Um ano depois da mudança, vendedores da Vandoma dizem que se perdeu a genuinidade

Vendedores e clientes dizem ter-se perdido o carisma da feira. Moradores e comerciantes ainda acreditam que a feira pode voltar às Fontaínhas. CMP garante que feira não sai de Campanhã.

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Fernando Veludo/nfactos
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Faz um ano, em Janeiro, que a Feira da Vandoma se mudou do Passeio das Fontainhas para a Avenida 25 de Abril, em Campanhã. Na altura da mudança muitos foram os vendedores que contestaram a decisão da Câmara Municipal do Porto (CMP). Quase um ano depois ainda há quem não esteja satisfeito e se queixe da falta de condições do novo espaço. Apesar de muitos terem a esperança de voltarem às Fontaínhas, a autarquia garante que a feira fica em Campanhã.

São quase 11h00 de sábado. O pico de visitantes de uma das feiras mais carismáticas da cidade. Já a paisagem e a área envolvente são menos carismáticas do que a localização anterior. O dia está frio, mas está sol. Uma das vias em alcatrão, cortada ao trânsito, da Avenida 25 de Abril está ocupada pelas bancas dos vendedores, que não se podem queixar da falta de gente. A feira está cheia, mas nem todos estão satisfeitos. 

Amélia Machado vende há mais de 30 anos nesta feira. Começou nas Fontaínhas, na “verdadeira Vandoma” porque esta considera uma parente pobre “da outra”. “Aqui não há vida. Perdeu-se o lado típico da feira”, diz. “Fomos empurrados para longe, para um pedaço de alcatrão. Aqui nem um turista passa”, continua.

Já Luísa Rebelo, que começou a vender na feira aos 16 anos, já lá vão mais de 20, queixa-se da falta de condições. “Temos apenas quatro casas de banho para esta gente toda, que são contentores e não são limpos até ao final da feira”, diz. A antiga localização não teria muito mais do que isso, contudo, diz, que as casas de banho, que ficavam por baixo da ponte do Infante, eram de loiça e existiam ainda as dos cafés das imediações. “Aqui não há nada. Nem cafés há por perto”, afirma.

De uma forma geral, da cerca de uma dezena de vendedores com quem o PÚBLICO falou pouco muda relativamente às queixas apresentadas. Na sua maioria prendem-se com as alegadas faltas de condições e a questões que se prendem com as condições atmosféricas.

“Quando chove não há para onde fugir”, diz Maria Melo que visita a Vandoma há mais de uma década e agora diz ter-se perdido a “genuinidade da localização anterior”. “Nas Fontaínhas quando chovia sempre dava para abrigar num café”, conclui. 

Mais difícil de encontrar, há também quem não concorde com as queixas apresentadas. “Sei que há muitas queixas, mas para mim aqui a feira é mais organizada”, diz Amélia Santos, que há mais de duas décadas vende na Vandoma. A feirante acredita que é tudo uma questão de hábito. “Claro que a outra feira estava num sítio mais bonito e mais típico, mas este é um espaço mais aberto e com mais condições”, afirma.

No que toca às vendas os vendedores dizem, na maioria dos casos, não terem alterado. Apesar de muito raramente se avistar um turista a feira continua a ter gente. Há quem defenda que apesar do “colorido” trazido pelos turistas à feira, por norma é um público que está mais para ver do que para comprar, tendo em conta que há sempre limitações de bagagem, no regresso a casa.

Nas Fontaínhas há moradores que dizem que a feira faz muita falta ao bairro. António Soares, que nasceu nas Fontaínhas, ainda não foi ao novo local. Também vendia na feira há cerca de 30 anos e paga dois lugares na Avenida 25 de Abril. Contudo ainda não montou banca uma única vez. “A câmara disse que lá ia ter mais fiscalização”, diz António que acha que se “trouxessem o número de fiscais que lá existem para as Fontaínhas, também se resolviam os problemas com os vendedores ilegais aqui”, refere.

Quem também se queixa da saída da feira para Campanhã são os comerciantes locais. Fernando Pinto, que tem um café junto ao local onde se montava a feira, diz ter perdido muito do negócio que fazia aos sábados desde que a Vandoma mudou de local. “Não se percebe porque é que tiraram daqui a feira da Vandoma por acharem que incomodava os moradores, mas ao domingo fazem agora a Feira dos Pássaros”, afirma Fernando, que acrescenta que os clientes de domingo não são iguais aos de sábado e que por isso não ficou a ganhar em nada com a nova feira.

Bruno Silva que também tem um café na mesma zona diz que aos sábados de manhã chegava a vender 200 bolos. “Agora vendo 15. Panados vendia 6 quilos, hoje vendo meia-dúzia”, diz. Bruno diz que a Feira da Vandoma só faz sentido na ou perto da freguesia da Sé, onde começou. Também já morou nas Fontaínhas e diz que não se justifica dizer que a feira saiu de lá porque os moradores se queixavam porque não corresponde à realidade.

Contudo há quem discorde. Um morador das Fontaínhas que não se quis identificar disse ao PÚBLICO que a feira causava alguns transtornos a muitos moradores. Apesar da feira começar ao sábado de manhã, a partir de sexta-feira à noite diz já haver quem marcasse lugar. A partir dessa altura tornava-se “impossível” passar com o carro se quisesse sair de casa. Mais do que uma vez diz ter sido insultado por chamar à atenção e diz mesmo que lhe chegaram a amassar o carro.    

 A CMP diz estar atenta às queixas dos vendedores do novo local e diz ter vindo a melhorar as condições de instalação e funcionamento da feira, que diz encontrar-se a funcionar “bastante bem”. Relativamente aos problemas que possam existir em dias de chuva, afirma responde que nas Fontainhas a feira também funcionava ao ar livre. Na localização actual diz existir a vantagem de caber toda a gente e ainda existir a possibilidade de a  feira poder expandir. No que toca aos moradores das Fontaínhas diz ter deixado de receber “as insistentes e justificadas queixas dos moradores que se sentiam sitiados pela feira e que tinham barulho desde as 5 da manhã, devido à montagem”. 

Vinil, ferramentas, autorrádios e Almada Negreiros a 10 euros

Na Vandoma há de tudo. Ferramentas, música em vinil, jogos de tabuleiro antigos, rendas, autorrádios, roupa e até arte. Nada tem preço fixo e tudo se negoceia.

Numa das bancas há um senhor que vende um quadro assinado por Almada Negreiros. “Quanto custa?”, ouve-se. “15 euros”, responde o vendedor. “Se é caro baixo para 5”, continua. “É original?”, ouve-se do outro lado. “É de quem o pintou”, responde a rir-se. Barato, tendo em conta que no último Leilão presencial do ano do Palácio do Correio Velho, em Lisboa, a base de licitação de um guache de Almada Negreiros de 1931 era de 30.000 euros. 

Mais à frente há uns esboços pousados no chão de uma banca de venda. Também têm assinatura de Almada Negreiros. Mas estes têm também lacre, selo branco e carimbo da Direcção Provincial das Alfândegas. À partida, não fosse o bom estado de conservação, tendo em conta todo o aparato institucional, parecia que o dia estava ganho. Encontrou-se uma relíquia e barata. “São 10 euros”, diz o vendedor. “Isto tem carimbos, lacre, é original?”. Não se percebe muito bem a resposta. Insiste-se na pergunta. Ouve-se um não: “Acha que se fosse original estaria a vender a este preço?”.

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