Vodafone Paredes de Coura: tudo começou com “uma brincadeira de rapazes”

Há 30 anos nasceu, na praia fluvial do Taboão, um festival que hoje vale seis milhões de euros. E tudo surgiu de "uma brincadeira de rapazes". "Criámos um monstro querido que queremos continuar a alimentar", diz o director João Carvalho

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Paulo Pimenta

As margens da praia fluvial do Taboão, Paredes de Coura, há 30 anos tomadas pelo mato fruto do abandono agrícola, viram nascer, de uma brincadeira de rapazes, um festival que virou marca e vale seis milhões de euros.

A primeira edição do festival de música, em 1993, levou nove dias a organizar e surgiu de "uma brincadeira de rapazes" depois de uma noite de fados de Coimbra que a câmara de então promoveu para inaugurar a requalificação das margens da praia fluvial. "Éramos adolescentes e queríamos divertir-nos. Não fazíamos ideia do que iria acontecer", diz à Lusa um dos jovens do grupo da terra, e actual director do Vodafone Paredes de Coura, João Carvalho.

O amadorismo deu lugar ao profissionalismo e mudou o concelho do interior do Alto Minho que lhe serve de palco e a vida dos jovens amigos que, em 1993, conseguiram convencer a autarquia a apoiar com 160 contos (cerca de 800 euros) o primeiro festival. Primeiro formaram uma associação e mais tarde constituíram uma empresa, a Ritmos, que ainda hoje se mantém com os mesmos sócios. O cenário "idílico", junto às margens do rio Coura, também não mudou, mas 23 anos depois "a brincadeira transformou-se numa coisa séria", sendo considerada um dos melhores festivais de verão da Europa e o melhor festival não urbano de Portugal.

"Criámos um monstro querido que queremos continuar a alimentar", afirma, lembrando que nem sempre foi fácil: "Penámos durante vários anos, em que chegámos a pôr tudo em causa". Na última edição, em 2015, o festival fez história ao esgotar com vários dias de antecedência. Durante os quatro dias do festival contaram-se 115 mil espectadores, cerca de 22 mil por dia.

"A marca festival de música de Paredes de Coura vale actualmente, em média, entre cinco a seis milhões [de euros]", calcula João Carvalho. O impacto financeiro não foi ainda medido com rigor, mas dados fornecidos pelas entidades bancárias instaladas no concelho indicam que durante os dias do festival os levantamentos nas caixas multibanco ultrapassam os três milhões de euros. O comércio local ganha para o ano inteiro e o fenómeno do arrendamento de casas está a emergir.

"São as pessoas que tornam os territórios competitivos"

Atento ao fenómeno, o presidente da Câmara Municipal, Vítor Paulo Pereira, não esquece o passado de sócio fundador da Ritmos e, antes, a sua participação nas primeiras três edições do festival com a sua banda Boucabaca, onde tocava viola-baixo. Deixou a sociedade em 2009 para assumir as funções de chefe de gabinete do ex-presidente de Câmara Pereira Júnior — que se deixou convencer, em 1993, enquanto vereador da Cultura, com o entusiasmo dos adolescentes que queriam fazer um festival —, a quem sucedeu em 2013 na liderança do executivo. O festival “foi uma grande universidade para todos nós. Conseguimos contrariar a ideia de resignação. As grandes coisas também podem acontecer nos territórios mais inesperados. São as pessoas que tornam os territórios competitivos", afirma Vítor Paulo Pereira.

"Não nos podemos refugiar na melancolia da geografia para justificar a incapacidade", sublinha, adiantando que a mesma filosofia serve para combater o recuo demográfico que o concelho começou a viver na década de 50 do século passado, quando tinha 16.062 habitantes. Nos anos 80, e segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, o número de habitantes caiu para 11.311 e, em 2011, para os 9.198. "A queda demográfica combate-se com fábricas e emprego e não com incentivos à natalidade", defende, afirmando que desde que tomou posse, em 2013, o município já investiu mais de 20 milhões de euros para "criar condições que atraiam investimento". "Tudo depende da velocidade institucional e de compreender o tempo dos empresários", sublinha.

Actualmente, nas zonas industriais do concelho estão instaladas oito empresas de grande dimensão que empregam mais de 2.000 pessoas e exportam entre 70 a 100% da produção. O grupo Kyaia, fabricante da marca de calçado Fly London, a Doureca e a ValverIbérica são alguns dos exemplos que aponta, sem esquecer os novos projectos que estão na calha: mais duas novas empresas, num investimento estimado em nove milhões de euros e numa ampliação que deverá criar mais 300 novos postos de trabalho.

"Em contexto de crise assistimos ao rejuvenescimento industrial de Paredes de Coura. É por aí que contrariamos a recessão demográfica", sustenta, lembrando que esse foi o caminho trilhado pelo seu antecessor. Pereira Júnior esteve 28 anos na autarquia, oito como vereador da Cultura e os restantes 20 como presidente. Lutou pela melhoria dos acessos rodoviários ao concelho, mas saiu sem ver alteradas as estradas desenhadas para uma realidade com mais de 60 anos. O testemunho passou-o a Vítor Paulo Pereira que, fruto dos contactos que tem desenvolvido com a administração central, está confiante numa solução equilibrada e ajustada à situação financeira do país: um acesso rodoviário, com cerca de cinco quilómetros de extensão, para ligar o parque empresarial de Formariz à A3 (nó de Sapardos - Vila Nova de Cerveira).

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