Universidade de Lisboa corta bolsas de investigação

Corte nas bolsas aumenta situação precária dos investigadores portugueses. De acordo com um inquérito da Associação de Combate à Precariedade, 80% dos bolseiros pondera sair do país

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Público (arquivo)

Os bolseiros da Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa receberam, esta terça-feira, um contacto do departamento de recursos humanos da reitoria a dar conta de um corte na bolsa a efectuar-se já este mês e com efeitos retroactivos desde Janeiro de 2014. Depois de um ano marcado pelos cortes drásticos no número de bolsas atribuídas e pelos concursos públicos envoltos em várias polémicas, há mais uma medida do Ministério da Educação e da Ciência que afecta os investigadores.

Margarida Elias foi uma das bolseiras que recebeu “com surpresa” a notícia de que a sua bolsa seria cortada. A investigadora contou ao PÚBLICO que ainda não está bem ciente das consequências desta decisão. “Lembro-me de no início do ano ter ouvido um comunicado do Governo que dizia que os bolseiros não iam sofrer cortes”, diz Margarida, que confessa ainda estar à procura de explicações para o sucedido.

A justificação para os cortes está expressa no artigo 33º da Lei do Orçamento de Estado e é comunicado pela reitoria da Universidade de Lisboa na sequência de uma directriz da Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP) que inclui os bolseiros nos cortes salariais aplicados aos trabalhadores com vínculo contratual. A questão é que, à semelhança de Margarida Elias, muito poucos são os investigadores que algum dia trabalharam com contrato de trabalho. Esta situação está também reflectida num inquérito recentemente realizado pela Associação de Combate à Precariedade que concluiu que 77,8% dos investigadores nunca estiveram ligados contratualmente.

Esta situação representa, para a maioria dos investigadores, uma realidade de trabalho precário e quase total ausência de protecção social. “A bolsa é a nossa única forma de subsistência”, explica Margarida. “Aliás, no caso dos investigadores da FCT [Fundação para a Ciência e a Tecnologia] nós somos mesmo obrigados a trabalhar em regime de exclusividade”, acrescenta a investigadora para mostrar que, com os cortes na bolsa e sem outras possibilidades de remuneração, torna-se muito complicado sobreviver.

Contactada pelo PÚBLICO, fonte da reitoria da Universidade do Porto (UP) explicou que, para já, a instituição não irá proceder ao corte das bolsas de investigação. Em Janeiro deste ano, a UP anunciou um corte nas bolsas seguindo a orientação do Orçamento de Estado para 2014. Um mês depois, em Fevereiro, suspendeu essa mesma decisão ao ouvir o ministro da Educação e da Ciência, Nuno Crato, afirmar publicamente que os bolseiros (sem vínculo contratual) não seriam afectados pelos cortes. A directriz da DGAEP vem agora dar o dito por não dito e a UP já pediu ao Ministério das Finanças que esclareça, de uma vez por todas, a situação. Até que tal aconteça, nenhum corte será efectuado.

Já em Janeiro deste ano centenas de investigadores bolseiros manifestaram o seu desagrado em relação às políticas do Governo em frente às portas da FCT. O corte nas bolsas e as irregularidades nos concursos de acesso foram os motivos do protesto que agora reacende com a implementação da medida da DGAEP na Universidade de Lisboa. Mais uma vez, os investigadores afirmam que as políticas do Governo estão a provocar a fuga de cérebros e a destruir a investigação em Portugal.

Contactada pelo PÚBLICO, a DGAEP não quis comentar esta situação.

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