Nova terapêutica da hepatite C curou 2050 doentes

Mais de 9000 pessoas estão actualmente em tratamento em Portugal.

Foto
Há um ano, José Carlos Saldanha pediu ao então ministro da Saúde que não o deixasse morrer Daniel Rocha (arquivo)

A presidente da Associação SOS Hepatites, Emília Rodrigues, disse nesta quarta-feira à agência Lusa que no espaço de um ano foram evitadas "cerca de 2050 mortes" prematuras de doentes com hepatite C, graças às novas terapêuticas disponibilizadas em Portugal.

"Até este mês de Abril, temos cerca de 9100 doentes em tratamento e temos cerca de 2050 curados", afirmou Emília Rodrigues.

Segundo explicou à Lusa, há doentes que estão a iniciar o tratamento e outros que eventualmente estão curados, mas "só seis meses após a conclusão do tratamento é que se pode ter essa certeza". Em relação aos 2050, já passaram os seis meses, pelo que se consideram curados.

O acordo entre o Estado e o laboratório que fornece os medicamentos inovadores para a hepatite C foi formalizado há um ano, tendo sido apresentado pelo então ministro da Saúde, Paulo Macedo, no dia 6 de Fevereiro de 2015.

Este acordo foi alcançado depois de meses de luta dos doentes para conseguirem obter o tratamento, processo que ficou marcado pela intervenção, na Assembleia da República, de um portador de hepatite C, José Carlos Saldanha, que interrompeu a audição do então ministro da Saúde pedindo-lhe que não o deixasse morrer.

"Termos estes doentes em tratamento e estes doentes curados para nós é uma vitória porque são pessoas que não vão morrer precocemente, é também uma vitória porque deixou de ser a 'doença dos divórcios' para passar a ser a doença da alegria. Com 97% de cura, é uma alegria", sublinhou.

Segundo a responsável, há um ano existiam 13 mil doentes com hepatite C nas consultas do Serviço Nacional de Saúde, mas "o número de infectados não diagnosticados deverá ser muito superior".

Investir no diagnóstico

A experiência nacional da terapêutica da hepatite C e as complicações da doença hepática crónica vão estar em análise no Congresso Português de Hepatologia 2016, que começa na quinta-feira, no Porto, organizado pela Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado (APEF).

Em declarações à Lusa, a presidente da APEF, Isabel Pedroto, referiu que "a terapêutica na hepatite C tem evoluído muito, têm sido tratados milhares de pessoas, mas há um grupo de doentes para os quais urgem novas terapêuticas e com melhor resposta, nomeadamente os doentes com doença muito avançada do fígado e os doentes com um subtipo muito específico, que é o tipo 3 do vírus da hepatite C".

"Estes doentes ainda estão sem uma terapêutica tão eficaz quanto os restantes, mas tem havido um grande avanço nesta área. Algumas terapêuticas estão em fase de desenvolvimento, ainda não estão aprovadas, mas vêm de facto preencher essa lacuna", sublinhou.

No congresso, segundo a especialista, pretende-se "reflectir sobre o problema", na medida em que "não chega só tratar os doentes que conhecemos, mais importante é identificar a percentagem de doentes que estão infectados, e são muitos, e que não sabem".

"Não podendo tratar esses doentes, não investindo no diagnóstico e no rastreio, dificilmente vamos conseguir ganhos em saúde, mesmo com as melhores terapêuticas do mundo. Temos de saber a quem dar essas terapêuticas e saber onde é que esses doentes estão", defendeu Isabel Pedroto.

"A situação de Portugal é excelente, tratamos milhares de doentes, mas também temos a consciência de que só conseguimos reduzir a transmissão da doença se formos procurar aqueles que estão numa fase inicial", disse.

Segundo dados da associação, em Portugal apenas 30% dos indivíduos infectados pelo vírus da hepatite C estão identificados.

"Em termos de saúde pública, a terapêutica para a hepatite C só pode ser considerada um bom investimento se se fomentar o diagnóstico, a prevenção, a vigilância dos grupos de risco e uma maior acessibilidade ao tratamento", frisou.

O tumor maligno do fígado encontra-se no ranking das dez causas de morte mais frequentes em Portugal, ocupando a 8.ª e a 9.ª posições nas faixas etárias dos 45-64 anos e dos 65-74 anos, respectivamente.