Sobre a epidemia de ébola

A expressão alerta é bem diferente de alarme. É bom estar em alerta, é mau estar alarmado.

O Estado, através dos seus organismos de Saúde Pública, tem o dever de informar a população sobre os riscos a que está exposta, tal como os cidadãos devem conhecer e participar nas medidas protetoras que estão preparadas para o efeito. Princípio inquestionável.

Como tem sido amplamente noticiado pela comunicação social, emergiu, recentemente, uma grave epidemia de ébola na Costa Ocidental de África. Primeiro na República da Guiné-Conacri e depois na Serra Leoa, Libéria e mais tarde na Nigéria. Nos primeiros três países as fronteiras porosas, muito permeáveis à mobilidade das populações rurais, explicam a propagação ocorrida e na Nigéria a deslocação por transporte aéreo deu origem aos primeiros casos.

Mais recentemente, um outro epicentro foi identificado numa região remota da República Democrática do Congo. Confirma-se que este novo surto de ébola não apresenta relação com o anterior. Um segundo epicentro.

Tem sido comunicado que esta infeção de natureza viral pode provocar um quadro hemorrágico com evolução para a morte numa alta percentagem de casos. A transmissão de pessoa a pessoa, isto é, a formação de cadeias de transmissão, impõe o contacto com o sangue de doente ou de outros líquidos orgânicos e tem como período de incubação até 21 dias. Quem adquiriu o vírus pode ter os primeiros sintomas e sinais ao longo das três semanas seguintes.

Há, em termos de diagnóstico, dois critérios essenciais para um doente ser considerado suspeito. O primeiro é o critério epidemiológico (onde e quando esteve) e o segundo é o critério clínico (febre alta de início súbito, entre outros sinais). Assim, um cidadão regressado de uma zona de risco e que adoece depois do 22.º dia não é suspeito. Da mesma forma, mesmo que tenha estado numa zona afetada mas que não apresente um quadro clinico compatível, também não é suspeito.

Naturalmente, as condições socioeconómicas e sanitárias verificadas em África não podem ser comparadas com as existentes em Portugal. Não será possível reproduzir cenários semelhantes. Mas, apesar do risco ser baixo, há que admitir a possibilidade de viajantes que regressem de um desses países onde o vírus do ébola circula poderem entrar em Portugal e logo depois iniciarem as manifestações clínicas. Para situações deste tipo foi desenhado um plano de contingência que criou um dispositivo de coordenação entre a Direção-Geral da Saúde, o INEM, o Instituto Ricardo Jorge e os Hospitais de S. João, Curry Cabral e D. Estefânia. O mecanismo de resposta está preparado para ser acionado de forma adequada e eficaz.

Portugal está em permanente contacto com representantes de organismos da União Europeia como o Centro de Controlo de Doenças de Estocolmo, bem como com a Organização Mundial da Saúde, a fim de acompanhar a evolução da situação a nível global.

Ora, como se sabe, a expressão alerta é bem diferente de alarme. Estar em alerta, criar dispositivos de vigilância, estar atento, colocar sistemas-sentinela ou acompanhar a evolução do problema, são dimensões que devem constituir motivo de segurança para os cidadãos. Já o alarme, reconhece-se, pode gerar receio, medo ou pânico que constituem, quase sempre, bloqueios às medidas de prevenção e controlo em relação ao fenómeno da epidemia de ébola que está na génese de alertas. É bom estar em alerta, é mau estar alarmado.

Director-Geral da Saúde

Sugerir correcção
Comentar