Nogueira Leite sobre CGD: "O Governo dizia-nos 'aguentem o barco'"

Ex-administrador da CGD diz que saiu do banco público porque não podia ter “resultados positivos”.

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Nogueira Leite foi chamado à comissão de inquérito à CGD LUSA/TIAGO PETINGA
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O economista foi administrador da CGD em 2011 e 2012 LUSA/TIAGO PETINGA

António Nogueira Leite, administrador da Caixa Geral de Depósitos em 2011 e 2012, disse esta tarde aos deputados da comissão de inquérito à CGD que o valor do aumento de capital do banco público decidido pelo anterior Governo era baixo e que isso impedia a Caixa de ter “resultados positivos”. Nogueira Leite começou por dizer aos deputados que encontrou uma situação de grande aumento das imparidades e que, quando chegou a necessidade de aumento de capital do banco para fazer frente às dificuldades, considerou esse valor insuficiente. “O aumento de capital impedia qualquer administração presciente de admitir a possibilidade de ter resultados positivos”, disse.

Esta foi, aliás, a questão que o levou a abandonar a administração da CGD, admitiu. “Do ponto de vista profissional, achei que não podia enfrentar sem os instrumentos adequados. Os instrumentos adequados teriam sido mais capital”, disse. Nogueira Leite, que chegou a ser consultor de Passos Coelho antes de este ser primeiro-ministro, explicou que, perante o cenário, sabia que “os anos seguintes iam ser anos muito difíceis”. “Do ponto de vista profissional, não tendo nenhuma ligação a nada, não podia correr o risco de estar a fazer um trabalho difícil e não podia explicar os resultados maus. Por isso dei um salto no escuro”, ou seja, demitiu-se.

O deputado do PSD, Adão Silva, questionou Nogueira Leite sobre qual a estratégia do Governo de então para o banco público e a resposta teve em conta as dificuldades do país na altura. “O que o Governo nos dizia era: 'aguentem o barco e tentem fazer com que a economia não caia. Tentem manter o crédito às empresas e manter algum fluxo de crédito'. Não podíamos dar crédito a empresas que já não mereciam e tornar ainda mais difícil” a situação do banco em termos de imparidades, explicou. “Não havia grande plano estratégico que não fosse manter a economia a funcionar e manter o banco”.

“Houve indicações do accionista” na venda da Cimpor

Na mesma audição, o antigo administrador acabou por esclarecer como era a relação do Governo com a CGD, e sobretudo com o então ministro das Finanças, Vítor Gaspar, que “era muito cioso do seu poder”. Nogueira Leite disse que o ministro informou logo que era ele quem tutelava a Caixa. O que, acrescentou o ex-administrador do banco público, “dava muito jeito”, porque, quando um ministro falava com a CGD, a administração remetia para o Ministério das Finanças.

E dá o exemplo de uma caso em particular. Nogueira Leite diz que “houve indicações do accionista” no caso da venda da empresa de cimentos Cimpor à Camargo Correa, em 2012. Nogueira Leite contou aos deputados que essa indicação do accionista, que “foi o único caso na CGD”, ficou registada em acta.

Em causa está a intervenção de António Borges neste negócios. “Nessa operação tinha a ver com uma alienação financeira, mas não gostámos do processo e não a fizemos nos exactos moldes em que o senhor conselheiro quis”. Na altura, António Borges era conselheiro do Governo para as privatizações.

Nogueira Leite contou que Borges queria que a CGD procedesse a “venda irrevogável” da posição da CGD na cimenteira. “Dissemos que nunca o faríamos e foi uma discussão difícil”, recordou.

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