Solução para Banif é criar fundo para absorver activos "tóxicos"

Em contra-relógio para apresentar um plano para o Banif, tudo indica que o Governo apresenta esta semana uma solução para o banco que, independentemente da via escolhida, passará por expurgar do balanço activos tóxicos.

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Catarina Oliveira Alves

O Governo está a trabalhar para durante esta semana poder apresentar uma solução para o Banif que, independentemente da via escolhida, venda total, parcial ou por conversão dos Cocos (empréstimo) em capital, passará por expurgar do balanço os activos "tóxicos" (criar banco mau).

O objectivo é antecipar a entrada em vigor a 1 de Janeiro do novo enquadramento regulatório que vai dificultar a resolução do dossier que terá prejuízos para o Estado. 

António Costa tem em cima da mesa matérias financeiras complexas e a exigirem decisões que vão testar os alicerces do acordo de esquerda. Mas o tema mais urgente não é o da CGD, nem o do Novo Banco (o mais difícil), mas o do Banif, que está desde Dezembro de 2014 em situação de incumprimento com o Estado português. O Bloco de Esquerda e o PCP estão a acompanhar de perto as movimentações do Governo e não se esperam grandes tensões.

Há três anos o banco foi nacionalizado por Pedro Passos Coelho com uma injecção de fundos públicos de 700 milhões (que terão de ser devolvidos até final de 2017) e um empréstimo de Cocos de 400 milhões (dos quais 275 milhões já foram liquidados). A última parcela, de 125 milhões de euros, deveria ter sido paga ao Tesouro em Dezembro de 2014. Mas não foi. A situação colocou o banco sob vigilância apertada da Direcção Geral da Concorrência Europeia (DGCom), que mantém pendente a aprovação do plano de reestruturação necessário para aprovar a ajuda estatal. E impõe à equipa de Jorge Tomé medidas consideradas inexequíveis.

Nos últimos meses, Bruxelas tem vindo a insistir na devolução dos 125 milhões de euros ao Estado, mas o Banif continua sem condições de os pagar. Com os técnicos da DGCom de partida para as férias de Natal, as pressões acentuaram-se. Em simultâneo, aproxima-se a entrada em vigor a 1 de Janeiro de 2016 da directiva comunitária que impõe o bailin com recursos a meios internos: as instituições sem capacidade de ir levantar capital ao mercado antes de pedirem ajuda ao Estado devem recorrer aos obrigacionistas detentores de dívida subordinada e sénior e aos grandes depositantes (com mais de 100 mil euros). Na prática traduz-se em transformar dívida e depósitos em capital. Daí a corrida contra o tempo do actual executivo para resolver o imbróglio que herdou do anterior Governo que deveria ter resolvido o dossier em 2014.

Na lista de opções do actual primeiro-ministro não está o recurso à solução mais agressiva e com risco sistémico, o bailin dos depositantes. O PÚBLICO apurou que este fim-de-semana continuavam em cima da mesa do Governo várias hipóteses em aberto. Mas todas precedidas de uma limpeza do balanço da instituição, com criação de um banco-veículo para receber os activos tóxicos e facilitar a venda. Quem comprar, quer comprar sem risco de surpresas, ainda que o Banif esteja a cumprir os rácios exigidos por Bruxelas e comece a apresentar lucros.

Qualquer que seja a deliberação, o Estado terá um prejuízo elevado, no mínimo de 125 milhões que na pior das hipóteses pode aproximar-se dos 700 milhões.

A questão é saber qual é a solução que gera menos perdas para os contribuintes. Uma das vias é começar desde já a negociar com um comprador seleccionado a venda dos 60% que o Estado detém na instituição, que assumirá o pagamento dos 125 milhões da dívida ao Estado e de uma parte dos 700 milhões injectados pelo Tesouro. A solução retirará os holofotes da DGcom do Banif. Mas dado que a venda decorre num contexto de pressa, o quadro negocial é frágil, e não permite maximizar o preço, como aconteceria se decorresse em condições normais.

A outra via, e que a gestão quer evitar, passa pela conversão dos 125 milhões de euros em capital e a reestruturação do banco para alienar mais tarde, mas num contexto mais favorável. Ou seja: o Estado que já tem 60% do capital converte o crédito em acções e aumenta a sua presença no banco que já opera na sua esfera. Parqueia os activos bons num instrumento público e de uma só vez ou progressivamente venderá o que for vendável (o encaixe amortizará as perdas associados ao banco mau) - os bancos fora de Portugal, a seguradora Açoreana, imobiliário.

Nos últimos três anos, e por diversas vezes, foi posto a correr no mercado que havia interessados em comprar o Banif (um deles era um fundo estatal da Guiné Equatorial), mas o negócio nunca se concretizou. Na semana passada o assunto voltou a ser mencionado pela comunicação social agora com seis candidatos. Do grupo nenhum é português. A CGD, o BCP e o Novo Banco estão sujeitos a ajudas públicas e impedidos de ir às compras. E o BPI já pagou ao Estado o que devia, mas tem um diferendo accionista por digerir.

E este sábado o Expresso avançou com os nomes dos espanhóis Santander e Banco Popular e de fundos de private equity, como a norte-americana Apollo (dona da Tranquilidade e que esteve na corrida pelo Novo Banco). Falta saber se os contactos em curso partiram do Banif ou se vieram dos próprios. E quanto estão dispostos a pagar por uma instituição com os problemas específicos do Banif a operar num sector em situação económica difícil. Resta ainda saber se ao Governo (que é o vendedor) vai chegar uma proposta credível.

Um banco vai desde logo olhar para o Banif e avaliar se a aquisição contamina o seu balanço. E se estiver instalado em Portugal, como são os casos do Santander e do Banco Popular, para cada posto de trabalho passará a haver dois funcionários, o que vai traduzir-se em despedimentos. Se a oferta vier de um private equity comprará barato, para capitalizar a empresa, puxar por ela e vendê-la mais tarde por melhor. Ou parti-la para maximizar o encaixe.

O actual ministro das Finanças, Mário Centeno, que assumiu funções a 26 de Novembro, dispõe agora de 15 dias para informar como vai resolver a embrulhada que lhe foi deixada por Maria Luís Albuquerque. Um dossier que a ex-ministra articulou com o Banco de Portugal, que desde o primeiro momento esteve envolvido no processo negocial com a DGCom. Hoje, porém, a mensagem que é transmitida para fora pelo supervisor é que o processo nunca passou pela equipa de Carlos Costa, e que o tema é de Mário Centeno.

Mas contas feitas, o Banif é uma gota de água no oceano de problemas do Novo Banco e para os quais ainda não se encontrou uma solução. Um banco que pertence ao Fundo de Resolução gerido pela equipa de Carlos Costa. Com uma quota de mercado estimada de 17%, as necessidades adicionais de capital do Novo Banco apuradas pelo BCE ascendem a quase 1500 milhões, mas admite-se poderem ultrapassar largamente os dois mil milhões se se juntarem os prejuízos deste ano e o imobiliário tóxico. E, ao contrário do Banif (com 3% de quota), que tem sido alvo de reorganização, o Novo Banco continua por reestruturar, o que tem custos. Um dossier explosivo nas mãos do Banco de Portugal e que pode ditar novas medidas europeias.

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