Como estancar a saída de talentos?

De acordo com o Relatório do Capital Humano do Fórum Económico Mundial de 2013, constata-se que, no indicador “Capacidade de reter talentos”, Portugal ocupa a posição 111, entre 148 países, o que demonstra a relevância deste tema e a necessidade de proceder a uma análise do porquê desta situação, dado tratar-se de um indicador fundamental para o desenvolvimento do País.

No mesmo documento, os indicadores correspondentes à “Qualidade das instituições de investigação” e “Disponibilidade de investigadores e engenheiros” encontram-se nas posições 20 e 16, respetivamente. Isto significa que, por um lado, o País está bem posicionado no que se refere à qualidade das instituições de investigação e aos seus investigadores e engenheiros, ou seja, à disponibilidade de talentos e, por outro, não os consegue reter, motivando a sua saída para outros países.

Os talentos, também designados na literatura de língua inglesa como “brains”, são profissionais altamente diferenciados, não só pelo seu nível de experiência, mas fundamentalmente pelo nível de qualificação e desempenho profissional, reconhecidos pelo mercado.

Analisando os dados da OCDE, constata-se que Portugal, ao longo do período de 2000 a 2011, em resultado de fortes incentivos públicos, obteve um grande progresso na valorização dos seus recursos humanos nas áreas da investigação e na inovação, com um enorme aumento do número de doutorados e da produção científica, apresentando esta um crescimento médio anual de 6,1% no índice das publicações correspondentes a 10% das mais citadas a nível mundial. No entanto, este crescimento não seguiu a mesma tendência no que concerne à aplicação do conhecimento na valorização tecnológica, ou seja, no emprego destes recursos com vista ao desenvolvimento empresarial.

Efetivamente, Portugal continua com indicadores inferiores à média da UE em matéria de desenvolvimento de tecnologia, de empresas em I&D e do conhecimento, com reflexos na inovação como base da incorporação de valor nas empresas e, portanto, na economia.

A fuga de talentos é, certamente, reforçada pela situação económica atual, mas é importante ler para além do óbvio, procurando identificar as principais razões que lhe estão subjacentes.

Com base num levantamento promovido pelo Instituto Superior Técnico (IST), realizado em 2012, considerando ocupações científicas, constata-se que a principal razão da saída de “cérebros” está associada à escassez de oportunidades de carreira e às perspetivas de evolução, enquanto o salário competitivo aparece só em sexto lugar. De entre os fatores mais relevantes na candidatura a um emprego científico no exterior surgem, por ordem decrescente de importância, a área de investigação, a duração do contrato e o prestígio da equipa de investigação, aparecendo o nível salarial em quarto lugar.

As deficientes condições para prosseguir os projetos individuais e as fracas ou nulas oportunidades para concretizar tais projetos, são as principais responsáveis pela saída de talentos, que neste momento atinge valores elevados. De acordo com dados disponibilizados pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), cerca de 140 doutorados aí formados encontram-se a trabalhar no exterior.

No essencial, a saída de talentos ocorre em resultado da inexistência de projetos de continuidade e das debilidades inerentes a uma falta de estratégia clara do que se pretende para a investigação, que não seja posta em causa em cada novo ciclo eleitoral. A não existência de uma estratégia de continuidade, conduzindo ao empobrecimento da nossa capacidade técnica e científica e da capacidade de inovação nas empresas, é perda de dinheiro e de futuro.

Essa estratégia passa pela implementação de mecanismos para captar, manter e motivar os melhores talentos, assim como por uma ligação mais estreita entre as universidades e as instituições de investigação ao meio empresarial e, em particular, à indústria, como base para a criação de valor. Spin-offs em ambiente de instituições de investigação podem, igualmente, ser determinantes para a atração de talentos e, consequentemente, para o desenvolvimento da nossa economia.

Bastonário da Ordem dos Engenheiros

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