Construção de loja do turismo no ex libris da Póvoa de Varzim debaixo de fogo

A estrutura da loja interactiva do turismo no Passeio Alegre não tem agradado muitos poveiros. Depois de a câmara e a assembleia municipal terem aprovado o projecto de execução por unanimidade no início do ano, o consenso, afinal, já não existe.

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A nova loja de turismo deverá abrir as portas em Outubro ou no início de Novembro Adriano Miranda
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Adriano Miranda

O Grande Hotel da Póvoa, a estátua do Cego do Maio — salva-vidas e pescador poveiro, herói local — e o Casino da Póvoa vão ter uma nova “vizinha”. A nova loja de turismo, com componente interactiva, começou a ser construída no início do Verão e está prestes a ser acabada. Porém, a novidade não parece estar a ser bem recebida. Nas redes sociais, grupos de cidadãos têm-se manifestado contra a estrutura de betão e vidro. Ali perto, no Largo do Passeio Alegre, vários transeuntes comentam e tiram fotografias. E o assunto chegou à campanha autárquica.

Já fora da época balnear e do calor de outros dias, o Largo do Passeio Alegre em Setembro já não tem a afluência dos turistas que atravessam aquele espaço em direcção à praia. No entanto, o local sempre serviu de “romaria” para os poveiros: fosse para o passeio de domingo, como local de passagem ou para apanhar um pouco de sol nos bancos virados para a praia. Nos últimos dias são poucos os que não param para olhar para a futura loja de turismo interactiva da cidade — construída no Passeio Alegre, ao lado do Cego do Maio e com o casino e o hotel por detrás. “Tira muita visibilidade para o resto para o largo. Isto é suposto ser um espaço aberto”, dizem Carlos Soares e a mulher a ao PÚBLICO, moradores há mais de 30 anos na Póvoa de Varzim.

Nas redes sociais, as fotos com “o antes e o depois” do Passeio Alegre sucedem-se. Vários queixam-se da estética do edifício, outros defendem o protagonismo de outros pontos de interesse históricos, como a estátua do pescador poveiro, e há também quem não goste de ver o Passeio Alegre repleto de construções de betão. Rajesh Shah, elemento da direcção do Grande Hotel da Póvoa, afirma que a loja interactiva “retira um pouco da estética do hotel”, mas acredita que a longo prazo possa ser uma “mais-valia” para os clientes.

O PÚBLICO contactou o gabinete da presidência de Aires Pereira, actual presidente da Câmara da Póvoa de Varzim e de novo candidato pelo PSD à autarquia, que informou por email não estar “disponível para a entrevista solicitada” devido ao “período de campanha eleitoral” por ser “recomendado a todos os candidatos em exercício de funções a reserva da utilização das suas funções para exposição ou aproveitamento político”. Ainda assim, foram enviados três documentos que mostram a unanimidade, tanto do executivo como da assembleia municipal, para a “abertura de um procedimento de ajuste directo” para a contratação do projecto de execução da loja interactiva do turismo, com o valor de 22 mil euros. No total, a obra está orçamentada para cerca de 158 mil euros, segundo o painel colocado à frente da construção.

Local privilegiado

O primeiro documento data de Dezembro de 2016 com o despacho de Aires Pereira para a ratificação do processo junto do executivo municipal — com maioria PSD, três vereadores do PS e um vereador do CDS-PP. A 23 de Janeiro, a proposta foi ratificada pelo executivo e a 9 de Março pela assembleia. Segundo a página oficial da autarquia, o presidente da câmara afirmou que o “equipamento novo” iria “ser colocado em frente ao casino, um local por excelência de utilização turística”.

No estudo prévio do projecto de execução da loja interactiva, a que o PÚBLICO teve acesso no Departamento de Projectos, Obras e Ambiente da câmara, está escrito que vai ser tirado “partido da sua localização como ponto de encontro e convergência privilegiado dos eixos principais de comunicação viária e pedonal, eixos de fluidez citadina, e da marginal, ponto de passagem e encontro visual com a proximidade da praia e do mar”. No entanto, a obra parece estar a surpreender muitos. “Não sabíamos como seria a dimensão daquilo”, diz o morador Carlos Soares.

Na campanha autárquica o assunto também está na ordem do dia. Pedro Guimarães, candidato do CDS-PP, defende: “O que foi dado a conhecer é que seria um pequeno edifício em vidro. Foi isso que foi dito em reunião de vereação. Verificámos que não corresponde à realidade.” O candidato compromete-se a demolir a estrutura, caso seja eleito.

O PS, pela voz do candidato Miguel Fernandes, também acredita que houve uma “falta de articulação” na reunião de câmara entre a oposição e a maioria. “Não acho que a localização seja a mais adequada, porque não é expectável que ali entrem grandes cruzeiros. O acesso de turistas não vai ser pelo mar”, acrescenta. Com dois postos de turismo na Póvoa, um perto do mercado municipal e outro dentro da Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição — inaugurado em Fevereiro do ano passado depois profundas obras de reabilitação no “castelo” —, Victor Pinto, do Bloco de Esquerda, não concorda com a localização da loja de turismo interactiva, nem sequer com a sua existência.

A CDU ainda não tomou uma posição. Porém, o candidato José Rui Ferreira está atento à contestação. “Há uma interferência grande no Passeio Alegre e acabou por ser construído um edifício que surpreendeu muito as pessoas”, diz. “Aquilo que tem aparecido nas redes sociais tem que ver, e não estou a subestimar, com questões de ordem estética”, refere o candidato da CDU. Para já o partido está a estudar se do ponto de vista jurídico seria permitido “aquela desafectação do espaço público”.

Diana Vianez do PAN acredita que deveria ter havido uma “auscultação pública” acerca da localização da nova loja de turismo. Já Esmeralda Carmo, pelo Partido da Terra, acredita que “os poveiros acham que ficou defraudada a imagem de cartão-de-visita da cidade”.

O Passeio Alegre foi classificado pelo então Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR), hoje Direcção-Geral do Património Cultural, como um imóvel de interesse público. Para Rui Mealha, investigador do Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, “é difícil lidar com intervenções em espaços que têm forte carga simbólica e, por isso, as coisas devem ser muito bem estudadas”.

Para além dos elementos interactivos, o projecto terá também uma zona de playground (recreio/lazer), onde os utilizadores podem usufruir da vista a partir deste espaço. A nova loja de turismo vai estar integrada na rede de lojas interactivas do Turismo do Porto e Norte de Portugal.

A nova loja de turismo deverá abrir as portas em Outubro ou no início de Novembro.

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