Grécia: apesar da polémica, 30 refugiados yazidis registaram-se para vir para Portugal

O Governo de Atenas contesta a disponibilidade do Governo português em acolher refugiados yazidi. Mas não há sinais evidentes, como sugere uma reportagem da AP, de que Atenas irá impedir a vinda de pessoas dessa comunidade para Portugal sob pena de discriminação.

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Membros da comunidade yazidi no Iraque, em 2014, quando fugiam das investidas do Daesh Reuters/STRINGER/IRAQ

O ministro-adjunto Eduardo Cabrita anunciou na terça-feira à tarde no Parlamento que cerca de 30 refugiados yazidis estavam prestes a chegar a Portugal, no âmbito do programa de recolocação da União Europeia (UE). Nesta quarta-feira, uma reportagem da AP lançou a dúvida dizendo que as autoridades gregas criticam qualquer tentativa de privilegiar ou discriminar refugiados, escolhendo-os com base na nacionalidade, etnia ou religião, referindo-se especificamente aos yazidis e à disponibilidade de Portugal em acolhê-los.

No âmbito da recolocação, desde Dezembro de 2015, Portugal já recebeu mais de 900 refugiados da Síria, Iraque e Eritreia, entre outros, confirmou ao PÚBLICO fonte do gabinete de Eduardo Cabrita. Em Outubro passado, e por sugestão da eurodeputada Ana Gomes, o Governo português disponibilizou-se para acolher refugiados da comunidade yazidi, na perspectiva de proteger os mais vulneráveis. Também anunciou estar a reunir condições para acolher crianças e jovens não acompanhados.

Já nessa altura, as autoridades gregas disseram que não era permitido fazer escolhas, numa referência específica aos yazidis. Na reportagem da AP, publicada esta quarta-feira, o ministro das Migrações da Grécia excluiu qualquer hipótese de privilegiar ou discriminar refugiados a acolher em países europeus. E critica quem tenciona fazer isso. Mas não esclarece se a Grécia tenciona impedir a vinda já anunciada destes 30, ou a chegada de outra centena, numa segunda fase, como também anunciou Eduardo Cabrita na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, na Assembleia da República. O primeiro grupo seria acolhido em Guimarães, por iniciativa da câmara municipal, e o segundo seria recebido na região de Lisboa, explicou Eduardo Cabrita.

Sem nunca comentar directamente a reacção grega, Natasha Bertaud, a porta-voz da Comissão Europeia junto do gabinete do presidente Jean-Claude Juncker, sublinhou que o sistema em vigor na União Europeia (UE) não permite a um país seleccionar os refugiados que tenciona acolher. "Um dos princípios fundamentais" do sistema de recolocação "é que nenhum país da União Europeia pode escolher quem recoloca". Ou seja: nenhum Estado "pode dizer se prefere mulheres, cristãos ou muçulmanos", frisou.

Os yazidi são uma comunidade étnico-religiosa que tem sido vítima de perseguições e massacres por parte do Daesh, como parte de uma campanha para retirar do Iraque e da Síria as influências não muçulmanas.

Actualmente, segundo fonte do gabinete do ministro-adjunto Eduardo Cabrita, cerca de 30 yazidis já foram registados na Grécia para virem para Portugal, não existindo qualquer informação de que estas pessoas serão impedidas de vir. "Eles só vêm porque se registaram para vir para Portugal", explica a mesma fonte. "A partir desse momento, as pessoas entram no mecanismo normal de recolocação. O momento da vinda, esse sim, depende das autoridades gregas."

Até ao final da tarde desta quarta-feira não havia informação oficial de que a Grécia iria impedir a vinda do primeiro ou de outros grupos de yazidis.

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, referiu de manhã que de acordo com o embaixador português em Atenas, com quem falou logo pela manhã, não existe "nenhuma informação da parte das autoridades gregas". "Não confirmo que haja qualquer declaração das autoridades gregas no sentido de impedir, de qualquer forma, a vinda de cerca de 38 yazidis de que estamos à espera nos próximos tempos", assegurou o chefe da diplomacia.

Portugal, garantiu Augusto Santos Silva, "acolhe todos os refugiados, independentemente de etnia, de raça, de cor, de qualificação, de género ou de orientação" e já recebeu centenas de refugiados, não praticando nem pedindo para praticar "nenhuma espécie de discriminação, restrição ou diferenciação". As 900 pessoas acolhidas em Portugal nos últimos 14 meses são, em grande maioria, sírios, iraquianos e eritreus.

"Portugal não dirigiu nenhum pedido à Grécia para privilegiar, fosse a que título fosse, um conjunto étnico dentro do contingente de refugiados que Portugal se disponibilizou a acolher", insistiu o ministro Augusto Santos Silva, citado pela Lusa, reiterando a posição de Eduardo Cabrita de que não houve nenhum pedido específico.

Portugal quer também deixar claro que com esta disponibilidade de receber não pretende “passar à frente dos mecanismos” ou das regras do programa da recolocação, diz fonte do gabinete do ministro Edaurdo Cabrita.

A reportagem da AP anunciava que a Grécia não concordava com a iniciativa portuguesa e que Portugal se teria oferecido receber 2500 refugiados desta comunidade. Mas segundo o gabinete de Eduardo Cabrita, esse número (2500) será o número total estimado de yazidis refugiados em campos na Grécia e não os cerca de 400 que Portugal disse ter condições para acolher.

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