Riscos psicoergonómicos e psicossociais no trabalho numa Europa envelhecida

Abordar a saúde no trabalho do trabalhador envelhecido versus trabalhador jovem requer ter presente os efeitos que a idade tem sobre a capacidade do trabalhador para o trabalho.

Não é comum na literatura da prevenção de riscos fazer a distinção entre riscos psicoergonómicos e psicossociais. Estes dois tipos de riscos, muito distintos uns dos outros, e com efeitos diferentes nos trabalhadores conforme a idade, são normalmente abordados dentro da categorização genérica dos riscos “psicossociais”, sem qualquer preocupação nem quanto à necessidade daquela diferenciação nem quanto aos efeitos que este tipo de riscos tem sobre o trabalhador em função da idade.

Para a eficácia da prevenção e melhoria da saúde mental no trabalho é fundamental fazer a referida diferenciação e ter em conta os efeitos distintos que cada tipo de riscos tem sobre o trabalhador conforme ele seja jovem (até 45 anos) ou envelhecido (mais de 45 anos).

Tendo em atenção o mundo do trabalho na hipermodernidade (conceito que preferimos ao de pós-modernidade), podemos dizer que duas características sobressaem quanto à natureza e ao conteúdo do trabalho atual: a) o uso dominante das tecnologias de informação e comunicação; b) a necessidade de interagir socialmente na maioria das atividades de trabalho e profissões (hoje, cerca de 80% da população ativa trabalha com/para outras pessoas).

Da interação do indivíduo com o mundo físico, em particular com as novas tecnologias, podem resultar riscos psicoergonómicos, ou seja, riscos de natureza psicológica que têm origem numa variável física e afetam o cérebro e a mente através de processos fundamentalmente cognitivos relacionados (sobretudo) com a recolha, processamento, armazenamento e utilização da informação (perceção, inteligência, memória). São exemplo de riscos psicoergonómicos, os riscos do tecnostresse (v.g., a tecnoadicção, a tecnofadiga, a tecnoansiedade, a tecnoirritação), o stresse térmico, o stresse auditivo, a carga mental de trabalho.

Da interação do indivíduo com outros (ou outros) indivíduos (s) podem resultar riscos psicossociais (tout court), ou seja, riscos de natureza psicológica que têm origem em variáveis psicossociais, em especial em interações sociais negativas que afetam o cérebro e a mente através de processos (fundamentalmente) de cognição social relacionados (sobretudo) com o modo como percebemos as outras pessoas (perceção social, interpretação da conduta social). São exemplo de riscos psicossociais, a violência, o stresse psicossocial, a síndrome de burnout, o assédio moral, o assédio sexual, as adições psicossociais (v.g., toxicodependências, tabagismo, alcoolismo).

A propósito da campanha europeia em curso, com a designação Locais de trabalho saudáveis em todas as idades 2016-2017, é oportuno exemplificar de que modo a distinção que acabo de fazer parece ser importante para o aumento da eficácia da prevenção dos “riscos psicossociais” nomeadamente numa população trabalhadora envelhecida como é atualmente a população trabalhadora europeia.

Assim, sabemos que as exigências cognitivas no trabalho vão afetando mais negativamente o trabalhador com a idade, enquanto as exigências de cognição social vão melhorando com a idade. De onde, enquanto os trabalhadores envelhecidos serão mais afetados pelos riscos psicoergonómicos e menos pelos riscos psicossociais (tout court), os trabalhadores jovens serão menos afetados pelos riscos psicoergonómicos e mais (ou de modo igual) pelos riscos psicossociais. Nestes termos, abordar a saúde no trabalho do trabalhador envelhecido versus trabalhador jovem requer ter presente os efeitos que a idade tem sobre a capacidade do trabalhador para o trabalho. Provavelmente, é de prever que um ritmo e pressão de trabalho elevados, a sobrecarga mental de trabalho, ou lidar com as tecnologias modernas de informação e comunicação irá ter um efeito muito mais nocivo sobre o trabalhador envelhecido do que sobre o trabalhador jovem. Ao invés, lidar com pessoas, cada vez mais intensas e complexas, poderá afetar menos o trabalhador envelhecido do que o trabalhador jovem.

Do que poderá inferir-se, por exemplo, que será mais adequado, do ponto de vista da saúde no trabalho, um médico ou enfermeiro jovem (até aos 45 anos) fazer trabalho por turnos, ou trabalho noturno, lidar com tecnologia e programas informáticos, ou trabalhar, por exemplo, num Serviço de Urgência ou numa Unidade de Cuidados Intensivos, enquanto um médico ou enfermeiro envelhecido (45 anos e mais) estará mais adequado a trabalhar em horários fixos, a deixar de fazer trabalho noturno, ou a trabalhar, por exemplo, num serviço de consultas externas ou em outro serviço em que a sua atividade principal seja a de lidar mais com pessoas do que com tecnologia ou com tarefas que requerem maiores exigências cognitivas ou nível de carga mental.

É meu entendimento que a prevenção de riscos “psicossociais” requer uma abordagem diferente daquela que tem sido seguida até agora, sendo necessário desenvolver métodos e técnicas de avaliação e controlo, atualmente praticamente inexistentes ou inadequados, que tenham em atenção a diferenciação entre riscos psicoergonómicos e psicossociais (entendidos, aqui, em sentido estrito), bem como os efeitos que os mesmos têm sobre o trabalhador em função da sua idade, com o objetivo de organizar o trabalho de modo mais seguro e saudável para o trabalhador.

Importa, contudo, ter sempre presente a regra de que a proteção do trabalhador envelhecido jamais deve ser feita à custa do trabalhador jovem. Esta preocupação (postura, comportamento, atitude ou estilo de liderança) não custa dinheiro. Apenas custa o esforço mental de não fazermos (ou deixarmos fazer) aos outros o que não queremos que nos façam a nós. Que é, em suma, o procurarmos ser felizes no trabalho e/ou de procurarmos fazer feliz o trabalho dos outros.

O autor escreve segundo as normas do novo Acordo Ortográfico

 

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