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O Presidente repetiu o apelo a acordos de regime e eu não podia estar mais de acordo.
Cumprindo exemplarmente o seu papel, o Presidente da República focou o seu balanço de um ano de Governo no ponto positivo que pode ser enaltecido.
Não nos iludamos, a geringonça representa uma solução governativa que trouxe uma inesperada estabilidade e uma inédita paz social. Este Governo capturou os sectores mais radicais da sociedade portuguesa, hipnotizando os partidos esquerdistas e os seus satélites sindicais. O que de resto incorpora uma vantagem adicional: acabou o mito da “coerência ideológica” e da “fidelidade às convicções” que tantas vezes eram associadas à extrema-esquerda. Da primeira vez que estes partidos foram testados no poder, mandaram “às urtigas” tudo o que defendiam descabeladamente até há um ano atrás, transmutando-se em pilares “de estabilidade” de um Governo que ordeira e orgulhosamente cumpre as regras de Bruxelas, mata o investimento público, corta cegamente nos serviços públicos e elege o combate ao défice como sua bandeira. Clarificador, como diria o Presidente…
Mas só faz sentido perdermos tempo com o passado se tal nos ajudar a perspectivar o futuro. É aí que nos devemos concentrar. Até porque o país está hoje num impasse, num beco sem aparente saída. Este Governo garante estabilidade, mas ignora qualquer ideia de futuro, qualquer visão estratégica, qualquer caminho de afirmação nacional. Gere a espuma dos dias com habilidade, mas empurra os problemas para debaixo do tapete.
As letras mais carregadas nas palavras do Presidente estão precisamente neste ponto. Em coerência com o que incansavelmente tem afirmado, ressurge o apelo a acordos de médio prazo em áreas estruturantes, que assegurem previsibilidade e eficácia às reformas e políticas imprescindíveis para as próximas gerações. Não falo de “arranjos” conjunturais e quiçá artificiais. Falo de compromissos em áreas como a reforma do ensino, a atracção de investimento (principalmente, de base tecnológica), a governação económica europeia, um modelo de descentralização ou a questão demográfica e sustentabilidade das pensões.
O Presidente repetiu ontem este apelo a acordos de regime e eu não podia estar mais de acordo!