Posso dormir em tua casa?

Muito mais do que viajar barato, há pessoas que querem viajar com alma. Almas que viajam sozinhas e querem conhecer alguém no destino

Foto
Reuters

Podia ser uma pergunta de fim de noite, cheia de promessas que a nossa mente já imagina. Mas não, é uma questão de início de férias, de programação de viagem.

Entrar na casa de alguém que não conhecíamos é uma descoberta da época do então disruptivo turismo de habitação, mas só se democratizou com as aplicações que agora partilham os quartos e as camas das nossas casas instantaneamente em todo o mundo, à distância de um clique. Airbnb e Homeaway são os lados visíveis de uma nova forma de viajar, de descobrir.

Do lado de quem vende, a razão mais óbvia é angariar algum dinheiro, praticamente sem investimento. Para quem compra, é uma forma mais barata de se atrever pelo mundo que tanto nos fascina. Mas que outras razões pode haver por trás deste movimento, que cresce a olhos vistos tanto em nações humildes como nas abastadas?

Muito mais do que viajar barato, há pessoas que querem viajar com alma. Almas que viajam sozinhas e querem conhecer alguém no destino. Casais que querem ter tempo de ter com quem falar quando não andam na parafernália da rua. Jovens que estão cansados de hostels orientados para a festa e que preferem ter tempo para estar sentados, olhos nos olhos. Viajantes que gostam de ser orientados por quem tem a alma da terra, os olhos de cá. Ou simplesmente os que querem a atenção de alguém só para si, nem que seja por uns minutos.

É por isso que quando perguntamos “posso dormir em tua casa?” nos centramos muito mais a escolher pessoas do que casas. Lemos sobre os interesses dos anfitriões, em vez de investigar a espessura dos colchões. Perguntamo-nos do que gostam em vez de questionarmos sobre as horas de um pequeno almoço que nunca será buffet, nunca será igual.

E é assim que os nossos dias nas viagens por esse mundo vão mudando. Podemos dormir em bons hotéis quando podemos e queremos estar sossegados. Quando pretendemos estar concentrados ou simplesmente isolados no nosso mundo. Podemos descobrir “guesthouses” personalizadas, “cosy”, especiais, quase nossas. Casas que esquecem os “standards” para se perderem nos pormenores de quem as inventa, como tantas vezes gostamos — para fugir de um mundo tão cinzento e igual a si próprio que corre o risco de enjoar. Ou fugir para dentro de hostels cheios de vida, onde descobrir a pessoa na cama de cima faz parte da aventura que é cada dia. Como não chegavam as opções no cardápio, inventaram a viagem para dentro das nossas casas, das nossas camas.

Agora é assim: podemos fazer o que queremos, quando queremos. Fugimos, descobrimos, vivemos, amamos. Conhecemos, partilhamos e dizemos adeus, até muito breve ou nunca mais.

Sugerir correcção
Comentar