Artur Barrio visto do Brasil: "Contundência poética e resistência política”

Uma curadora e um crítico de arte explicam o trabalho de Artur Barrio, vencedor do Grande Prémio EDP, a partir do contexto brasileiro. Um contexto sobre o qual o artista mostrou querer actuar mesmo nos anos de chumbo da ditadura militar.

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Livro de Carne (1978-1979) Louis D. Haneuse
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DEFL.....Situação..... +s+....Ruas.......Abril...........1970, da série Deflagramento de Situações sobre Ruas (1970)

“Julgo que é bastante sintomático que um dos primeiros trabalhos de Artur Barrio, no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro em 1970, seja de crítica institucional em plenos anos de chumbo da ditadura militar”, explica ao PÚBLICO Marta Mestre, a curadora portuguesa do Instituto Inhotim, o maior centro de arte contemporânea ao ar livre da América Latina, numa conversa por email a propósito do Grande Prémio EDP de Arte atribuído ao artista luso-brasileiro. 

Logo aqui, na obra Manifesto Contra o Júri, Artur Barrio diz ao que vem: “Quer mostrar-nos – ideia que vem exercitando até hoje – que não existe um campo limitado para a arte. A sua obra é sempre radical, inaugura uma forma distinta de expressão [as Situações], que se intensifica em registos. Algumas das Situações são admiravelmente pulsantes para as artes visuais.”

Artur Barrio recusa as linguagens padronizadas impostas pelo mercado, continua a curadora que também já trabalhou no MAM do Rio de Janeiro, recusa "o didactismo na arte". Quer ser “dinamite”, "uma palava perfeita para Barrio", que Marta Mestre vai buscar à crítica brasileira Lígia Canongia, autora de um livro sobre o artista.

Sobre o que significam as Situações no contexto da arte brasileira da época, o crítico e ensaísta brasileiro Luiz Camillo Osorio explica ao PÚBLICO que elas aparecem num momento muito importante em que a ditadura militar apertava o cerco no Brasil: “O modo como [Artur Barrio] sai da instituição para actuar na rua, nas praças e [nos] jardins públicos, mostra destemor e uma necessidade de comunicação directa com as pessoas, uma vontade de acção directa no mundo.” Elas articulam “contundência poética e resistência política”.

O curador e crítico de arte, que já foi director do MAM, diz que não se pode falar de uma redescoberta de Artur Barrio nos anos 90, porque “a sua obra sempre se manteve actuante no contexto brasileiro". "O que houve a partir desta década", admite, "foi uma maior evidência internacional”. E apesar de o artista ter vivido na Europa em boa parte dos anos 1970, a sua produção ficava à margem do circuito oficial. “Foi com uma maior circulação da arte brasileira – apesar de português, a sua vinculação maior é com a cena brasileira – a partir dos anos 1990 que a sua obra começou a ser mais vista e a ter o reconhecimento merecido. Neste aspecto, a exposição individual em Serralves em 2000 e a Documenta de Kassel em 2002 foram fundamentais na consolidação deste reconhecimento internacional.”

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