no início da respectiva vida laboral, está muito aquém dos preços praticados para aquisição ou arrendamento de casas nas duas cidades.

Ao mesmo tempo que promete pôr seis mil casas no mercado, a preços acessíveis, Medina propõe por exemplo “a implementação urgente da redução da tributação em sede de IRS para 10% nos contratos de arrendamento habitacional de duração superior a 10 anos, como meio para garantir o aumento da oferta de arrendamento no mercado e a consequente diminuição do valor das rendas”. O investimento municipal, como forma de mexer com o mercado, é também um compromisso de Teresa Leal Coelho (PSD). Já Assunção Cristas defende, à semelhança do que Rui Moreira está a propor no Porto, que a Taxa Turística que Lisboa já cobra seja aplicada na melhoria da qualidade de vida dos residentes.

A CDU e o Bloco, que acusam Cristas de ter provocado o problema, com a Lei das Rendas, e Medina de pouco ou nada ter feito para o debelar, insistem também que o município deve ter um papel activo, reabilitando para arrendar a preços acessíveis. Os bloquistas, que pedem um aumento de um euro na taxa turística, e o seu investimento na habitação, especificam que as casas estritamente dedicadas àquilo que designam como turismo habitacional fiquem sujeitas “a licenciamento específico e com quotas territoriais, assim como a hotelaria tradicional”.

No Porto, onde o PSD se apresenta com o slogan Porto autêntico, Rui Moreira, actual presidente da câmara e recandidato, assume que é preciso mitigar o risco de o turismo globalizador vir a fazer desaparecer “o encanto natural” e a autenticidade da região. Não escamoteando a existência de uma “falha” no mercado habitacional, o independente apoiado pelo CDS já disse que usará a receita de uma futura taxa turística para comprar habitação no centro da cidade, colocando-a depois no mercado, a preços acessíveis para a classe média e promete impedir, por via da regulamentação, a proliferação de casas com tipologia T1 nos novos projectos de reabilitação.

A candidatura Porto Autêntico, encabeçada também por um independente, Álvaro Almeida, aposta em parcerias com privados e nos benefícios fiscais para reabilitação que garantam habitação com preços comportáveis pelos mais jovens. O socialista Manuel Pizarro pretende reduzir a taxa de IMI em 40% para os fogos arrendados em regime de renda controlada e entregar terrenos municipais a promotores privados, com vista à construção ou reabilitação, garantindo a colocação no mercado, no espaço de um mandato, de 3000 fogos, distribuídos por toda a cidade, com rendas máximas entre 275 euros (T1) e 400 euros (T4).

À esquerda, o Bloco, encabeçado por João Teixeira Lopes, quer construir mil casas de habitação social e 1500 outras com rendas acessíveis à classe média, usando, entre outras fontes de financiamento, a receita da taxa turística a criar. Os bloquistas defendem um travão à proliferação de casas exclusivamente dedicadas ao arrendamento turístico e propõe até uma moratória de um ano no licenciamento de novos hotéis. A CDU, que candidata Ilda Figueiredo, defende também o reforço da regulamentação, com o objectivo de travar novos licenciamentos e, para além do investimento municipal em casas com rendas acessíveis, propõe o apoio às cooperativas de habitação.

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