Tontos aqueles que cantam Freedom

Fartamo-nos de falar dela, de reclamar nosso direito sobre ela, o bem maior de uma sociedade: a liberdade. De expressão, de pensamento ou opinião, dos sexos e dos géneros entre si, das minorias juntos das maiorias, a liberdade é a nossa bandeira sempre que no ar se sente o peso de opressão

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Algo de curioso aconteceu quando numa das muitas vezes que ouvi a música Freedom, de Pharell Williams, lhe prestei, sem motivo aparente, mais atenção do que antes. Curiosamente, daquela vez não me deixei apenas contagiar pelo ritmo acelerado e enérgico, que nos faz bater o pé ou cantar desalmadamente dentro do carro. Prestei antes atenção à letra! Sim, às palavras e à forma como elas estão conjugadas para criar uma metáfora bem real.

Precisamos de alguém que nos agarre e que não nos deixe cair em ilusões, mas duvidamos de todos e desse mesmo alguém, na mesma proporção em que dependemos do que ele pensa de nós. Contudo, quando confrontados com esta dependência, jamais existe a capacidade de a assumir humildemente. Existe uma súbita tomada de consciência posicional na qual acreditámos tanto quanto ela existe — nada!

Ora pois, isto trata-se de um momento “freedom” – ou melhor “free-dumb” (livre-tonto). É como nos deparamos todos em alguns momentos, com a vontade querer ser livre sem admitir antes o quão dependentes somos da imagem que fazem de nós.

Retiremo-nos de nós por um ínfimo minuto, vamos realmente usar o verdadeiro poder e deixar que a vontade nos guie através da capacidade com a qual fomos dotados pela natureza: pensar.

E neste exercício reparamos que somos como umas belas gazelas que, quando menos esperamos, estamos a correr à frente de um animal feroz que quer a todo o custo fazer-nos curvar. Talvez a gazela também tenha sido enganada pela tal valiosa “oportunidade”, que já conta com pelo menos umas cinco antecessoras, todas elas com garantias de abertura de grandes portas.

Caímos, portanto, mais uma vez, na ingenuidade que não queremos admitir. Ora note-se: somos inteligentes e formados, com capacidades técnicas e criativas fora de série, somos os reis de uma nova geração. E vi mais um trocadilho: este “king” que não consegue ver que é “dumb” quando se deixa enredar por outros “dumbs” que criam “kingdoms” às custas de dissimuladas acções de exploração a homens igual a eles.

No fundo, andamos todos à procura de algo real uns nos outros, algo tão natural como respirar, ver o sol nascer pela madrugada dentro, sentir a água gelada, ver à nossa frente um homem no qual reconhecemos esta mesma procura.

No fundo, vivemos todos amedrontados de pegar realmente na liberdade e assumir a responsabilidade que ela representa. No fundo, temos medo de admitir que só queremos viver com tudo o que existe à nossa volta, seja a correr como cavalos velozes ou a voar como andorinhas em busca do sol. No fundo, precisamos de nos tocar, sentir choques eléctricos entre humanos, nem que seja para perceber que a humanidade ainda existe em cada um de nós.

No fundo, só precisamos de respirar fundo, ouvir novamente esta música e dar liberdade pelo menos ao espírito para gritar mais alto.

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