Ericeira quer mais ouriços-do-mar à mesa dos restaurantes

Festival, em Abril, pretende atrair investimento para aumentar a produção de ouriços. Câmara de Mafra aposta na gastronomia com vários produtos do litoral e interior do concelho.

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Daniel Rocha

“Identificámos a gastronomia como elemento a potenciar”, afirma a vereadora Célia Fernandes, responsável pelo pelouro do Turismo. “É uma alavanca para a restauração, e permite-nos contar a história da região e dignificar produtos que estão mais esquecidos”.

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“Identificámos a gastronomia como elemento a potenciar”, afirma a vereadora Célia Fernandes, responsável pelo pelouro do Turismo. “É uma alavanca para a restauração, e permite-nos contar a história da região e dignificar produtos que estão mais esquecidos”.

Foi quando, há pouco mais de um ano, organizou, em torno do ouriço-do-mar, um jantar do Endògenos – projecto de valorização de produtos portugueses que estão esquecidos ou pouco aproveitados – que Nuno Nobre, da consultora Nuno Nobre e Associados, achou que era possível fazer mais por este produto que está na origem do nome Ericeira (Ouriceira) e que neste momento praticamente não se encontra nos restaurantes locais. “Falei com a Câmara, disse que gostava muito de tornar o ouriço cada vez mais um ícone da terra, e apresentei a ideia do festival”, conta ao PÚBLICO.

O objectivo será mostrar que há muitas maneiras de cozinhar e apresentar o ouriço, e para isso foram convidados para um showcooking no dia 11 à tarde vários chefs, entre os quais António Alexandre, que foi o responsável pelas receitas do jantar Endògenos do ano passado, e Luís Miguel Rodrigues, do restaurante Bastardo, em Lisboa. E, como se pretende que o festival tenha uma dimensão internacional, virá também um chef executivo da escola Le Cordon Bleu de Madrid, e Miguel Prats do restaurante M29 do Hotel Miguel Angel, também na capital espanhola.

Mas Nuno Nobre sublinha outra dimensão desta iniciativa. Provar o ouriço-do-mar e perceber o seu potencial na cozinha será o pretexto ideal para iniciar um debate sobre as hipóteses de investimento em maior escala neste produto. E, para isso, no dia 11 de manhã realizam-se jornadas técnicas nas quais será apresentado pelo biólogo José Lino Costa um estudo sobre “stocks e povoamento do ouriço na Ericeira” elaborado pelo MARE, um projecto da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, para se saber exactamente o que existe nesta costa.

“A nossa ideia é que este estudo sirva de base para dinamizar o investimento”, explica Nuno Nobre. “Até agora existiam vários dados soltos, e aqui pretende-se juntar todo esse conhecimento”. Para isso vai haver vários oradores, sobretudo biólogos que falarão sobre o ouriço a partir de várias perspectivas, nomeadamente a produção em aquacultura, que é uma das vertentes que se pretende vir a desenvolver na Ericeira.

A vereadora Célia Fernandes sublinha também a importância deste trabalho porque, diz, “nos últimos anos não havia tanta ligação ao ouriço, os restaurantes apostaram mais no marisco e a presença do ouriço-do-mar foi diminuindo”. No entanto, “as pessoas lembram-se de no passado o ouriço ser algo que fazia parte do seu quotidiano”.

Os restaurantes locais foram desafiados a apresentar receitas com ouriço (o único que continua a ter um risotto de ouriços é o Restaurante Sul, onde se realizará na noite de dia 10 o jantar de abertura do festival) – e Nuno Nobre quer que esta especialidade chegue até Lisboa, com alguns restaurantes a apresentarem também pratos na semana que antecede o festival.

Raia e a carne de caça
Mas se o ouriço-do-mar é a novidade, há outros produtos que também estão a ser trabalhados nesta parceria entre a Câmara e a Nuno Nobre Associados. A 9 de Maio vai haver um jantar Endògenos com a raia seca, outro produto tradicional que está a cair no esquecimento. “A lota da Ericeira é uma das que recebe mais raia do mar, mas ela acaba por ser escoada para outras lotas a um preço muito baixo”, explica Nuno Nobre. “A Ericeira quer reter mais a raia e valorizá-la”.

Já consolidadas estão outras duas iniciativas. Uma aconteceu em Fevereiro, tem o nome de Sabores da Tapada Real e vai na nona edição. “Há a necessidade de um equilíbrio cinegético na Tapada, onde existem muitos gamos e javalis” e não há predadores naturais, explica a vereadora. No início do ano, a Tapada Nacional faz o abate de alguns animais, para evitar a reprodução excessiva, e alguns dos restaurantes locais servem carne de caça. “Este ano batemos todos os recordes, com cinco mil refeições servidas”, refere Célia Fernandes.

A segunda iniciativa, que tem já cinco anos, é o Festival do Pão de Mafra. “Temos um conjunto de panificadoras com grande dimensão e que fazem este pão que tem características muito específicas e que está em processo de certificação em Bruxelas”, continua a vereadora. O festival, de 10 a 19 de Julho, visa dar a conhecer melhor este pão, que “as pessoas comem muito mas não conhecem assim tão bem”. O grande objectivo “é a protecção da qualidade” para que, melhor informadas, as pessoas saibam distinguir claramente o que é um pão de Mafra.

Uma das preocupações essenciais deste conjunto de iniciativas – no final de Maio, entre 25 e 31, também haverá uma semana da fava – é mostrar que o concelho tem um litoral com produtos do mar, e tem um interior com os seus produtos da terra, como a fava ou o morango. A marca do concelho foi trabalhada de forma a mostrar essa dupla vocação: o M de Mafra pode “levantar-se” e transformar-se no E de Ericeira. E se na Ericeira está já a nascer a Ericeira Business Factory, centro de incubação de empresas ligadas ao mar (produtos gastronómicos, mas não só), no interior vai surgir a Mafra Business Factory, precisamente para potenciar os produtos e actividades ligadas à terra.