A Norberto o que é de Norberto

O coração é o mesmo, imenso, mas Muxama aprofunda novos caminhos. O sexto álbum de Norberto Lobo é apresentado esta quarta-feira no Teatro Maria Matos, em Lisboa, primeira data de uma digressão nacional

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Norberto segue em frente e descobre mais, descobre melhor

A natureza da música não mudou. A liberdade na forma como entende e encara a música, o prazer pela descoberta, o gosto pelo belo que nos conquista e pelo mistério que nos atrai, está aqui como já estava, há nove anos, em Mudar de Bina, o álbum de estreia de Norberto Lobo. Mas Norberto Lobo, guitarrista de excepção, como sabemos, músico que faz da sua música reflexo da vida e do lugar em que esta o encontra quando a música é registada, nunca poderia ser criador imutável. Comprova-o a sua discografia, tanto no trabalho assinado a solo, como no que foi registado, por exemplo, nos Norman ou com João Lobo. Muxama, o seu novo álbum, o sexto em nome próprio, prossegue essa caminhada, num momento em que possíveis referências que lhe apontávamos a início, de John Fahey a Carlos Paredes, para referir os mais citados, há muito deram lugar a música que ocupa um lugar único — a Norberto o que é de Norberto.

Muxama prossegue na rota de Fornalha, álbum de 2014 em que se tornou claro aquilo que nos ia dizendo em entrevistas e que testemunhávamos nos concertos: que a guitarra, o seu instrumento, era veículo criativo primordial, mas nunca fonte única da sua música. Muxama tem-na no centro, mas é aquilo que vemos desenvolver-se através dela e à sua volta que faz, hoje, a música de Norberto Lobo. O álbum é apresentado esta noite no Teatro Maria Matos, em Lisboa (22h). Dia 25, o guitarrista estará no gnration, em Braga. Seguir-se-ão o Teatro da Vista Alegre, em Ílhavo (dia 27), o Hostel 1878, em Faro (2 de Dezembro), o Teatro de Vila Real (7 de Dezembro), o Auditório do Conservatório de Música de Bragança (8 de Dezembro), o Auditório da Biblioteca Municipal Almeida Garrett, no Porto (9 de Dezembro), e o Salão Brazil, em Coimbra (10 de Dezembro).

Os dedos dedilham e arrastam-se sobre as cordas, os pés trabalham sobre os pedais que lhes moldam o som. No final de Oma, o sétimo dos nove temas, a música silencia-se e surge no seu lugar o ruído nocturno reconfortante, éden de mamíferos, insectos e batráquios. Nesse momento, é como se concretizasse em paisagem concreta aquilo que a música vai sugerindo. Tema a tema, atravessa a música um bordão que cria chão e cenário. Sobre ele, a guitarra é fogacho sonoro que surge, inesperado e questionador, para logo desaparecer (Slowz, por exemplo). Aqui, partimos daquele dedilhado que carrega em si a sabedoria e gentileza da folk antes de, sugerido o calor tremeluzente do wah-wah, aterrarmos numa divagação cósmica que o Kevin Ayers dos Soft Machine e Jim O’Rourke observariam com olhar tão intrigado quanto fascinado (Charada é o título e assenta-lhe bem). Ali, em Anona, o bordão novamente, capturando-nos mais e mais para o âmago desta música, enquanto o som se torna metamorfose acontecendo perante nós e que, intuímos, surpreende-nos a nós como surpreende o seu criador. A grande diferença, claro está, é que Norberto aproveita a surpresa a que se conduz para seguir em frente e descobrir mais, descobrir melhor.

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