As mulheres também podem ser Presidentes da República

As candidaturas de Maria de Belém Roseira e de Marisa Matias orgulham quem gostaria de viver numa sociedade paritária.

Quarenta anos depois da abolição em Portugal das leis que consagravam a primazia dos homens, duas mulheres – por mérito delas e orgulho de quem prefere uma organização social paritária – apresentam-se ao eleitorado assumindo que querem exercer o mais alto cargo político no País.

Demonstram o mérito:
– a competência técnica relevante;
– o percurso profissional e político de qualidade;
– a notoriedade pública por bons serviços prestados ao país;
– a segurança de quem não se acha "águia" no meio de "perus";
– a coragem para enfrentar e desmontar ironias, paternalismos e menorizações inerentes ao preconceito de que este é cargo "próprio de homem”, pelo que há que encontrar pretextos para punir com o ridículo destruidor da credibilidade as que ousam disputar o topo da hierarquia política;
– a capacidade de afirmação e de êxito em meios tradicionalmente hostis às mulheres.

Por outro lado, as candidaturas de Maria de Belém Roseira e de Marisa Matias orgulham quem gostaria de viver numa sociedade paritária, por reforço da auto-estima individual e colectiva, pela evidência de que, também na eleição de um cargo político unipessoal, as mulheres são capazes, têm iniciativa, lidam bem com a sua própria ousadia, afirmam sem receio não só que querem poder, mas que, por comparação, têm melhores condições para o exercer bem, assumem, simplesmente, que sabem e podem “representar a República, garantir a independência nacional, a unidade do Estado e o regular funcionamento das instituições democráticas e ser Comandante Supremo das Forças Armadas”.

Valentes Portuguesas, diria, entusiasmada, a minha Avó!

Felicitando e respeitando as duas, votarei em Maria de Belém Roseira. Por cinco motivos conjugados:
1.º – clareza na adesão ao estado de direito democrático e na opção por uma organização social solidária com acomodação equilibrada dos direitos e deveres fundamentais de todas as pessoas e instituições;
2.º – conhecimento pessoal do modo como intervém: inteligência estratégica, capacidade de trabalho e de escuta, exigência e eficácia na resolução de problemas, generosidade na compreensão e no reconhecimento das outras pessoas, utilização sistemática da experiência profissional e política longa e diversificada, maturidade no processo de decisão, defesa do poder que legitimamente exerce, resiliência face à crítica destrutiva ou de má-fé, capacidade e persistência para atingir objectivos, para a obtenção de consensos e para a concretização de resultados;
3.º – evidência, ao longo da vida, de que é possível a uma mulher vivendo em casal e sendo mãe gerir com êxito a sua vida familiar, profissional e política a ponto de concorrer e poder ser eleita Presidente da República; o que pode encorajar muitas outras a desenvolver carreiras políticas exigentes sem abdicar da maternidade e do cuidado à família, aumentando a oferta de talentos, a diversidade, a renovação e a proximidade do pessoal político, com ganhos objectivos para a qualidade da democracia em Portugal;
4.º – desempenho anterior do cargo de Ministra para a Igualdade, o que leva a que seja de esperar que a habitual magistratura de influência presidencial se alargue a campos novos com respostas concretas de reconhecimento, de justiça e de melhoria de qualidade de vida para a metade da população que a tirania do género na organização social exige se mantenha conformada com o seu estatuto efectivo de subordinação laboral, social e política, de que só antevê saída se optar por não ter filhos e por não cuidar da família;

5º – melhor posicionamento para vencer, já que entendo que a função de Presidente da República deve agora ficar nas mãos de quem conhece, por experiência própria, a vida real das mulheres com responsabilidades familiares, a sua frequente dupla tarefa na esfera privada e na esfera pública e os inerentes constrangimentos de tempo e de outros meios para concretizar carreiras profissionais ou políticas.

Votar em Maria de Belém Roseira não é só exercer, uma vez mais, o direito de sufrágio. É também um contributo cívico determinante para que Portugal cumpra o objectivo da igualdade de mulheres e homens preconizado pelo Conselho da Europa como critério fundamental da democracia. E elegê-la é melhorar a criação de condições para o equilíbrio da participação na vida familiar, profissional e política de homens e mulheres. O que também encoraja, objectivamente, o tão desejado aumento da natalidade em Portugal.

Jurista, ex-Secretária de Estado para a Igualdade

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