A magia dos invisíveis

Quem são os que trabalham sem reconhecimento, apenas e só pelo prazer de evoluir, pela procura de uma excelência descomprometida de escala social?

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Damir Sagol/Reuters

Num mundo orientado para o ruído imenso da auto-promoção, é raro encontrar motivação que não passe pela partilha e pelo reconhecimento dos méritos obtidos, tanto no domínio pessoal como no profissional. E a paixão pelo trabalho simplesmente bem feito, pelos objectivos cumpridos, pela excelência?

São poucos os que não perseguem o magnetismo da partilha do sucesso, na procura constante do reconhecimento dos círculos sociais quando não de uma multidão de anónimos. A vertigem do reconhecimento social é um alimento primário, uma das necessidades humanas mais primárias: a inclusão. Precisamos de pertencer, de fazer parte. Queremos que gostem de quem somos, do que fazemos, do que conseguimos. Temos de fazer mais e melhor, para juntar satisfação pessoal a esse reconhecimento social e é cada vez mais neste domínio que se faz a combustão dos ingredientes que perseguem o sucesso.

Mas não há verdades absolutas sem excepções mágicas. E é a esses magos da diferença que devemos tanto do que vivemos hoje, tanto do que evoluímos em cada dia. Quem são os que trabalham sem reconhecimento, apenas e só pelo prazer de evoluir, pela procura de uma excelência descomprometida de escala social? São também esses invisíveis que fazem o mundo evoluir, sem que ninguém se dê conta, longe do ruído e do alarido a cada meta superada tão comuns nos nossos dias.

O desenhador da Brazuca — a bola do Mundial do Brasil — está para a Copa do Mundo como os engenheiros de estruturas, intérpretes e anestesistas estão para os mercados mundiais: ninguém os conhece, mas dependemos deles para evoluir.

Quem conhece o intérprete por trás de uma notícia importante, de um livro notável? Quem se lembra do anestesista das cirurgias dos nossos amigos e familiares? Ou mesmo das nossas? Quem conhece o engenheiro que calcula as estruturas de uma torre ou ponte? A resposta é óbvia, mas surpreendente. Ninguém. Ninguém os conhece, apesar da importância destes invisíveis para o nosso mundo, para a nossa vida.

Como Zweig já nos mostrou, a realidade pode ser ainda mais crua: estes invisíveis da sociedade só são conhecidos pelos piores motivos: quando uma ponte cai, uma operação não corre bem, uma tradução se torna em tragédia. Como aconteceria — na devida proporção — se a bola do mundial furasse a meio de um jogo.

Saboreio com intensidade este pensamento da paixão pela excelência por si só, longe dos holofotes. Faz-me pensar se eu escreveria este artigo sem a minha fotografia, biografia e assinatura, se pudesse transformar-me num mago invisível também.

E é neste delicioso aroma da magia dos invisíveis que ergo a mão, num brinde imaginário: à vossa.

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