Desafiar e arriscar: está aí o Jazz em Agosto

Os The Young Philadelphians de Marc Ribot dão arranque esta noite à 33.ª edição do festival. Pela Gulbenkian passarão até dia 14 Paal Nilssen-Love, Tim Berne, Eve Risser ou Evan Parker.

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Marc Ribot abre o festival na companhia dos seus Young Philadelphians e actua um dia depois a solo BARBARA RIGON
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Os Snakeoil do saxofonista Tim Berne WES ORSHOSKI/ECM RECORDS
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Os Petite Moutarde actuarão sobre excertos de filmes de Man Ray, René Clair e Marcel Duchamp CHRISTIAN TAILLEMITE
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O francês Thomas de Pourquery homenageará o legado do inigualável Sun Ra FLAVIEN PRIOREAU
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Sérgio Carolino é um dos membros do Tuba and Drums Double Duo EGÍDIO

A 33.ª edição começa esta noite. Mais um Jazz em Agosto na Gulbenkian, em Lisboa, com os concertos no magnífico cenário do anfiteatro ao ar livre e na sala polivalente. Duas semanas de música que se pretende iluminadora e exigente. Veremos nomes que regressam, como Marc Ribot, que inaugurará o festival às 21h30 com os seus Young Philadelphians, e projectos que se estreiam neste cenário, como a White Desert Orchestra da pianista francesa Eve Risser.

O equilíbrio e o diálogo entre os dois lados do Atlântico, entre o jazz que fervilha na América do Norte e o que frutifica em território europeu. Isto é o Jazz em Agosto e é assim há muito. Já o conhecemos. Mas não nos deixemos enganar. Esta familiaridade nasce de uma característica essencial: conhecendo o Jazz em Agosto, sabemos que seremos surpreendidos, desafiados.

Assim será, perspectiva-se, na edição que coincide com os 60 anos da Fundação Calouste Gulbenkian. Até 14 de Agosto, assistiremos a 14 concertos. Teremos cinema na Sala Polivalente: serão exibidos Off the Road e Chicago Improvisations, de Laurence Petit-Jouvet, ambos dedicados ao contrabaixista alemão Peter Kowald, falecido em 2002, e Electric Ascension Live at Guelph Jazz Festival 2012, de John Rogers, registo de um concerto em que o Rova Saxophone Quartet recria Ascension, o histórico álbum de 1966 de John Coltrane (entrada gratuita). Teremos igualmente debate e reflexão, com o saxofonista Evan Parker e o escritor e músico David Toop em conversa na Sala Polivalente sobre as músicas tradicionais que se vão apagando do planeta e sobre a música improvisada nascida na década de 1960 (também com entrada livre).

Teremos ainda obra escrita, com a apresentação de The Sound Of North – Norway And The European Jazz Scene, do italiano Luca Vitali, primeiro livro dedicado a contar de forma exaustiva a história do jazz escandinavo. A apresentação acontece dia 13, sábado, e antecede o concerto a solo de um dos músicos, Paal Nilssen-Love, que faz o presente da história que o livro evoca. O baterista, um dos mais activos e virtuosos no panorama actual é, de resto, um dos destaques do festival. Para além da referida actuação a solo, terá honras de encerramento do Jazz em Agosto, domingo, dia 14, com um concerto dos seus Large Unit. Formados em 2013, reúnem à volta do baterista ligado a Peter Brötzmann ou Ken Vandermark 13 músicos que, como referiu na apresentação do festival o seu director artístico, Rui Neves, representam “alguns dos mais promissores talentos do jazz escandinavo”. Com eles se fará a despedida do Jazz em Agosto. Mas voltemos ao início.

