Três jihadistas franceses esperados em Paris passearam-se por Marselha

Turquia mudou à última hora voo em que suspeitos foram repatriados, mas não informou autoridades francesas, que chegaram a anunciar a sua detenção.

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A segurança foi reforçada em Paris devido à ameaça de atentados terroristas LIONEL BONAVENTURE/AFP

É um fiasco que embaraça o Governo francês e volta a pôr em causa a cooperação da Turquia nos esforços para impedir que novos recrutas estrangeiros se juntem às fileiras do Estado Islâmico. Três franceses identificados como jihadistas foram repatriados na terça-feira, mas a polícia turca não comunicou uma mudança de voo de última hora e, ao invés de Paris, onde eram esperados pelos serviços secretos, foram levados para Marselha, entrando no país sem terem sido abordados pelas autoridades.

A gaffe tornou-se mais embaraçosa por que o Ministério do Interior, informado da sua chegada iminente ao país, anunciou que os três suspeitos tinham sido detidos no aeroporto de Orly – uma informação que a polícia não confirmou e que o Governo só rectificou ao início da noite, após oito horas de silêncio. Durante esse período, adianta o jornal Le Monde, os três homens, há muito identificados pela Direcção-Geral de Segurança Interna (DGSI) e considerados perigosos, passearam-se livremente por Marselha.

Entre eles está um cunhado de Mohamed Merah – morto em 2012 pela polícia após uma série de ataques em que foram mortas sete pessoas, incluindo crianças de uma escola judaica – e um amigo de infância do jovem, condenado em 2009 a quatro anos de prisão por terrorismo. Apesar de conhecidos das autoridades, partiram em Fevereiro com destino à Síria.

O advogado de um deles revelou que os três se apresentaram nesta quarta-feira num posto de polícia de uma aldeia 170 quilómetros a noroeste de Marselha "porque querem ser ouvidos pelas autoridades", adiantando que o grupo ficou "espantado" por não ter sido abordado à chegada.

O ministro da Defesa francês, Jean-Yves Le Drian, não escondia nesta quarta-feira a fúria de Paris com a “iniciativa infeliz das autoridades turcas” que, em cima da hora, mudaram o avião em que os três suspeitos deveriam ter viajado.

O Le Monde adianta que a mudança foi ditada pela recusa do comandante do primeiro avião em embarcar os três homens sem o documento necessário à sua expulsão, tendo então decidido que eles tomariam o voo seguinte, com destino a Marselha. A falha de comunicação só terá sido detectada depois de o avião ter aterrado, quando os agentes da secreta contactaram os homólogos turcos para apurar porque não tinham eles chegado a Paris – por explicar está a falha que levou o Ministério do Interior a anunciar a sua detenção.

Entrevistado pela rádio France Info, Le Drian admitiu que este “passo em falso se deveu em grande parte às dificuldades, à ausência de uma boa colaboração com os serviços turcos”, reconhecendo que é necessário melhorar a coordenação com Ancara. Concedeu também que o sistema de controlo de passaportes que deveria ter permitido a detecção dos três suspeitos à chegada a Marselha “estava avariado”.

Há muito que os seus aliados na NATO acusam o Governo turco de pouco fazer para tornar menos porosas as fronteiras com a Síria, pelas quais transitam grande parte dos estrangeiros que partem para se juntar ao Estado Islâmico. Foi por ali, assegura o Le Monde, que passaram “todos ou quase todos” os 350 franceses que estarão actualmente a combater na Síria e os 180 que regressaram nos últimos meses a França.

O Governo de Ancara responde que desde o início da guerra na Síria, em 2011, já localizou e expulsou mil combatentes oriundos de 75 países e que continua a reforçar, com vedações e sistemas de vigilância, as suas fronteiras.  

A falha de segurança em França aconteceu na véspera de o Conselho de Segurança das Nações Unidas se reunir para votar uma resolução que visa forçar os Estados a adoptar medidas mais duras para travar o fluxo de jihadistas que está a desaguar na Síria e no Iraque. Segundo informações recolhidas pelas secretas ocidentais, mais de 12 mil combatentes estrangeiros, oriundos de 74 países, juntaram-se a organizações extremistas nos dois países, o que representa a maior mobilização de combatentes estrangeiros desde a invasão soviética do Afeganistão, na década de 1980.

A maioria é oriunda de países do Médio Oriente e do Magrebe, mas entre eles haverá “cerca de três mil” jihadistas europeus, disse à AFP Gilles de Kerchove, coordenador europeu de luta contra o terrorismo.

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