A nostalgia do dia da despedida

O Vodafone Paredes de Coura confirmou os óptimos Capitão Fausto como fenómeno, num dia tépido em que saltámos de palco em palco recordando a boa agitação das noites anteriores. O festival regressa em 2017 para festejar os seus 25 anos, entre 16 e 19 de Agosto.

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Percebe-se que está a mesmo a chegar ao fim quando, quase no final de um concerto de synth-pop oh tão 80s guiado pela voz de ninfeta de Lauren Mayberry, os CHVRCHES mostram alguma preocupação com o público que sofre nas primeiras filas a enxurrada de corpos do sempre tão efusivo e incansável pessoal que, desde a primeira hora do primeiro dia deste Vodafone Paredes de Coura, abriu uma roda de mosh e crowdsurf e cá vai disto: pó no ar e gente em rebuliço.

Lauren Mayberry, que já andara a passear com a bandeira de Portugal em palco, que já dera os parabéns pela vitória no Europeu de futebol, pediu alguma contenção e um outro tipo de manifestação de felicidade com a música; o púbico mosheiro, porventura cansado como todos no recinto ao quarto dia de festividades (uma semana inteira no caso de quem chegou a Coura mais cedo, aproveitando os concertos pré-festival na vila), acedeu ao pedido. Mas o caos do mosh não deu lugar a pista de dança gigantesca.

Por essa altura aproximávamo-nos das duas da manhã e as clareiras entretanto abertas no anfiteatro natural que serve o palco principal denunciavam que o povo estava cansado e começava a pensar na viagem de regresso a casa, e que o concerto da banda de Every Open Eye foi o culminar do antíclimax sentido depois das noites em que ditou lei a agitação rock’n’roll de Thee Oh Sees, King Gizzard And The Lizard Wizard e Cage The Elephant, a par, inevitavelmente, da ressurreição dos LCD Soundsystem.

Ao longo dos quatro dias oficiais do Vodafone Paredes de Coura, o festival acolheu cerca de 100 mil pessoas, segundo dados da organização (sem surpresas, a quinta-feira da imbatível sequência Sleaford Mods, Thee Oh Sees e LCD Soundsystem, foi o dia mais concorrido, com 24 mil espectadores). A zona de campismo transformou-se numa vila de 15 mil habitantes, entre os quais a centena e meia que, na noite e na madrugada de sexta-feira, sofreu de uma gastroenterite provocada por causas ainda indeterminadas que, no último dia de festival, ganhou o mesmo protagonismo mediático que a música. Quanto a esta, a despedida foi vivida em modo nostálgico. A despedida aproximava-se e o que ficara para trás deixava saudades.  

Ao início da noite, The Tallest Man On Earth, o sueco de um metro e 70 Kristian Matsson (ah, a ironia), embalou o palco principal com as suas canções para descontraçcão em roda de praia, ora a solo, ora acompanhado com banda competente no acento rock da folk. No palco Vodafone FM, Filho da Mãe & Ricardo Martins uniram guitarra e bateria em diálogo intenso, ou não se chamasse Tormenta o álbum que os juntou, os russos Motorama convocaram o fantasma dos Joy Division e os Cigarretes After Sex cantaram I’m a firefighter num tom de vigília que pedia plateia sentada em lugar da azáfama de festival de Verão.

No outro lado do recinto, os Portugal. The Man ganharam o prémio de banda causadora de maior perplexidade. Em 2009, quando se estrearam em Paredes de Coura, eram grupo (demasiado) devoto do rock americano da década de 1970. Sete anos depois, são um híbrido inclassificável em que as grandes narrativas roqueiras americanas – de Springsteen a Titus Andronicus – se cruzam com ambições prog, sugestões R&B ou hard-rock com longos solos a condizer. Uma maradice, para utilizar terminologia técnica, que nos leva a coçar a cabeça com ar intrigado quando se ouve ali pelo meio um excerto de Gimme shelter, uma citação do final de I want you (she’s so heavy), dos Beatles, mais lá à frente, e, entre uma e outra, uma aparição de todo inesperada do clássico dos Oasis Don’t look back in anger – e venham mais mosh e cantoria comunal que esta toda a gente conhece.

O último dia do Vodafone Paredes de Coura ficou marcado, principalmente, pela confirmação dos Capitão Fausto enquanto (justo) fenómeno. Subiram a palco às 19h40, quando habitualmente a maioria do público ainda vagueia por outras paragens, e tiveram perante si um mar de público que lhes conhecia as canções na ponta da língua. Mostraram-se, como sempre, músicos habilíssimos, capazes de compactar em medley sem falhas visitas a diversos momentos da discografia, e donos de uma capacidade de síntese em que se conjugam os arranjos abençoados de Brian Wilson ou dos Zombies, os ritmos da new-wave em espírito de arraial, o psicadelismo rock feito gentileza pop – e letras, principalmente as do último Têm os Dias Contados, em que toda uma geração se parece sentir representada.

Os Capitão Fausto saltaram directamente do campismo para o palco (não é certo que assim tenha sido este ano, mas nos anteriores foram campistas e público atento aos concertos) e, com Maneiras más (de Pesar o Sol, o segundo álbum), a memória dos primeiros passos em Santa Ana (do disco de estreia, Gazela) ou Morro na praia (de Têm os dias contados), foram as verdadeiras estrelas do globalmente tépido dia de despedida do Vodafone Paredes de Coura.

2017, data redonda

João Carvalho, director da Ritmos, a produtora do festival, classificou ao PÚBLICO esta edição como uma das melhores do festival – “logo atrás da anterior”, acrescentou, em referência à edição em que, pela primeira vez, o Vodafone Paredes de Coura registou lotação esgotada. A melhoria da logística na zona de campismo, reflectida na satisfação demonstrada pelos frequentadores do festival nos estudos de opinião elaborados pela produtora, provou-se, diz, uma mais-valia. João Carvalho falava com o PÚBLICO depois da conferência de imprensa em que foram anunciadas as datas para a edição de 2017, a cumprir entre 16 e 19 de Agosto. Data redonda: será a da comemoração dos 25 anos do festival.

Estávamos no Santuário da Senhora da Pena, nos arredores da vila, espaço magnífico em que o olhar se delicia com a paisagem a perder de vista sobre os mil verdes do Minho. Ali actuaram os Motorama em mais um concerto das Vodafone Music Sessions que levam o público a conhecer mais da riqueza do concelho que acolhe o festival.

Sabemos que um festival não é apenas a música que nele ouvimos. É, também, a forma como se insere e convive com todo o espaço que o acolhe. Nesse sentido, Paredes de Coura, o do regresso dos LCD Soundsystem, o da explosão rock’n’roll com os Thee Oh Sees, o da confirmação dos Capitão Fausto, mas também o do rio Coura e suas margens, o da vila acolhedora e das paisagens deslumbrantes que a envolvem é verdadeiramente afortunado. Também aí reside parte considerável do seu sucesso.

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