Maior é melhor

O suposto disco íntimo de Florence and The Machine é óptimo quando não é íntimo.

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Mais valia que Florence continuasse a transmitir à humanidade, da forma mais gongórica possível, cada uma das suas emoções — essa é a linguagem que ela domina na perfeição DR

De certo modo, é como se a menina Florence desconhecesse a existência de emoções que pudessem ser comunicadas sem ferir aparelhos auditivos; Florence sofre — e o mundo tem de saber disso. Ora, sendo este (oficialmente) um disco de ruptura amorosa e, supostamente, mais íntimo do que os anteriores, a piada reside no facto de as grandes canções do disco serem aquelas que obedecem à fórmula habitual: Ship to wreckQueen of peace, a faixa homónima ao disco, Delilah do meio para a frente. Todas são enormes canções no duplo sentido do termo: sofrem de inchaço (ninguém é perfeito), mas também emanam de uma imensa graciosidade. Em Ship to wreck destacam-se o ritmo e a melodia, em How big... os arranjos de cordas e metais, que voltam a surgir em Queen of peace. O segredo, claro, é simples: as melodias em que as canções assentam são boas — muito boas, como Third eye, que, tendo todos os defeitos possíveis (piano martelado, percussão elefantina, coros que são o equivalente musical à reacção do público de um talk-show americano quando surge uma estrela no programa, e uma quantidade de instrumentos superior ao PIB português num volume decibélico capaz de arrasar com a clientela de vários asilos de terceira idade), é admiravelmente apelativa. 

Quando é que How Big, How Blue, How Beautiful descamba? Quando Florence quer ser íntima e contida. A parte de What kind of man que tenta soar a balada sabe a empadão em excesso, Various storms & saints lembra aquelas festas de aniversário de família confrangedoras, em que os pais obrigam os restantes a admirar o talento da filha, que toca para todos uma composição sua à guitarra, e Caught, que quer ser só pop, borbulha pouco. Se calhar, mais valia que Florence continuasse a acreditar que é obrigação sua transmitir à humanidade, da forma mais gongórica possível, cada uma das suas emoções. É que essa linguagem já ela domina na perfeição. Ficou-se com meio grande disco — e a bem de quem vai ao Parque das Nações amanhã esperemos que ela opte pelo épico.

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