Recuperação mais fraca do consumo compromete a “elasticidade” das receitas

UTAO mediu a capacidade de crescimento da receita: com e sem contar com o combate à fraude e as medidas orçamentais do Governo.

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Até 2019, os impostos indirectos deverão ganhar peso no total da carga fiscal Nuno Oliveira

No parecer final sobre o Programa de Estabilidade do executivo os técnicos da UTAO fazem várias simulações para avaliar a elasticidade das receitas face à base de incidência fiscal, para perceber se os valores projectados estão sub ou sobrestimados.

A primeira conclusão é que as projecções para a receita dos impostos e das contribuições sociais “evidenciam uma elasticidade face ao PIB nominal irregular” de 2015 a 2019, o que sugere que há outros factores para além do crescimento da economia em si mesmo que estão a influenciar as perspectivas de arrecadação da receita.

Enquanto este ano por cada 1% de aumento do PIB nominal há um crescimento de 2% na receita, ficando este nível de elasticidade acima dos valores de referência utilizados pela OCDE e pelo sistema europeu de bancos centrais, nos anos seguintes o crescimento da receita “fica aquém do crescimento do PIB nominal, conduzindo uma elasticidade de 0,8 que se afasta, por defeito, dos valores de referência”.

Nesta simulação, foi considerado o efeito das medidas orçamentais do Governo e que podem condicionar a evolução da receita, por exemplo, o impacto da reforma do IRS, da fiscalidade verde, da redução do IRC, da redução gradual da sobretaxa de IRS ou mesmo medidas do lado da despesa que têm outros impactos orçamentais e macroeconómicos.

Quando se estimam estas elasticidades para perceber até onde pode ir a receita tendo em conta a evolução da economia, os resultados obtidos “são particularmente sensíveis aos ajustamentos” que podem condicionar a própria evolução da base de incidência fiscal – por exemplo, a alteração de taxas, escalões de imposto, a existência de um perdão fiscal, de medidas que “alterem a eficácia da recolha de impostos”, como é o caso das medidas de combate à fraude e evasão fiscais. E, avisa a UTAO, estas simulações estão condicionadas “por limitações de informação que podem ter impacto nos resultados”.

Se as medidas extraordinárias não forem consideradas, diz a UTAO, os resultados mostram que a elasticidade se aproxima mais dos valores de referência. Mas em 2015 persiste “uma sobrestimação ao nível da receita de impostos indirectos e contribuições sociais efectivas e uma subestimação na receita de impostos directos face ao PIB”.

A UTAO fez ainda um terceiro exercício para avaliar o andamento da receita excluindo o efeito que o Governo está a atribuir ao resultado das medidas de combate à fraude e evasão fiscal (500 milhões de euros em 2015), seguida de uma “consolidação dos ganhos de eficiência fiscal obtidos” até aí.

A UTAO conclui que a “elasticidade implícita da receita fiscal e contributiva se reduz para 1,6% em 2015 e se mantém inalterada nos anos seguintes em torno de 1%. Se este é um valor “globalmente compatível com os valores de referência”, nota-se ainda uma “uma subestimação da receita de impostos directos ao longo do horizonte de projecção e da receita de contribuições sociais, que se encontra compensada por uma perspectiva mais favorável para a evolução da receita dos impostos indirectos”.

Para a UTAO, é este desvio de comportamento em termos de elasticidade que traz “alguns riscos para a concretização dos resultados previstos”, se a “recuperação do consumo privado se vier a revelar mais modesta do que a projectada no cenário macroeconómico” do Governo.

De 2015 a 2019, o nível da carga fiscal (a soma das receitas tributárias e das contribuições pagas pelas empresas e pelos trabalhadores) deverá manter-se praticamente inalterado, sempre acima dos 34% do PIB.

Mas, segundo a evolução projectada pela UTAO, haverá uma “recomposição” da estrutura da carga fiscal, com os impostos indirectos a ganharem peso no total das receitas arrecadas e os impostos directos a perderem terreno. “Encontra-se previsto um aumento do peso dos impostos indirectos em 3,5 pontos percentuais face a 2014, que passam a representar 45,1% da carga fiscal, cujo crescimento reflectirá a recuperação do consumo e do investimento e, de acordo com o Programa de Estabilidade, a aplicação das medidas de combate à fraude e à evasão fiscal”.

Ao mesmo tempo, aponta-se para uma “redução do peso dos impostos directos, em 3,7 pontos percentuais, para 28,6 % do total, o que estará associado à redução gradual da taxa de imposto no âmbito da reforma do IRC, à eliminação gradual da sobretaxa de IRS e à substituição gradual e parcial do IMT por Imposto do Selo nas transacções de imóveis até 2019”.

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