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Paal Nilssen-Love é um dos mais virtuosos bateristas do panorama jazz actual JOAQUIM MENDES

Marc Ribot dispensa apresentações. O guitarrista que regressa ao festival depois da celebrada passagem em 2014, o músico que ao longo dos anos nos habituámos a ver ao lado de aventureiros como John Zorn ou Tom Waits, mas de quem há muito seguimos o caminho trilhado de forma independente, protagonizará dois concertos. No primeiro, o da abertura do Jazz em Agosto, apresentar-se-á com os Young Philadelphians, quarteto que se dedica a cruzar o caminho entre a vertigem eléctrica de Ornette Coleman nos seus Prime Time e o groove e a opulência orquestral da Philly Soul da década de 1970 – não por acaso, o grupo será acompanhado pelo Lisbon String Trio reunido para a ocasião. Sexta-feira, será também Ribot o primeiro a subir a palco, desta vez a solo e na Sala Polivalente – ou quase: o solo que protagonizará acompanha as imagens de Shadows Choose Their Horrors, de Jennifer Reeves, filme trabalhado a partir das memórias do cinema de terror do início do século XX.

A ligação estreita entre música e cinema surgirá também através dos Petite Moutarde. O grupo liderado pelo violinista e violista Théo Ceccaldi (eleito músico revelação francês pela Jazz Magazine, em 2014) eliminará distâncias temporais terça-feira, dia 9, às 21h30, quando se fizer ouvir no Anfiteatro sobre excertos de filmes de Man Ray, René Clair e Marcel Duchamp.

Ao longo dos 11 dias de festival, teremos oportunidade de tomar o pulso à vitalidade e diversidade do jazz actual. Como é hábito, as propostas fazem-se de uma salutar diversidade. Quanto à presença portuguesa em cartaz, destaque, dia 10, às 21h30, para a estreia do Tuba And Drums Double Duo – Sérgio Carolino e Oren Marshall na tuba, Alexandre Frazão e Mário Costa na bateria –, e atenção, dia 8, à mesma hora, para o encontro luso-italiano, firmado em Haia, protagonizado pelos Tetterapadequ, quarteto formado pelo baterista João Lobo, o contrabaixista Gonçalo Almeida, o pianista Giovanni di Domenico e o saxofonista Daniele Martini.

Na véspera do fim do Jazz em Agosto, dia 13, o saxofonista francês Thomas de Pourquery lidera os Supersonic numa homenagem idiossincrática ao legado do inigualável Sun Ra. Este domingo, dia 7, às 21h30, descobriremos no Anfiteatro a White Desert Orchestra, veículo para os talentos enquanto compositora da líder Eve Risser. Um dia antes, à mesma hora, no mesmo local, Peter Evans, Tim Dahl e Mike Pride, os Pulverize The Sound, mostram a música sem rédeas que desde 2010 vêm criando de madrugada num estúdio de Brooklyn. Reencontraremos Tim Dahl dia 11, integrado no trio liderado por Ava Mendoza, guitarrista cujo jazz contaminado pelo fundador blues e pela crueza do punk chamou a atenção de John Zorn, que a incluiu no catálogo da sua Tzadik.

Outro tipo de cruzamento propõem os Z-Country Paradise do alemão Frank Gratkowski. Na New York City Jazz Record, classificaram o novo projecto do saxofonista nascido em Hamburgo como “cabaré punk”. Certo é haver neles uma energia desabrida motivada pela poesia de Rimbaud, entre outros, cantada pelo cantora e actriz sérvia Jelena Kuljic. Os Z-Country Paradise actuam dia 12, às 21h30, e Gratowski apresenta-se novamente no Jazz em Agosto, a solo, no dia de encerramento do festival, às 18h30.

Antes disso, já amanhã, sexta-feira, chegam os Snakeoil do saxofonista Tim Berne, líder de um quinteto formado em 2011 para explorar aquilo que nasce quando se escolhe ignorar que existem regras a ser cumpridas. O Jazz em Agosto tem regras, mas é animado por um espírito semelhante: defender o risco e o desafio, revelar a história que se renova no presente.

Os bilhetes para os concertos variam entre os 7,5 e os 20 euros. O passe geral custa 110 euros e as actuações a solo de Paal Nilssen-Love e de Frank Gratkowski, bem como as conversas entre Evan Parker e David Toop e todos os filmes exibidos, têm entrada gratuita.

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