Póquer: André é um jogador que doa parte dos seus lucros

Passa uma média de 40 horas por semana a jogar, sempre online, mas não se considera viciado. No fim de 2013, André Coimbra doou tudo o que ganhou — 50 mil euros — a uma associação de apoio a cidadãos com deficiência

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André Coimbra tem 28 anos e é jogador profissional desde 2009 Enric Vives-Rubio

De tabuleiro, de cartas e nos computadores: desde criança que se interessou pelos jogos, mas quando se começou a dedicar às fichas, em 2005, “era horrível”. Aos 28 anos, André Coimbra é um jogador profissional de póquer. Decidiu ler livros sobre o tema, seguir fóruns e discutir ideias com muitos outros jogadores, até que foi melhorando, ao mesmo tempo que continuava a jogar Magic: The Gathering (cujo campeonato do mundo de 2009 venceu). Em 2013, lançou a si mesmo um desafio: doar todo o dinheiro que conseguisse ganhar a uma instituição de solidariedade social.

André, que nasceu em Coimbra e vive em Lisboa, já doava 10% do que ganhava há alguns anos — o “estilo de vida bastante confortável” que conseguiu alcançar permitia-lhe fazer isso. Depois de um início de ano em que se sentiu desmotivado, escolheu “não ganhar dinheiro nenhum”. Num formato online que, à época, não dominava (torneios com várias mesas), o jovem licenciado em Ciências de Computadores começou com 100 dólares (pouco mais de 88 euros). No fim do desafio tinha arrecadado perto de 50 mil euros, que entregou à Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental (APPACDM) de Figueira de Lorvão.

Viveu do patrocínio — André faz parte da equipa da PokerStars —, de rendimentos de anos anteriores e reduziu em despesas. Para 2015 já pensa num outro desafio solidário, revela ao P3. Quer aproveitar as transmissões de vídeo em directo dos jogos para incentivar as pessoas a fazerem doações que, por sua vez, entregará a associações. “Desta forma alavanco o meu tempo e a minha acção solidária.”

Aquando da conversa com o P3, via Skype, André tinha regressado das Bahamas há poucos dias. Viajou até lá para um dos poucos torneios presenciais em que participa por ano — prefere jogar online por ser “mais cómodo e mais barato” —, mas confessa que “em termos de resultado foi mau”. A experiência, contudo, “foi espectacular”. Jogar ao vivo e noutros países tem sempre algumas desvantagens: nos Estados Unidos, por exemplo, “30% dos ganhos são taxados”. Em Portugal, o jogo online ainda não está regulamentado, apesar de se discutir o tema recorrentemente nos últimos meses.

Póquer é profissão, não vício

Joga 40 horas por semana, em média, mas não vê o póquer como um vício. “Posso ficar seis meses sem jogar póquer”, assegura. “Sei tanto do jogo que é difícil ser um vício. Vou a um casino e nem sequer consigo jogar na roleta porque já sei que a pessoa está a perder dinheiro. O mesmo acontece com o Euromilhões”, revela o jogador que, no campeonato do mundo de 2010, chegou a vencer um prémio de 42 mil dólares (37.200 euros).

O dinheiro, que em tempos já foi a principal motivação para se dedicar às cartas, está agora “em terceiro ou quarto lugar”. “O que valorizo mais é a liberdade de poder fazer o meu horário, escolher quando faço férias, não ter patrão”, reflecte. Essa liberdade pressupõe, também, “uma responsabilidade muito grande”. “O póquer permite-nos ter sempre um desafio, é excelente para a saúde mental. Dá sempre", ressalta, "para aprender mais, evoluir, estudar, aumentar a precisão das nossas jogadas.”

Seguido por milhares de pessoas nas redes sociais e no blogue — não é à toa que tenta guardar uma hora, todos os dias, para responder a todas as solicitações —, André tem algumas dicas para quem vê este jogo como uma oportunidade de carreira. A primeira é não abdicarem de tudo pelo póquer: “Se estiverem a fazer um curso tentem arranjar algumas horas por dia para jogar, mas não abandonem o estudo”. Quando e se o interesse passar a ser jogar profissionalmente, o jovem recomenda “já terem, pelo menos, um ou dois anos de resultados consistentes”.

“Não é porque se vence um torneio que se é profissional. Deve encarar-se isso com bastante seriedade e, idealmente, ter uns seis meses de despesas já pagas”, continua, revelando que a maioria dos jogadores profissionais perde dinheiro dois meses por ano. “Se não estivermos preparados emocional e financeiramente para estas situações, vai ser desgastante.”

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