A guerra do xadrez

Um digest superficial, que desperdiça a componente paranóica de um tempo, a tensão do antagonismo entre o americano Bobby Fischer e o russo Boris Spassky e desperdiça, finalmente, a própria especificidade do xadrez.

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Edward Zwick é um daqueles nomes da segunda linha do cinema Americano de 80 e 90 (About Last Night, Glory, Courage Under Fire) de que se conserva uma memória simpática, ainda que os seus cometimentos mais recentes tenham sido bastante decepcionantes (O Último Samurai, Diamante de Sangue). Infelizmente O Prodígio, baseado nos lendários duelos, ao tabuleiro de xadrez, entre o americano Bobby Fischer e o russo Boris Spassky, não revigora essa memória simpática. Falta-lhe, entre outras coisas, concentração, esse elemento fundamental da prática xadrezista: Zwick não se decide se quer filmar um biopic da peculiar figura de Bobby Fischer, ou uma reflexão mais ou menos irónica sobre os também muito estranhos caminhos da Guerra Fria (que teve nestes duelos de xadrez, assim como noutros desportos, alguns episódios porventura anedóticos mas significativos), ou ainda, e mais simplesmente, um filme sobre o jogo de xadrez.

E ao não se decidir - ou, o que vai dar ao mesmo, ao decidir fazer isto tudo em simultâneo – o filme nunca se encontra, sempre desgarrado, num ritmo digest e superficial, que desperdiça a componente paranóica (da Guerra Fria e da psique do próprio Fischer), desperdiça a tensão do antagonismo (porque Spassky não existe como personagem, é uma mera silhueta), e desperdiça, finalmente, a própria especificidade do xadrez, filmado à velocidade de um jogo de flippers, talvez para não maçar ninguém. Sobra Tobey Maguire, de resto um dos produtores do filme, que é um dos melhores actores da sua geração e compõe aqui um Fischer notável, equilibrado entre a fragilidade adolescente e a determinação quase psicótica. Mas também isso – Maguire e a sua personagem – acaba por ser um desperdício, porque não tem à volta um filme que o mereça.

 

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